São Paulo, sexta-feira, 12 de março de 2004

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LUÍS NASSIF

O país do dr. Meirelles

Recentemente houve reunião de uma das câmaras econômicas do governo, para avaliar propostas de política industrial. Um dos técnicos incumbidos dos estudos fazia sua apresentação, quando foi interrompido pelo presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. Ao seu feitio, de levantar as sobrancelhas e falar com voz impostada, Meirelles indagou, em tom grave: "O senhor poderia me informar se existe algum país democrático do mundo que pratique política industrial?". O técnico ficou meio embaraçado: "Sua pergunta é se existe algum país democrático que NÃO pratique política industrial? É isso?". E Meirelles, enfático, pontuando a pergunta com a sobrancelha: "Não, senhor, minha pergunta é se existe algum país democrático que pratique política industrial". O técnico foi incisivo: "Dr. Meirelles, todos os países relevantes do mundo praticam política industrial". Criou-se um clima de constrangimento com a demonstração de desconhecimento de Meirelles, rapidamente corrigido pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, com sua bonomia.
O Brasil é refém do dr. Meirelles, da mesma maneira que um dia foi refém de Itamar Franco. É inacreditável a maneira, as circunstâncias que permitem a determinadas pessoas galgar cargos de tal relevância. Como é possível que a falta de informação nacional fosse tamanha que não se avaliassem adequadamente o perfil e a formação de Meirelles, antes de lhe outorgar o papel de avalista do governo perante o mercado?
Ontem, Lula repetiu os mesmos argumentos brandidos por ele. A sofisticação de raciocínio é a mesma. Quem tolera que a inflação aumente um ponto tolera dois, quem tolera dois tolera três, e estaremos todos perdidos. Portanto tome juros.
No curso científico, certa vez a diretora do Instituto Educacional suspendeu um aluno que prendeu uma galinha no porta-malas do carro, baseada em raciocínio semelhante: hoje é uma galinha, amanhã poderá ser uma criança.
O país ficou prisioneiro de uma ignorância econômica letal, sustentada por duas ou três imagens acessíveis ao senso comum. Ameaças concretas -como a inviabilização da dívida pública-, a estagnação da economia, o esgarçamento do tecido social e político, dez anos de resultados negativos comprovados, tudo é varrido para baixo do tapete por frases de efeito e sofismas primários.
E, se o PT se insurgir contra essa loucura, imediatamente o mundo cairá sobre ele. O problema não é o dr. Meirelles manter uma taxa de juros que conduza a uma dinâmica de desastre na dívida pública. O problema é o partido do governo alertar para o desastre.
O trágico da história é que Meirelles ocupou esse espaço não por imposição das bases petistas, por compromisso com alianças históricas. Foi um passivo que não veio por herança: veio por exclusão, é verdade, mas pela livre vontade do governo.

AmBev
A AmBev informa que a participação da Labatt (que será adquirida por ela) está na mexicana Femsa Cerveja, e não na Femsa Refrigerantes -que adquiriu a Spal, distribuidora da Coca Cola no Brasil. Portanto não haverá ampliação do seu poder de mercado na área de refrigerantes.

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