|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Bolívia e ambientalistas contestam usinas
Cientistas criticam estudo de impacto ambiental e dizem que represas de hidrelétricas em Rondônia ameaçam ecossistemas
Riscos ao ambiente já provocam a reação de ONGs bolivianas, e ministro de Evo
Morales diz que governo vai anunciar posição em breve
RAFAEL GARCIA
FABIANO MAISONNAVE
DA REPORTAGEM LOCAL
As usinas hidrelétricas do rio
Madeira, promessa de campanha do presidente Lula, podem
causar problemas ambientais
no Brasil e na Bolívia, onde começa a se intensificar a reação
contra o projeto.
A conclusão é de uma série de
relatórios encomendados pelo
Ministério Público de Rondônia, que pediu a especialistas
uma avaliação do estudo de impacto ambiental (EIA) apresentado pelos construtores.
De acordo com os pareceres,
obtidos pela Folha, o estudo
original precisa ser aprofundado, pois não deixa claro se as
usinas de Santo Antônio e Jirau -um projeto de R$ 20 bilhões- conseguirão driblar
problemas como perda de florestas, escassez de peixes e colapso de ecossistemas.
"O EIA diz que não ia ter nenhum impacto para a Bolívia,
mas deve ter vários", disse à
Folha o biólogo Philip Fearnside, do Inpa (Instituto Nacional
de Pesquisas da Amazônia), autor de um dos pareceres entregues aos promotores. O Madeira é o principal rio do país vizinho. "Um argumento usado em
favor das usinas é que a área
inundada será pequena em relação à capacidade instalada
[6.500 MW], mas esse benefício está sendo exagerado."
Fearnside e outros autores
afirmam que o modelo usado
para prever o padrão de deposição de sedimentos no rio é rudimentar e as áreas alagadas
podem acabar sendo maiores.
"Haverá impacto na Bolívia
porque o ciclo anual de enchente e vazante desce à altitude de
85 metros na junção entre os
rios Abunã e Madeira [na fronteira], mas com o lago o nível da
água ficará sempre em 90 metros." Segundo ele, uma grande
área de vegetação de igapós,
que na natureza fica alagada só
sazonalmente, acabaria submersa para sempre e morreria.
Outro consultor, Ronaldo
Barthem, do Museu Paraense
Emílio Goeldi, afirma que o ciclo de reprodução de peixes importantes para a pesca local pode ser afetado pelas turbinas
das usinas. "A pressão da água
nesses compartimentos é exagerada e pode ser um fator multiplicador da taxa de mortalidade de ovos e alevinos dos peixes
migradores", escreve.
Para José Galizia Tundisi, especialista em recursos hídricos,
o EIA precisa ser melhorado,
"até para não comprometer o
futuro funcionamento da usina". Em parecer, diz que questões sobre fluxo de sedimentos
no rio e transporte de madeira
em corredeiras estão pendentes. "Não sou contra o empreendimento. Sou a favor de
análise mais aprofundada."
O Ministério Público de Rondônia está tentando impedir
audiências públicas nas quais o
Ibama está apresentando o
projeto à população local, que
considera precipitadas. O Ibama conseguiu, na semana passada, derrubar liminares que
suspendiam quatro delas.
Além da fronteira
O projeto brasileiro gerou
uma série de críticas na Bolívia
e tem ganhado destaque na imprensa local, que pede uma posição do governo Evo Morales.
No início do mês passado, autoridades locais, ambientalistas e sindicalistas se reuniram
na cidade de Riberalta, a 80 km
da fronteira com o Brasil. O encontro produziu um duro documento contra a construção das
represas, assinado por lideranças locais e por ONGs como a
Fobomade (Fórum Boliviano
de Meio Ambiente e Desenvolvimento), que tem forte influência no governo.
O texto afirma que, se construídas, as represas terão um
profundo impacto na Bolívia,
como o represamento de rios
menores, e diz que o Brasil vem
tratando do assunto unilateralmente. Em editorial há duas semanas, o jornal "La Razón" diz
que o Brasil vem "ignorando
normas para o uso de águas que
são de curso internacional".
Anteontem, o ministro boliviano da Água, Abel Mamani,
disse à Folha que ainda não
tem posição fechada sobre o tema, mas se pronunciará nos
próximos dias. "Ainda estamos
considerando todos os informes que nos estão chegando."
A principal medida da Bolívia sobre o assunto até agora é
um decreto assinado por
Eduardo Rodríguez, antecessor de Morales. Ele estabelece
que o Estado boliviano não cederá licença ou concessão na
bacia do rio Madeira enquanto
não houver um estudo oficial
sobre os recursos hídricos.
Texto Anterior: Filme da Disney para televisão vira febre pré-adolescente Próximo Texto: Outro lado: Ibama ainda não aprovou projeto, afirma diretor Índice
|