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São Paulo, sexta-feira, 12 de dezembro de 2003

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LIBERALIZAÇÃO

Douglass North, vencedor do prêmio em 93, diz que países em desenvolvimento tendem a ser prejudicados

Livre comércio pode prejudicar os pobres, diz Nobel

ÉRICA FRAGA
DA REPORTAGEM LOCAL

Diferenças institucionais significativas entre países desenvolvidos e nações em desenvolvimento fazem com que o livre comércio entre ambas tenda a prejudicar o segundo grupo. O pensamento é, por incrível que pareça, de um liberal: o economista Douglass North, 83 anos, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, em 1993.
O economista norte-americano está de passagem pelo Brasil onde participará de um evento acadêmico. Ele defende a importância de instituições que reforcem a prática das leis como forma de promoção do desenvolvimento econômico e elogia as mudanças que estão sendo implementadas no Brasil. Veja as opiniões dele, divididas por tópicos.
 

BRASIL -
"O Brasil sempre teve uma das piores distribuições de renda do mundo. Eu acho que esse é um fator inibidor do crescimento. Muito mais que isso, o Brasil tem tido um sistema político que não estimula, particularmente, projetos de educação para grupos de baixa renda. Se você tem uma população pobre, tem de estabelecer um sistema educacional que aumente o nível de habilidade dessas pessoas. O Brasil tem um longo caminho a seguir. As coisas parecem promissoras no Brasil nestes dias. Mas eu não sei, vou esperar para ver."

TROCAS -
"Na América Latina, vocês herdaram do sistema estabelecido por Portugal e Espanha o que eu chamo de trocas pessoais. São os tipos de estrutura de trocas, nos níveis político e econômico, nos quais as trocas funcionam bem se você conhece a outra parte, se você é membro da família. Mas não foi criado um clima apropriado para as trocas impessoais, necessárias para que uma economia funcione bem.
Vocês têm de criar um corpo de regras da lei impessoal que permitam que eu possa negociar com você e nunca ver você de novo. E você não vai me enganar e eu não vou te enganar."

CHINA -
"Eu vou à China todo ano. Sou uma estrela de rock na China [risos]. A razão para isso é que a China leva a sério as análises institucionais. Até hoje, na China, as trocas pessoais dominam o modo como o sistema funciona. Eles têm nos livros regras de direitos de propriedade, mas elas não significam muito.
Mas eles estão seriamente tentando mudar esse jogo. Se os chineses serão bem-sucedidos ou não, é uma pergunta interessante.
No que se refere à América Latina, eu não vejo nenhum sistema político, partido político que esteja se abrindo, que venha sendo tão consciente sobre os problemas que enfrentam, como os chineses têm sido."

DEMOCRACIA -
"O que não sabemos ainda é como criar um sistema político que colocará em prática, seja numa democracia ou em outro regime, regras do jogo que levem ao crescimento.
Não há relação clara entre democracia e crescimento. Por outro lado, você olha Taiwan, Coréia do Sul, Cingapura e são todos países que conseguiram manter taxas muito altas de crescimento sob ditaduras ou regimes autoritários. E os dois primeiros conseguiram, gradualmente, evoluir para uma democracia."

IRAQUE -
"No caso do Iraque, os EUA -que mergulharam em uma confusão enorme na qual não tinham idéia do que estavam fazendo- pensam que vão conseguir instalar uma democracia lá nos próximos um ou dois anos. Isso é uma insanidade."

LIVRE COMÉRCIO -
"Numa área de livre comércio, você só consegue importar boas instituições de outros países caso se trate de situação em que todos têm nível parecido de desenvolvimento.
Nenhum economista pode manter suas credenciais sem apoiar o livre comércio. Mas temos de reconhecer que chegar lá é outra coisa. Se você tem livre comércio entre todos os países desenvolvidos, com relações estáveis, regras da lei, vai dar certo. Mas, se você é um país pobre e tenta se abrir para o comércio, você pode ser bem-sucedido-a China é um exemplo interessante-, mas enfrentará várias desvantagens em relação aos países desenvolvidos."

FMI -
"Por muito tempo, o FMI foi a síntese de tudo o que eu sou contra. Agora, o FMI agora quer que eu vire um conselheiro deles. Eu dou palestras lá todo ano. Mas eu acho que o FMI já deu muito conselho ruim, porque ignorava o tipo de problemas institucionais fundamentais, que são o pano de fundo, em todo lugar, para explicar a disparidade no bem-estar econômico das sociedades."

MUDANÇA -
O que você realmente deveria ter são estruturas institucionais que vão, gradualmente, mudando o jeito como o jogo é jogado. E, no caminho, você quer garantir que não afete negativamente as famílias de baixa renda. E isso é difícil de fazer. Estou fascinado em ver o que vocês vão fazer aqui no Brasil. O país está prestes a fazer algo que me interessa muito: construir uma economia que funciona melhor mas, ao mesmo tempo, não prejudica as pessoas, como os mais pobres, que têm sido protegidas por regras muito ineficientes do jogo."


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