São Paulo, domingo, 13 de novembro de 2005

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PIB não garante vitória, diz analista

DA REPORTAGEM LOCAL

O cientista político Murillo de Aragão afirma que o crescimento econômico influencia o humor da nação e favorece o governo em um ano eleitoral. Mas os bons resultados da economia não são suficientes para garantir a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Também contam a confiança que o candidato transmite em proteger essas conquistas econômicas, a eficiência administrativa -e esse é um ponto fraco do governo-, a moralidade e o alcance das políticas sociais."
Na sua opinião, o brasileiro tende a ser complacente e até cúmplice com escândalos políticos. "Hoje, há um pouco de complacência e um pouco de efeito do bom andamento da economia funcionando como antídoto à crise", afirma. Aragão comanda a consultoria Arko Advice, que desde 1990 especializou-se em análise política. Dos seus 60 clientes, 45 são grandes bancos locais e internacionais que operam no país e fundos de investimento. Leia a seguir trechos de entrevista à Folha:
(SANDRA BALBI)

Folha - Segundo economistas, o PIB deve crescer entre 4% e 5% no terceiro trimestre de 2006, véspera das eleições. Isso pode definir o voto a favor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva?
Murillo de Aragão -
A economia gera uma sensação de fortaleza muito grande e influencia na escolha do eleitorado. Mas isso não quer dizer que o presidente Lula vá ser reeleito. Ele tanto pode ser como pode não ser reeleito. O quadro econômico atual favorece uma escolha mais tranqüila. E Lula se beneficia disso.

Folha - Há uma correlação entre crescimento e reeleição?
Aragão -
O bom ambiente econômico gera sensação de progresso, de que as coisas vão melhorar. E isso influencia o humor da nação. Em alguns setores sociais ou regiões onde há mais desemprego, isso é diluído, mas, se em geral o país funciona bem, a sensação do eleitorado é boa.
Fernando Henrique Cardoso é um exemplo de político que aproveitou muito bem o desempenho da economia.
Com o sucesso do Plano Real, ele teve forças para privatizar o setor de telecomunicações às portas das eleições, apesar das denúncias de favorecimento de um consórcio que derrubaram o ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros. E se reelegeu.

Folha - Quem vai se dar bem no ano que vem com a economia em crescimento: a classe média, os pobres ou os ricos?
Aragão -
Quem se dará bem é o governo. A aposta de muitos analistas é que o presidente Lula ganharia a eleição por conta da economia. Mas não é só isso que conta. Também contam a confiança que o candidato transmite em proteger essas conquistas econômicas, a eficiência administrativa -e esse é um ponto fraco do governo-, a moralidade e o alcance das políticas sociais.

Folha - A crise política pode ter impacto na eleição ou estará absorvida e esquecida até lá?
Aragão -
Ela pode até se acirrar, se o [ministro Antonio] Palocci sair, pois ficará certo desconforto até que a substituição seja decidida e ocorra de uma forma que transmita confiança ao mercado. Uma eventual substituição malfeita pode antecipar um quadro de incerteza e prejudicar o processo eleitoral.

Folha - A ética na política pesa mais na hora de votar do que barriga cheia, emprego e consumo?
Aragão -
Para a maioria da população, é difícil entender escândalo em fundo de pensão ou no processo de privatização. Mas um escândalo que pegue em cheio, como o caso Collor, todos entendem. O brasileiro, entretanto, tende a ser complacente com escândalos e até cúmplice. Ele sabe que o Estado é mais forte que a sociedade e isso gera uma relação subalterna e uma complacência com relação a essas coisas. Hoje, há um pouco de complacência e um pouco de efeito do bom andamento da economia funcionando como antídoto à crise. As pessoas pensam: a economia vai indo bem, isso [mensalão, caixa dois] é coisa de político. Além disso, o presidente Lula tem uma credibilidade acumulada. A opinião pública descarregou a culpa no Congresso e em seus tradicionais vilões e no PT -o novo vilão. Além disso, Lula tem muito prestígio, faz as pessoas pensarem duas vezes diante das denúncias. Por isso ele abusa do discurso, desse tom popular, isso ainda cola.

Folha - E do mercado financeiro, ele ainda tem a complacência?
Aragão -
No mercado financeiro, ele tem apoio pelo pragmatismo econômico, mas todos acham que seu governo é fraco. E eu falo com o mercado todo dia. O consenso no mercado é que o bom desempenho da economia garante ainda viabilidade política e eleitoral ao governo Lula.


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