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LUÍS NASSIF
A responsabilidade fiscal
A Lei de Responsabilidade Fiscal poderá se constituir em um
marco nas finanças públicas brasileiras, se conseguir eliminar, vez
por todas, a mais nefasta das práticas administrativas brasileiras,
ao lado da corrupção: a criação
de passivos, transferidos de uma
administração para outra.
Na emenda constitucional da
reforma administrativa, o Congresso estipulou prazo até dezembro próximo para o Executivo enviar lei regulamentando a matéria. A lei ditará normas e princípios gerais de finanças públicas e
será complementada por uma lei
complementar, que estabelecerá
normas para o Orçamento público.
Já existe uma série de normas e
leis espalhadas, que serão consolidadas para se atingirem esses
fins. Há desde a chamada "lei de
ouro", aplicável a qualquer administração pública (operação de
crédito não deve custear gasto
corrente), a Lei Camata (que estabelece limites de gastos com
pessoal) até as competências atribuídas ao Senado, especialmente
a que define limites para a dívida
consolidada.
Todos esses procedimentos devem ser obedecidos na confecção
dos dois documentos orçamentários básicos: o Plano Plurianual
(PPA), que define gastos e investimentos da administração durante o triênio, e a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO), que quantifica receitas, despesas, resultado, dívida e patrimônio para cada período.
Ajustes
Há sempre a possibilidade de
desvios de rota nas previsões, provocados, por exemplo, por uma
recessão prolongada. A Nova Zelândia permite ajustes por meio
da adoção de médias móveis.
Também há a necessidade de se
preverem mecanismos que identifiquem e permitam a correção do
déficit ou da dívida considerados
excessivos. A Europa recorre de
relatórios até multas. Nos Estados
Unidos prevêem-se mecanismos
quase lineares de contingenciamento de despesas.
No Brasil, pretende-se utilizar
mecanismos obrigatórios, amparados pela Constituição, como a
demissão por excesso de pessoal
ou as normas para aumentos de
benefícios na seguridade social.
Pensa-se incluir normas que permitam aumentar as disponibilidades nas transferências constitucionais, sem quebrar a propriedade. No campo das punições, penalidades severas, inclusive de
caráter pessoal (da inelegibilidade ao crimes de responsabilidade)
aos responsáveis por distorções
consideradas excessivas.
Má gestão
Em janeiro, durante o 10º Seminário Regional de Política Fiscal,
passou quase despercebida a palestra de Teresa Ter-Minassian,
do FMI, sobre administração da
dívida pública.
Vício básico -comentado na
coluna "Independência para o
Tesouro"- é a vinculação da dívida pública à política monetária, ambas administradas pelo
BC. Como toda a dívida pública é
atrelada à política de juros do BC,
papéis de longo prazo do Tesouro
passaram a ser remunerados de
acordo com as taxas de curto prazo praticadas pelo BC.
Teresa recomenda expressamente a constituição de um escritório especial, que venha a administrar a dívida pública, com técnicos de alto nível independentes
do Ministério da Fazenda. Já seguiram essa direção Áustria, Irlanda, Nova Zelândia, Suécia e
Portugal.
Em relação à contratação de dívida externa, as opiniões da técnica do FMI são taxativas:
* O recurso exagerado à dívida
externa pode aumentar substancialmente a vulnerabilidade do
país, a menos que a acumulação
da dívida se reflita numa acumulação equivalente de reservas internacionais, e ainda assim há
custos envolvidos, pois, em geral,
a taxa de retorno das reservas é
menor que o custo da dívida.
* É especialmente importante
evitar a concentração de amortizações, o que, por si só, pode levantar preocupações nos mercados internacionais e criar dificuldades no refinanciamento das dívidas.
Quando confrontados com esses
temas, diretores do BC sempre
sustentaram que era um falso dilema, porque as dívidas eram privadas, não públicas. Acontece
que o pagamento se faz com dólares, que constam das reservas do
BC. A consequência óbvia foi a
fuga de dólares, levando o BC a
estatizar imediatamente a dívida
externa, por meio da negociação
desse empréstimo-ponte com o
FMI.
* O recurso exagerado à emissão de dívida interna com variação cambial é visto como sintoma
da falta de confiança dos mercados na sustentação da política
cambial do país, que se manifesta
em uma procura por altos prêmios sobre a dívida denominada
em moeda local. Nesses casos, frequentemente o custo "ex post" da
dívida, em seguida à inevitável
desvalorização cambial, excede
em muito o custo que teria sido
pago sobre a dívida se tivesse sido
emitida sem garantia cambial.
Clube do atraso
Depois de classificar indistintamente todos os críticos das políticas monetária e cambial de "coalizão do atraso", o ex- ministro
Mailson da Nóbrega começa a
admitir que pode haver lógica nas
colocações de alguns dos "atrasados".
Mas, como as afirmações de
Mailson são sempre precedidas de
muita análise, e dado o tom extremamente taxativo de suas colocações, não se espera que ele vá
mudar de opinião nos próximos
meses.
E-mail:lnassif@uol.com.br
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