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OPINIÃO ECONÔMICA
Uma camisa-de-força
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Volto à questão da inflação!
Os dados mais recentes mostram que a última ata do Copom
(Comitê de Política Monetária do
Banco Central) foi uma farsa. Sabemos hoje que a linguagem dura
utilizada tinha como objetivo reduzir o entusiasmo do governo
Lula com a queda da taxa de juros. Seu alvo era o público interno, em um claro exemplo do que
se chama em linguagem bélica de
"fogo amigo". O BC queria mostrar que ainda é muito cedo para
cantar vitória sobre a inflação e
que não aceita colocar a política
monetária a reboque da busca do
crescimento.
Entendo que o Copom tenha
optado por interromper a queda
de juros por um ou dois meses para ver como se comportam os
principais índices de inflação neste início de ano. Não concordo,
mas reconheço que existe uma diferença de responsabilidade entre
os que estão dando palpite e
aqueles que são responsáveis pela
política monetária de um país.
Portanto, se essa tivesse sido a
mensagem do Copom, nada a declarar. Mas confundir aumentos
sazonais e pressões localizadas
por conta de setores influenciados
por condições externas com uma
mudança na qualidade do fenômeno da inflação é uma agressão
contra a teoria econômica.
Inflação é um processo continuado de aumento de preços, alimentado por canais que transmitem para todo o tecido econômico
elevações pontuais em setores
pressionados por demanda ou
choques de oferta. Para que isso
ocorra, é necessário que esses canais, normalmente emissão de
moeda e expansão do crédito e
aumentos salariais, estejam ativos na economia. Se isso não
ocorre, e esse é o caso do Brasil hoje, o aumento de determinados
preços, em razão de condições
particulares no equilíbrio entre
oferta e demanda, não gera inflação, mas apenas uma mudança
nos preços relativos e na distribuição de renda na economia.
Tomemos como exemplo o que
está ocorrendo nos EUA hoje. A
desvalorização do dólar e a elevação dos preços dos derivados do
petróleo, dos serviços médicos e de
produtos intermediários como o
aço estão provocando aumento
nos índices inflacionários não-expurgados. O Fed, apesar disso,
mantém inalterada sua política
monetária, na medida em que os
canais de renda do trabalho e do
emprego não estão ativos neste
momento. Também não ocorre
nenhum gargalo de produção importante, na medida em que há
uma ampla capacidade ociosa na
economia.
O problema que enfrentamos
no Brasil não está sendo criado
por um processo de aumento dos
preços neste início do ano, mas
sim pelo sistema "burro" de metas de inflação que foi implantado em 1999. Na crise externa que
vivíamos e com o abandono da
âncora cambial que vigorava desde 1995, foi necessário criar imediatamente uma âncora monetária para acalmar os mercados. Na
verdade, a flutuação do real foi
uma cirurgia a céu aberto e, portanto, realizada com todos os riscos e dificuldades que caracterizam essa operação.
O governo foi obrigado, então, a
definir um sistema de metas inflacionárias rígido e sem nenhuma qualificação. A razão principal dessa rigidez foi a impossibilidade de convencer os mercados,
naqueles momentos de grande
crise de confiança, a aceitar um
sistema flexível e que permitisse
acomodar pressões de preços em
situações particulares. Compreendo essa decisão naquele momento agudo, mas não entendo
por que ele não foi corrigido depois que as coisas acalmaram.
Está claro que metas de inflação
que seguem o calendário civil em
uma economia que não trabalha
com índices de preços dessazonalizados geram tensões constantes.
Estamos vivendo uma delas neste
momento, agravada pelo extraordinário crescimento de nossas exportações e pela criação de gargalos importantes de produção em
setores sensíveis. A única forma
de atender o valor central da meta inflacionária fixada para 2004
nessas condições será aumentar a
perda de renda do consumidor e
aprofundar a recessão nos setores
ligados ao consumo interno. Em
outras palavras, reduzir a absorção interna de automóveis e outros bens de consumo duráveis e
não-duráveis para equilibrar o
volume de produção de aço e outros produtos desviados para o
mercado externo.
Esse será certamente o efeito de
um Banco Central que não acomoda as pressões de preços que
estão acontecendo. Os índices de
produção industrial em dezembro apontam para a interrupção
do crescimento da indústria, que
vinha ocorrendo depois de agosto
do ano passado. Vamos esperar
as informações sobre o mês de janeiro para medir o estrago já feito
pelo Banco Central nessa sua busca impossível de uma inflação rígida de 5% neste segundo ano de
mandato do presidente Lula.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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