São Paulo, domingo, 13 de outubro de 2002

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EM TRANSE

Operadores do mercado externo dizem que frases do financista visam derrubar papéis brasileiros e lucrar com derrocada

Soros lucra na quebra do Brasil, diz analista

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Investidores estrangeiros têm operado na praça financeira internacional com a expectativa de lucrar com a quebra do Brasil.
No mercado de idéias sobre o futuro do país, as sucessivas declarações do financista George Soros de que o Brasil caminha para a bancarrota começam a chamar a atenção. Há quem diga que Soros provavelmente tem "levado sua boca aonde seu dinheiro está" (tradução de expressão comum em Wall Street, "putting his mouth where his money is").
Ou seja, Soros integraria o time dos que lucrariam se o Brasil desse calote em sua dívida, ou a reestruturasse, como os especialistas de mercado preferem dizer.
"Infelizmente, eles [os investidores estrangeiros" começam a cheirar o sangue na água, como tubarão. Eles vêem que o Banco Central vai ter de fazer leilão [de títulos cambiais e operações com dólar no mercado futuro interno" e começam a empurrar o Brasil até que não consiga fazer a renegociação", disse Raphael Kassin, chefe para mercados emergentes da área de renda fixa do ABN-Amro Asset em Londres.
Para Kassin, as declarações de Soros não são isentas de interesse. "Acho que o Soros nunca deu uma declaração que fosse independente de sua posição [no mercado financeiro". Ninguém nunca o levou a sério. Quando ele faz um comentário, já se sabe que ele o faz de acordo com sua posição [no mercado". Agora, é comentário que machuca, que afeta", diz.
Dois operadores de mercado, um de Nova York e outro de São Paulo, também disseram à Folha que suspeitam do objetivo do financista quando ele faz esse tipo de análise sobre o Brasil. Ambos ressaltaram, no entanto, que não há como afirmar se seus fundos de investimento estão em posição contrária ao Brasil.

"Curto em Brasil"
Posicionar-se contra o país é o mesmo que ficar "short" (fazer venda a descoberto) nos títulos da dívida externa brasileira. É uma operação muito comum no mercado internacional de bônus soberanos, ou seja, de papéis de governos.
De forma resumida, a transação funciona da seguinte maneira: o investidor "aluga" os títulos da dívida externa de outro investidor, com o compromisso de devolvê-los em data pré-acertada. Em seguida, vende os títulos no mercado. Se o país quebrar, o preço dos títulos da dívida externa do governo despenca.
Assim, o investidor que alugou os papéis, e que espera a bancarrota, recompra os títulos no mercado por uma fração do que embolsou com a venda, e os devolve para quem os alugou, pagando ao dono dos papéis pequena taxa de juros. Essas operações contribuem para a queda dos papéis no mercado, pois fazem com que a oferta desses títulos aumente.
No caso do Brasil, tais transações são mais frequentes com os C-bonds, títulos da dívida externa mais negociados no mercado. Na sexta-feira, esses papéis fecharam cotados a US$ 0,50, isto é, a 50% de seu valor de face.
"Acho que o Soros obviamente está "falando do livro dele" [de seus interesses". Ele deve ter posição "curta" em Brasil", disse Kassin.
No final do mês passado, Soros disse, em entrevista à TV americana ABC, que, independentemente dos resultados da eleição para presidente, o Brasil deveria quebrar.
"Será eleito um presidente que não é apreciado pelos mercados. As taxas de juros [risco-país" vão chegar a 25%. A essa altura, o Brasil estará falido", afirmou. O presidente a que ele se referiu é Luiz Inácio Lula da Silva, candidato do PT.
No final do mês passado, no encontro anual do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial, Soros podia ser encontrado sem dificuldade nos seminários sobre o Brasil.
Em um deles, em que o presidente do Banco Central do Brasil, Armínio Fraga, era palestrante, Soros levantou-se para fazer perguntas a Armínio sobre a situação do país.
Armínio foi seu funcionário, como administrador de um de seus fundos especulativos. Armínio tem dito que a avaliação de Soros sobre o país é "equivocada", mas tem evitado o confronto direto com o ex-patrão. Em entrevista à Folha, em Washington, questionado sobre se os dois haviam conversado nos últimos dias, Soros respondeu: "Não quero entrar nesse assunto".



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