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Planalto tenta evitar batalha jurídica por obras no rio Madeira
Camargo Corrêa questiona pré-acordo entre Odebrecht e governo, que se apressa para construir usinas e amenizar risco de "apagão"
Disputa entre duas grandes empreiteiras nacionais já
levou a novo adiamento em leilão de hidrelétrica; Dilma decide assumir processo
MARTA SALOMON
HUMBERTO MEDINA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Disputa entre duas das maiores empreiteiras nacionais -a
Norberto Odebrecht e a Camargo Corrêa- impôs novo
atraso ao leilão da hidrelétrica
de Santo Antônio, uma das
duas usinas do complexo do rio
Madeira, em Rondônia.
Após complicado processo
para as usinas obterem licença
ambiental prévia, concedida no
início de julho, o leilão foi previsto para o início de outubro.
Com nova data marcada na noite de sexta-feira para 30 de outubro, o leilão deverá ficar para
novembro, apurou a Folha.
O empreendimento é um dos
mais importantes do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). É também a principal
alternativa do governo para
evitar crise no abastecimento
de energia elétrica a partir de
2012 -quando entrariam em
funcionamento as primeiras
máquinas de Santo Antônio.
Autora dos estudos de viabilidade econômica e ambiental
das hidrelétricas, a Odebrecht
fechou previamente parceria
com a estatal Furnas (maior
empresa do setor elétrico), por
meio de um termo de compromisso sigiloso selado há mais
de dois anos. Também detém
acordo de exclusividade com
fornecedoras de equipamentos. Segundo a Camargo Corrêa
-também interessada no negócio de cerca de R$ 10 bilhões-, isso desequilibra a
competição pela usina.
Batalha jurídica
O temor do governo é que o
desentendimento provocado
pelo suposto favorecimento à
Odebrecht leve o leilão de Santo Antônio a uma longa batalha
na Justiça, inviabilizando a
conclusão da obra no prazo necessário. Para evitar esse cenário -considerado dramático
para a oferta de energia elétrica
no país-, a ministra Dilma
Rousseff (Casa Civil) chamou a
si a solução política do imbróglio. Até sexta-feira, as incertezas não haviam sido afastadas.
Segundo o Ministério de Minas e Energia, responsável pelas diretrizes do leilão, o modelo do negócio ainda não está fechado. Não haverá indicações
desse modelo na minuta do edital que a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) define
nesta terça-feira, para submeter à consulta pública.
Motivo: o governo trabalha
ainda para evitar futuros questionamentos na Justiça. Avalia
que um atraso de mais um mês
no leilão ainda não compromete o projeto. "O objetivo [do leilão] é a total isonomia", disse o
ministro interino Nelson Hubner, por meio da assessoria.
A quebra do acordo Furnas-Odebrecht chegou a ser estudada no governo, mas foi descartada por conta do valor elevado
da multa que Furnas teria de
pagar à Odebrecht.
No horizonte de planejamento do governo, não há alternativa à construção das usinas do Madeira. Sem projetos
maduros de hidrelétricas a serem licitados, o governo teria
de apelar para fontes mais caras e poluentes, como termelétricas que usam óleo combustível ou diesel. Térmicas a gás dependem do aumento da oferta
do produto, hoje escasso. No
mais recente leilão de energia,
no último dia 27, só foram contratadas termelétricas a óleo.
Especialistas e o próprio governo reconheceram a piora na
qualidade da oferta de energia.
Disputa
Na tentativa de equilibrar a
disputa, a negociação caminha
para que outras subsidiárias da
holding Eletrobrás possam se
aliar ao vencedor do leilão, mas
a Camargo Corrêa exige as
mesmas condições de Furnas
-previamente explicitadas-
sobre a taxa de retorno mínimo
que o sócio estatal vai exigir.
Nesse caso, o risco para quem
entrar sozinho no leilão é não
conseguir oferecer a tarifa mais
baixa e ficar fora da disputa. A
parceria estatal permite ao
consórcio admitir taxas de retorno do investimento menores. Pelas regras, vence a disputa quem se propuser a vender a
energia pelo menor preço.
O Estado também entraria
com o BNDES (Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social) no negócio. A expectativa é a de que o banco
possa vir a financiar de R$ 6 bilhões a R$ 8 bilhões, com cinco
anos de carência e 20 anos para
pagar, corrigidos pela TJLP
(Taxa de Juros de Longo Prazo,
6,25% ao ano), mais um
"spread" (ganho do banco) total de aproximadamente 2%.
Além do empréstimo, haveria uma sociedade com o
BNDES, por meio da BNDESPar. Nesse caso, o banco ficaria
com 20% de participação no
patrimônio líquido da empresa,
ou o equivalente a cerca de R$
600 milhões. A sociedade com
o BNDES teria data marcada
para acabar e estaria condicionada a oferta pública de ações
da empresa no médio prazo.
Equipamentos
A Camargo Corrêa quer
mais: a suspensão da validade
do acordo da concorrente Norberto Odebrecht com fornecedores de equipamentos. Segundo a empreiteira, a opção de importar equipamentos imporia alta de custo do investimento, equivalente a algo entre R$ 8
e R$ 10 por MWh (megawatt-hora) de energia. Questionamento sobre as cláusulas de exclusividade foi levado à Secretaria de Direito Econômico.
Na tentativa de tentar fazer
prevalecer seus pontos de vista,
representantes das duas empreiteiras já se reuniram com a
presidente do Cade (Conselho
Administrativo de Defesa Econômica), Elizabeth Farina. Em
questão, estão acordos feitos
entre a Odebrecht e as empresas Alstom, Voith Siemens e VA
Tech (fornecimento de turbina
tipo bulbo) e com a Siemens, a
ABB e a Areva para outros equipamentos eletromecânicos.
Além das duas empreiteiras,
o governo espera a participação
de outro grande grupo privado.
Em julho, a Suez Energy Brasil
anunciou que iria disputar as
usinas do Madeira. A multinacional já opera dez usinas no
Brasil e é responsável pela
construção de duas hidrelétricas: Estreito e São Salvador.
Outro consórcio que poderá
participar é o formado pelas
empresas Schahin, Alusa, Impsa (argentina), Ctic (chinesa),
que contava inicialmente com a
empreiteira brasileira Gautama, envolvida nas denúncias da
Operação Navalha, da Polícia
Federal.
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