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OPINIÃO ECONÔMICA
O problema externo no Brasil e na Argentina
ANTONIO BARROS DE CASTRO
Em artigo recentemente
publicado na "Revista da
Cepal" (agosto de 2001), Roberto Frenkel se mostra convencido
de que Brasil e a Argentina se
encontram hoje em "trajetórias
macroeconômicas insustentáveis, pela tendência explosiva
das obrigações da dívida externa". Os dois países são definidos
como "altamente endividados"
e tendo "como principal problema o refinanciamento das dívidas e o financiamento do déficit
de transações correntes determinado pelos serviços de capital
(juros e lucros)".
Nessa perspectiva -também
presente no debate brasileiro-,
teríamos voltado à situação em
que nos encontrávamos em 1980
e que se arrastou até que o Plano Brady permitiu o cancelamento de cerca de 30% das obrigações. Diante desse quadro,
acrescenta o autor, o mercado
"aplica prêmios de risco elevados" -e a economia se mantém
prisioneira de uma armadilha
financeira.
Apresento no que segue alguns
comentários aos argumentos de
Frenkel.
Primeiramente, é hoje difícil
discordar de que o Brasil -do
ponto de vista das suas contas
externas- estava rapidamente
caminhando em direção à situação descrita por Frenkel. A
dívida externa brasileira saltou
de 29% do PIB para 43% do PIB
entre 1994 e 1998, enquanto as
exportações patinavam e o país
perdia "market share" por toda
a parte -salvo o caso especial
do Mercosul.
Não se pode também negar
que o mercado financeiro internacional tem tratado o Brasil
como membro de um grupo de
risco, ao qual vêm sendo aplicados "prêmios" ("spreads") extremamente elevados -dando
com isso a entender que em alguma medida compartilha o
diagnóstico de Frenkel.
Mas há também contra-argumentos ante a posição até aqui
apontada.
Primeiramente, convém verificar se a dívida externa dos dois
países é de fato da mesma ordem de grandeza. E a esse propósito é importante advertir
que, mesmo tendo em conta as
enormes desvalorizações ocorridas no Brasil, a dívida aqui
atinge hoje 40% do PIB. Na Argentina -onde o PIB em dólares encontra-se superestimado-, o valor é de 52%. Em outras palavras, se a Argentina,
porventura, sofresse uma desvalorização (real) equivalente à
aqui verificada, o peso da dívida
saltaria para algo como 94% do
PIB!
Por outro lado, no caso do
Brasil, a dívida externa e o déficit de transações correntes não
apenas deixaram de crescer como sofreram alguma redução
nominal desde a desvalorização, o que vem sendo acentuado, entre outros, por Octavio de
Barros.
Essas duas ponderações não
nos levam, contudo, a concluir
(como fazem alguns) que o problema brasileiro é meramente
conjuntural. Lamentavelmente,
estamos de volta a uma difícil
situação de balanço de pagamentos. Mas as dificuldades estão centradas no déficit de transações correntes, e não na dívida.
Primeiramente, porque nos
últimos três anos os investimentos diretos externos têm financiado integralmente os megassaldos negativos da conta corrente, e isso praticamente desapareceu como possibilidade.
Alem disso, porque a reação à
desvalorização tardou a surgir
e, quando começou a revelar-se
vigorosa, ao longo de 2000, a
economia mundial começava a
ser derrubada pela desaceleração norte-americana.
Finalmente (e sobretudo) porque, como tem assinalado Pires
de Souza, a economia brasileira
hoje apresenta um elevado déficit de transações correntes (5%
do PIB), sem ter praticamente
crescido nos últimos anos. Afinal, elevados saldos correntes
negativos são característicos de
fim de ciclo expansivo: aqui, porém, o crescimento praticamente não começou!
Antonio Barros de Castro, 58, professor titular da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro) e ex-presidente do BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social),
escreve às quartas-feiras, a cada 15
dias, nesta coluna.
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