São Paulo, sexta-feira, 13 de agosto de 2004

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LUÍS NASSIF

É a política, estúpido

Ficou famosa a frase do assessor de Bill Clinton sobre a campanha eleitoral norte-americana, alertando para o tema que no final prevalece. Vale o inverso para a mudança do modelo econômico e para o novo salto que o país experimentará nas próximas décadas: é a política, estúpido!
Sem consenso nacional, batalhado no campo das idéias e dos conceitos, sem a adesão dos diversos setores que compõem a sociedade, não se avançará mais do que guerras retóricas.
Não se está mais no país dos tenentes nem dos generais. Tampouco no país do populismo ou de outros momentos da história nos quais um grupo detinha uma idéia e a transformava em bandeira salvadora.
Nas últimas semanas, procurei traçar um quadro das potencialidades que o país acumulou nessas décadas perdidas, como idéias inovadoras avançaram em várias frentes, a maneira como o país se sofisticou. Falta agora a arrumação política, que é o ponto crucial.
Os diversos centros de pensamento inovador pouco conversam entre si. Grandes corporações, elite acadêmica, APLs, economistas desenvolvimentistas, diplomacia, área militar etc. O "estalo de Vieira" que precipitará o processo de crescimento se dará no momento em que todos se olharem e se verem partes de um mesmo corpo, somando e trocando competências -aprimoramento da gestão, busca da inovação, investimento em educação e saúde, ousadia diplomática, integração física do continente, parceria com as subsidiárias de multinacionais.
É dessa visão integral de país que emerge o sentimento de nacionalidade capaz de empurrá-lo em direção ao futuro, com todas as peças funcionando simultaneamente.
É por isso que o conceito de pacto faz todo o sentido. E pacto implica relações prévias civilizadas no campo político. Há valores que não podem ser desrespeitados, menos ainda pelos que são poder, como a impessoalidade no trato da coisa pública, o respeito aos direitos individuais, à liberdade de imprensa.
E há que cuidar da retórica. Na política, valem os atos e valem as declarações. A guerra das idéias se dá em um círculo restrito de pessoas. Quando as velhas idéias são superadas, gradativamente as novas idéias começam a conquistar círculos maiores, até chegar ao último estágio -o dos cultivadores de clichês. Hoje os chamados "desenvolvimentistas" no governo são muito mais atacados pelo desperdício da retórica do que pelas idéias.
Como toda guerra de idéias, as vitoriosas se impõem sobre as moribundas, o que estimula o espírito aguerrido que povoa as grandes discussões públicas. Mas, se se perder de vista a idéia do pacto, se se permitir que os embates eleitorais criem um racha, se se passar a sensação de que idéias serão colocadas a serviço de interesses partidários ou conspiratórios, será mais uma oportunidade perdida e a reedição das polarizações políticas do passado.
O país já tem as condições para a virada. Mas só conseguirá desatar esse nó górdio o governante que conseguir pairar acima das paixões partidárias.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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