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PIB não garante vitória, diz analista
DA REPORTAGEM LOCAL
O cientista político Murillo de
Aragão afirma que o crescimento
econômico influencia o humor da
nação e favorece o governo em
um ano eleitoral. Mas os bons resultados da economia não são suficientes para garantir a reeleição
do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva. "Também contam a confiança que o candidato transmite
em proteger essas conquistas econômicas, a eficiência administrativa -e esse é um ponto fraco do
governo-, a moralidade e o alcance das políticas sociais."
Na sua opinião, o brasileiro tende a ser complacente e até cúmplice com escândalos políticos. "Hoje, há um pouco de complacência
e um pouco de efeito do bom andamento da economia funcionando como antídoto à crise",
afirma. Aragão comanda a consultoria Arko Advice, que desde
1990 especializou-se em análise
política. Dos seus 60 clientes, 45
são grandes bancos locais e internacionais que operam no país e
fundos de investimento. Leia a seguir trechos de entrevista à Folha:
(SANDRA BALBI)
Folha - Segundo economistas, o
PIB deve crescer entre 4% e 5% no
terceiro trimestre de 2006, véspera
das eleições. Isso pode definir o voto a favor do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva?
Murillo de Aragão - A economia
gera uma sensação de fortaleza
muito grande e influencia na escolha do eleitorado. Mas isso não
quer dizer que o presidente Lula
vá ser reeleito. Ele tanto pode ser
como pode não ser reeleito. O
quadro econômico atual favorece
uma escolha mais tranqüila. E Lula se beneficia disso.
Folha - Há uma correlação entre
crescimento e reeleição?
Aragão - O bom ambiente econômico gera sensação de progresso, de que as coisas vão melhorar.
E isso influencia o humor da nação. Em alguns setores sociais ou
regiões onde há mais desemprego, isso é diluído, mas, se em geral
o país funciona bem, a sensação
do eleitorado é boa.
Fernando Henrique Cardoso é
um exemplo de político que aproveitou muito bem o desempenho
da economia.
Com o sucesso do Plano Real,
ele teve forças para privatizar o setor de telecomunicações às portas
das eleições, apesar das denúncias
de favorecimento de um consórcio que derrubaram o ministro
Luiz Carlos Mendonça de Barros.
E se reelegeu.
Folha - Quem vai se dar bem no
ano que vem com a economia em
crescimento: a classe média, os pobres ou os ricos?
Aragão - Quem se dará bem é o
governo. A aposta de muitos analistas é que o presidente Lula ganharia a eleição por conta da economia. Mas não é só isso que conta. Também contam a confiança
que o candidato transmite em
proteger essas conquistas econômicas, a eficiência administrativa
-e esse é um ponto fraco do governo-, a moralidade e o alcance
das políticas sociais.
Folha - A crise política pode ter
impacto na eleição ou estará absorvida e esquecida até lá?
Aragão - Ela pode até se acirrar,
se o [ministro Antonio] Palocci
sair, pois ficará certo desconforto
até que a substituição seja decidida e ocorra de uma forma que
transmita confiança ao mercado.
Uma eventual substituição malfeita pode antecipar um quadro
de incerteza e prejudicar o processo eleitoral.
Folha - A ética na política pesa
mais na hora de votar do que barriga cheia, emprego e consumo?
Aragão - Para a maioria da população, é difícil entender escândalo em fundo de pensão ou no
processo de privatização. Mas um
escândalo que pegue em cheio,
como o caso Collor, todos entendem. O brasileiro, entretanto, tende a ser complacente com escândalos e até cúmplice. Ele sabe que
o Estado é mais forte que a sociedade e isso gera uma relação subalterna e uma complacência
com relação a essas coisas. Hoje,
há um pouco de complacência e
um pouco de efeito do bom andamento da economia funcionando
como antídoto à crise. As pessoas
pensam: a economia vai indo
bem, isso [mensalão, caixa dois] é
coisa de político. Além disso, o
presidente Lula tem uma credibilidade acumulada. A opinião pública descarregou a culpa no Congresso e em seus tradicionais vilões e no PT -o novo vilão. Além
disso, Lula tem muito prestígio,
faz as pessoas pensarem duas vezes diante das denúncias. Por isso
ele abusa do discurso, desse tom
popular, isso ainda cola.
Folha - E do mercado financeiro,
ele ainda tem a complacência?
Aragão - No mercado financeiro, ele tem apoio pelo pragmatismo econômico, mas todos acham
que seu governo é fraco. E eu falo
com o mercado todo dia. O consenso no mercado é que o bom
desempenho da economia garante ainda viabilidade política e eleitoral ao governo Lula.
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