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ARTIGO
Cartões de crédito e competitividade
MAX IERVOLINO BASILE
Não há como negar que a competitividade do negócio de cartões
de crédito é hoje, seguramente,
uma das mais altas e estimulantes
dentre os diversos setores da economia. Temos sido diariamente
colocados à prova para estabelecer
vínculos de relevância com os
clientes capazes de determinar
que, na hora H -a da compra-,
ele utilize o nosso produto. É um
exercício permanente de criatividade, marketing e relacionamento, que requer ferramentas apropriadas e profissionais talentosos.
Os indicadores internacionais
têm mostrado que, como é natural, os mercados com mais problemas de ativação são exatamente os
mais competitivos, em que as
compras ficam diluídas entre os
vários cartões.
Até bem pouco tempo atrás, um
cartão de crédito -especialmente
se revestido do glamour da versão
gold- era privilégio de poucos.
Hoje, nos grandes centros, a oferta
já é maior que a procura: a média
de quatro cartões por cliente dá a
medida da expansão do mercado e
redireciona o foco da discussão
para uma cena predominantemente qualitativa.
Na medida em que o fator "novidade" de um produto perde fôlego -"comoditizando-se" pela
massificação-, ele precisa ser
compensado por vantagens mais
consistentes ao longo do tempo,
para manter a percepção de valor
pelo mercado.
Nesse ponto, um dilema: diante
da cobrança premente por metas
agressivas de vendas e a crescente
dificuldade de incrementar os diferenciais do produto em face da
concorrência, o mercado foi levado, como recurso de ocasião, a um
processo de degradação do preço
dos cartões, em grande medida
maléfico e difícil de resgatar.
Maléfico porque, ao degradar o
preço, na verdade contribuiu-se
para depreciar fortemente a noção
de valor agregado do produto. E
difícil de resgatar porque o cliente
já se habituou a não ter que pagar
pelo produto, o que tornará difícil
a adesão a um cartão que não se
lhe ofereça de graça. Formou-se
um círculo vicioso, no qual o consumidor sente-se confortável por
não ser cobrado e os administradores sentem-se respondidos pelos rápidos resultados de vendas.
A face mais sombria desse quase
consenso tácito já começa a produzir seus efeitos mais perversos:
receitas canibalizadas e clientes
absolutamente infiéis, capazes de
trocar de cartão a cada ano, tão logo prescreva o período de gratuidade.
A depreciação das linhas de receita do cartão, enquanto os custos operacionais permanecem fixos e elevados e as perdas de crédito e fraude ainda não estão estabilizadas, coloca em xeque o nosso
negócio.
No afã de ganhar mercado, muitas vezes a troca de rentabilidade
por "market share" é uma decisão deliberada, mas que deve estar
sustentada por um planejamento
estratégico e de metas de longo
prazo. Do contrário, estará expondo o negócio a risco de descontinuidade na primeira troca de gestão.
O desafio que se impõe é o de
resgatar a percepção de valor dos
cartões no mercado, para gerar
convicção de compra no cliente,
que deve perceber o produto como relevante o bastante para adquiri-lo. Adquiri-lo -pagando
por ele o preço justo pelo que
apresenta diante das ofertas de
mercado- e utilizá-lo, garantindo a manutenção do fluxo de receitas ao longo do seu ciclo de vida.
Nesse sentido, com efeito, os
cartões "co-brand" -que têm
por definição a característica de
agregar vantagens competitivas
concretas e tangíveis ao produto- talvez ainda sejam a melhor
alternativa de crescimento com
qualidade das carteiras. Além de
evidenciar claramente o benefício
oferecido para formar a decisão de
adesão no consumidor, têm o
condão permanente de estimular a
frequência de uso: quanto mais
usar, mais próximo estará da recompensa almejada.
Especialistas em competitividade, aliás, têm apontado dois caminhos. Um deles é exatamente o estabelecimento de programas de
"co-brand". O outro é promover
revisões periódicas (para cima) de
limites de crédito para os melhores clientes.
Portanto a estratégia de gestão
fundamentada no conceito de
vantagens e benefícios resgatáveis
na esfera de interesse do cliente
-em essência, traduzida no
"co-brand"- ressalta como das
mais competitivas em uma cena de
elevadíssima concorrência.
O problema que se apresenta, e
que pode explicar a razão da desconfiança despertada em alguns
administradores, é o exato dimensionamento da dinâmica de lucratividade diante do repasse de verbas requerido para sustentar as
parcerias.
Muitas vezes as administradoras
repassam linhas inteiras de receita
aos parceiros, depredando parte
sensível da sua rentabilidade.
Um produto que, por exemplo,
repasse o equivalente à linha de intercâmbio ao parceiro e isente a
primeira anuidade dos clientes terá problemas para equilibrar suas
contas em menos de cinco anos.
Isso certamente representará
uma crise de rentabilidade negativa, que tenderá ao abandono do
programa.
O estabelecimento da verdadeira
parceria "ganha-ganha" pressupõe uma negociação lastreada na
permissibilidade dos encargos decorrentes do programa em face da
dinâmica de lucratividade do produto. Isso precisa ser transparente: não é possível assumir custos
fixos de parceria superiores a uma
projeção conservadora de receitas
do produto. Bem articulada a definição do produto nessa etapa
(muito mais difícil do que possa
parecer), pode-se estar a meio caminho da solução para a crise de
ativação e retenção de clientes em
nosso segmento.
A proposta, entretanto, está longe de ser conclusiva. A bem da verdade, o debate sobre o tema está só
começando. É estimulante constatar que o mercado já se lançou a
ele.
Max Iervolino Basile, 31, advogado, é gerente-geral da área de cartões de crédito do Banco
Safra.
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