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São Paulo, quinta-feira, 13 de novembro de 2003

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LUÍS NASSIF

O passeio das liminares

O caso da distribuidora Total poderá ser paradigmático para o início do desmonte de um dos principais pilares do crime organizado brasileiro: a indústria das liminares na área de combustíveis.
A motivação jurídica era justa. A Receita criou o contribuinte substituto na área de combustíveis. Ou seja, o imposto passou a ser recolhido antecipadamente na refinaria, comendo capital de giro da cadeia de produção -o empresário pagava o tributo antes da venda.
Algumas empresas conseguiram liminares para não pagar antecipadamente os tributos. No seu rastro surgiu uma verdadeira indústria do crime organizado. Primeiro, constituíam-se empresas de fachada, em geral com uma sede em escritórios minúsculos, em comarcas de juízes dispostos a conceder as liminares. Conseguida, a empresa começava a operar, adquiria quantidades inacreditáveis de combustíveis sem pagar o tributo antes. Depois, desapareciam na poeira sem pagar o tributo.
Havia pelo menos três anos esse golpe era de conhecimento público. O que significa que deve haver no mínimo uma correição naquelas varas que se tornaram pródigas na concessão dessas liminares, sem exigir das empresas beneficiadas a apresentação de garantias para o pagamento do imposto devido.
Semanas atrás foram presos em Recife os sócios da Total, que se especializara nesse tipo de golpe. Estima-se que a dívida acumulada com o fisco pernambucano chegue a R$ 12 milhões, em cima de dados falsos fornecidos em 1998 e 1999.
No ano passado, a empresa se especializou nas liminares contra o pagamento da Cide, aplicando um golpe conhecido como "passeio das liminares".
No dia 26 de abril de 2001, por exemplo, a Repropel entrou com pedido de liminar na Bahia, que saiu no dia 30 de abril. No dia 3 de maio a Total entrou na ação como litisconsorte. No dia 4 de junho a liminar foi suspensa. No dia 20 de junho houve sentença favorável a ambas as empresas. No dia 10 de julho a sentença foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região. No dia 6 de agosto houve agravo regimental da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. Interrompe-se aí esse primeiro ciclo.
No dia 9 de outubro, a Star e a Total entram com ajuizamento em Teresópolis. A liminar é indeferida. Ambas entram com agravo de instrumento no TRF da 2ª Região e obtêm a liminar em 10 de dezembro.
Em 5 de novembro começam nova ofensiva em Pernambuco, repetindo o ciclo. E por aí afora. Agora, os três sócios da distribuidora estão presos. O pedido de habeas corpus foi negado. Há também pedido de prisão preventiva na 9ª Vara Criminal de São Luís, Maranhão. Com o fisco maranhense, calcula-se que a dívida chegue a R$ 23 milhões.
É importante, neste momento em que o Judiciário está acuado, que ele próprio tome a iniciativa de abrir investigações sobre o que vem ocorrendo nessa área, levantando tanto em nível federal (com a Cide, o PIS e a Cofins) quanto estadual (com o ICMS).
Principalmente é importante que o mau uso feito das liminares não desmoralize a sua utilização legítima contra essa posição da Receita, que, com o contribuinte substituto, acabou avançando indevidamente sobre o capital de giro de muitos setores.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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