São Paulo, sábado, 13 de março de 2010

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ANÁLISE

Como perenizar o crescimento

PAULO PEREIRA MIGUEL
ESPECIAL PARA A FOLHA

A divulgação do PIB de 2009 na quinta-feira passada oferece uma oportunidade para avaliar os caminhos recentes da economia brasileira e considerar trajetórias para o futuro.
De 2004 a 2008, o dinamismo da economia teve origem externa. O choque positivo em nossos termos de troca (preços das exportações em relação aos das importações), decorrente do impacto sistêmico da China na demanda de matérias-primas, eliminou o endividamento externo, principal restrição histórica ao crescimento.
A partir daí, foi desencadeado o longo e gradual processo de redução da taxa real de juros, que disseminou as condições externas favoráveis para o restante da economia. As políticas de transferência de renda e de aumento do salário mínimo também tiveram papel importante e ajudaram a consolidar alguns vetores internos de crescimento. O resultado foi a aceleração da economia em bases equilibradas: a participação do consumo permaneceu estável, em torno de 60% do PIB, houve aumento do investimento em paralelo (grosso modo) ao da poupança doméstica e o Brasil cresceu sem incorrer em deficit externos significativos. Esse foi o "primeiro estágio", que se esgotou.
Com a crise de 2008, o equilíbrio foi interrompido, ainda que, em parte, temporariamente. A forte -e correta para o momento- reação da política econômica à crise resultou no aumento da participação do consumo (privado + público) na economia para 83,6% do PIB em 2009 (ante 79,9% em 2008). A contrapartida foi a queda da poupança interna, para 14,6% do PIB.
Passada a crise, é importante considerar como perenizar o crescimento: será o segundo estágio, que precisará ser construído nos próximos anos. As alternativas são, pelo menos, duas: 1) manter a trajetória atual, contar com consumo e financiar o necessário aumento do investimento com poupança externa crescente ou 2) iniciar políticas que levem progressivamente ao aumento da poupança interna e evitem que o país incorra em deficit externos preocupantes -por exemplo, próximos a US$ 100 bilhões- já a partir de 2011.
Tem sido demonstrado amplamente que os países em desenvolvimento mais bem-sucedidos em manter crescimento alto e estável por longos períodos são os que se alicerçaram em financiamento doméstico e na manutenção da competitividade da indústria.
É inescapável que cada alternativa envolva escolhas diferentes nos próximos anos, que estão no campo da economia política. Seria equívoco, entretanto, considerar que o país está fadado a manter o curso atual.


PAULO PEREIRA MIGUEL é economista-chefe da Quest Investimentos.


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