São Paulo, terça-feira, 12 de setembro de 2000

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OPINIÃO ECONÔMICA

O clube do bilhão

BENJAMIN STEINBRUCH

Não é segredo para ninguém. Sou um entusiasta da empresa nacional. Acho que, sem grandes companhias capazes de competir internacionalmente, o Brasil não terá chances de sucesso no mundo globalizado. Por isso, gostei do que li na semana passada, uma pesquisa sobre o crescimento do número de empresas brasileiras com valor de mercado superior a US$ 1 bilhão.
Em 1990, segundo levantamento da Economática, publicado pela "Gazeta Mercantil", havia no Brasil apenas uma empresa de capital aberto com valor superior a US$ 1 bilhão, a Petrobras. Hoje, dez anos depois, temos 44 empresas bilionárias.
É curioso que tudo isso tenha ocorrido numa década difícil para o Brasil, quando foi necessário vencer a hiperinflação que corroía a economia e, ao mesmo tempo, superar a desconfiança generalizada do país no mercado internacional. Apesar disso, chegamos ao fim da década com um número apreciável de grandes companhias.
Os próprios formuladores da pesquisa explicam a razão desse desempenho: houve, nos anos 90, um movimento importante de consolidação dos grandes grupos, estimulado pela abertura da economia e por novos modelos de gestão introduzidos a partir das privatizações.
É gratificante verificar que a Companhia Siderúrgica Nacional e a Vale do Rio Doce, privatizadas em 1993 e 1997, processos os quais tive o privilégio de liderar, valiam no mercando menos alguma coisa, no caso da CSN, e US$ 800 milhões, no caso da Vale, em 1990. Hoje, essas grandes companhias valem US$ 2,5 bilhões e US$ 10,5 bilhões. É sinal de que a gestão brasileira foi competente para proporcionar às empresas ganhos de eficiência e rentabilidade que aumentaram o seu porte e a sua projeção internacional.
Claro que a CSN e a Vale não são exemplos isolados. A Petrobras, que permaneceu estatal, teve uma evolução extraordinária. Valia US$ 1 bilhão em 1990 e hoje vale US$ 32 bilhões. No setor bancário, o Itaú, o Bradesco e o Unibanco, só para citar as três maiores empresas financeiras privadas brasileiras, saíram de uma condição em que eram apenas bancos locais para se transformar em grandes instituições de porte internacional. Outros exemplos podem ser citados nos setores de alimentos, telecomunicações, siderurgia etc.
O que isso significa? Numa primeira análise, superficial, significa que os acionistas dessas empresas foram recompensados. Dias atrás, li um artigo revelador: mostrava que uma pessoa que tivesse investido há dez anos US$ 100 mil em ações de um grande banco brasileiro teria hoje quase US$ 6 milhões, sem contar os dividendos distribuídos no período. Ou seja, se, em vez de comprar um apartamento de classe média, que ainda vale em dólares praticamente a mesma coisa que valia dez anos antes, a pessoa tivesse comprado ações desse banco, seria hoje um milionário. O exemplo não vale apenas para esse banco, mas para várias dessas empresas listadas na pesquisa da Economática.
Mas isso não é o mais importante. O que importa, em primeiro lugar, é a lição geral que se pode tirar dessa pesquisa: um país, nesses tempos da globalização, só terá sucesso se puder estimular a formação de grandes corporações internacionalmente competitivas.
Não é por acaso que o Brasil assumiu, há duas semanas, abertamente, a posição de líder da América do Sul. A liderança política, mais do que nunca, se faz com poder econômico. O Brasil tem hoje 44 companhias abertas com valor de mercado superior a US$ 1 bilhão. O México, com todo o avanço recente proporcionado pela ligação umbilical aos Estados Unidos, tem apenas 28. A Argentina, 17. E a Venezuela, 2. E, para quem quiser entender por que os Estados Unidos têm tanto poder, basta ver quantas empresas bilionárias têm sede naquele país: 214.
A lição maior dessa pesquisa, portanto, refere-se ao comportamento que o Brasil deverá ter na próxima década em matéria de desenvolvimento empresarial. Não há espaço para displicência na tarefa de estimular a formação de grandes players internacionais nos setores mais competitivos da economia brasileira.
Entregar de mão beijada ao capital internacional alguns setores como mineração, siderurgia, têxtil, celulose, de calçados e agrobusiness, entre outros, significa abrir mão de poder no mundo atual. Sem esse poder, o Brasil terá grande dificuldade para levar adiante programas que darão bem-estar aos brasileiros no século 21.


Benjamin Steinbruch, 47, empresário, é presidente dos conselhos de administração da Valepar e da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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