São Paulo, Sexta-feira, 13 de Agosto de 1999
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LUÍS NASSIF

Uma revolução no futebol

A pouca familiaridade da imprensa esportiva com temas econômicos e da imprensa econômica com temas esportivos e o fato de na negociação estar envolvida a controvertida Traffic impediram a real avaliação do contrato firmado pelo Sport Club Corinthians Paulista com o fundo de investimentos norte-americano HMTF (Hicks, Muse, Tate & Furst), do americano Thomas Hicks. Trata-se de uma revolução similar à inauguração do estádio do Maracanã, em 1950. É o início efetivo de uma era de profissionalismo no futebol que parecia nunca mais chegar.
O acordo entre o Corinthians e a HMTF, já sob a égide da Lei Pelé, muda completamente essa relação e reescreve a história do futebol brasileiro.
Antes dele, havia apenas acordos de patrocínio, muitas vezes utilizados como modo de evasão de tributos. O mais conhecido dos acordos -do Palmeiras com a Parmalat- acabava criando um conflito de interesses insolúvel. À Parmalat interessava basicamente a visibilidade da sua marca. Por isso, tinha pleno interesse em reduzir o máximo possível os custos de transmissão pela televisão. E, para ter sua marca veiculada, ainda era obrigada a comprar cotas de patrocínio. A parte do leão acabava ficando com as televisões.
Agora mudou o jogo. O fundo não quer patrocínio, mas ganhar dinheiro com o próprio futebol. Suas fontes de receita serão a arrecadação dos jogos, os direitos de transmissão, a exploração da marca, em produtos licenciados e na venda de jogadores. E a ambição é dar visibilidade mundial aos seus parceiros -tarefa fácil com o país de maior tradição futebolística do mundo.
Para tanto, o HMTF fez investimentos pesados para a realidade brasileira e pequenos para a sua. De cara, pagou jóia de R$ 7 milhões, depois outra tranche de R$ 14 milhões. Além disso, comprometeu-se a bancar pelos próximos dez anos todo o custo do departamento de futebol, incluindo divisões inferiores, em um desembolso de R$ 2,5 milhões mensais.
Entre as demais propostas da HMTF está a construção de um estádio multiuso para 40 mil pessoas, comportando de jogos de futebol a bailes, que ao final do contrato será doado ao clube. Essa tendência praticamente está levando à desativação dos grandes estádios -tipo Morumbi ou Maracanã-, que ficaram inviáveis com o advento da televisão. Nos próximos meses, o simbólico estádio de Wembley será demolido para dar lugar a um estádio multiuso.

Contratações
No seu primeiro lance, o grupo americano investiu R$ 45 milhões na compra ou aluguel de novos jogadores -mais do que todos os demais clubes paulistas juntos. Para conferir estabilidade ao seu negócio, a única exigência do fundo foi a indicação do diretor de futebol, para livrar o negócio em si de injunções políticas.
Com o dinheiro recebido, o Corinthians está terminando três centros de treinamento.
Além disso, receberá 15% do que for faturado. Na venda de jogadores revelados pelo Corinthians, o lucro será repartido meio a meio. Sobre a valorização de jogadores que eles adquirirem, recebe 15%.
O primeiro exemplo do estilo HMTF se deu na negociação dos direitos de televisionamento com a Skynet, da Globo -canal pago. Enquanto os demais clubes negociavam em bloco, aceitando luvas fixas, os americanos pularam fora e passaram a negociar em separado. No caso do pay-per-view (em que cada telespectador paga pelo direito de assistir ao jogo), não aceitam mais luvas genéricas, mas exigem percentuais sobre a venda para cada telespectador.
O lance levou a Globo a sair correndo, pagando luvas adiantadas para os demais clubes, antes que explodisse um leilão oneroso.

Justiça
Pelo visto, a vereador paulista Maria Helena não merece respeito político. Mas invadir sua casa e ordenar sua prisão porque foram encontradas armas por lá -que nada tinham a ver com o objeto da investigação- é mais um lance dessa inacreditável escalada de arbítrio que toma conta do país, ao se conferir poder absoluto a pessoas sem discernimento para fazer justiça. Agora, não apenas procuradores, mas policiais se dão ao direito de definir o que é bem ou mal e sair prendendo a torto e a direito.
Nem o fato de a vereadora ser uma lídima representante do submundo político que domina a cidade é desculpa para tal arbitrariedade. O descuido na demonstração de força acaba se repetindo na colheita de provas. Nos últimos meses, cinco representações dos promotores paulistas contra a máfia das Regionais foram rejeitadas pelo Judiciário, por insuficiência de provas.
O Ministério Público, que tem papel relevante a desempenhar no país, precisa urgentemente rever seus métodos.


E-mail: lnassif@uol.com.br



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