São Paulo, segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

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Fiesp teme mudança tributária em SP

Para Skaf, presidente da federação, cobrança de ICMS no início da cadeia pode resultar em concorrência desleal com SP

Ele diz ainda que viu com alívio a suspensão de debate de nova política industrial do governo federal porque o setor não foi consultado

FÁTIMA FERNANDES
JULIO WIZIACK

DA REPORTAGEM LOCAL

A mudança na forma de tributação de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias) que a Secretaria da Fazenda paulista prepara para alguns setores, na qual o imposto é recolhido na primeira etapa de fabricação do produto -isto é, pela indústria-, deve ser feita sem pressa, com prudência e muita responsabilidade, na opinião de Paulo Skaf, presidente da Fiesp e do Ciesp.
A partir de fevereiro, a Fazenda paulista decidiu alterar a forma de tributação de ICMS de quatro setores (bebidas alcoólicas, medicamentos, perfumaria e higiene pessoal). A cobrança do imposto será feita pelo sistema de substituição tributária, na qual o ICMS é cobrado no início da cadeia produtiva. A partir de março, outros nove setores passarão a ser tributados dessa forma (alimentos, ração animal, limpeza, fonográfico, material de construção, autopeças, pilhas e baterias, lâmpadas e papel).
"Não somos contra o sistema de substituição tributária. Mas é preciso estudar bem o valor que será tributado o produto e ter a certeza de que a indústria não vai sofrer concorrência desleal, já que a forma de tributação de ICMS será diferenciada da de outros Estados", diz Skaf.
O aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) e da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido) não altera a previsão da indústria para este ano, segundo Skaf. Para ele, a indústria de transformação tem condições de crescer entre 5,3% e 5,5% em 2008.
O governo, porém, na sua avaliação, precisa colaborar. "Precisa gastar menos e bem, implementar as reformas estruturais, fazer fluir os investimentos, reduzir mais os juros e tornar a taxa de câmbio mais favorável às exportações. Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Paulo Skaf.  

FOLHA - Quais são as perspectivas para a indústria neste ano, considerando as medidas do governo para compensar o fim da CPMF?
PAULO SKAF
- O ano de 2007 começou com a indústria extrativa indo muito bem e a de transformação rateando. No final do ano passado, a indústria de transformação se recuperou. Esperamos para 2007 um crescimento do PIB entre 5,2% e 5,3% e, para a indústria de transformação, de 5,5%. Para este ano, não haveria razões, até o momento, para acreditar que possa ser diferente. Ou seja, o país deve crescer uns 5% e a indústria poderá crescer em torno de 5,3% a 5,5%, em média. Alguns setores podem crescer mais, como o automobilístico, e outros, menos. E a indústria paulista estaria em linha com a indústria brasileira.

FOLHA - Os empresários sempre reclamam que é difícil crescer no país por conta das elevadas taxas de juros, dos altos impostos e da taxa de câmbio desfavorável às exportações. Mesmo assim, a indústria foi muito bem em 2007, o sr. não acha?
SKAF
- Não é que os empresários reclamam. O fato é que o Brasil teve crescimento medíocre por 20 anos. E, para o país, é importante acelerar esse crescimento. E, se ele não ocorria, não era culpa dos empresários, das indústrias. Finalmente, quando todo mundo valoriza a necessidade de ter crescimento, o governo anuncia algumas surpresas, com medidas para compensar o fim da CPMF.

FOLHA - O sr., que liderou campanha contra a CPMF, já esperava aumento de tributos para compensá-la, como o que ocorreu com o IOF e a CSLL?
SKAF
- Não. Conseguimos mostrar que não haveria necessidade de aumentar impostos com o fim da CPMF. A Constituição Federal já previa o fim da CPMF em 31 de dezembro de 2007. O governo, com certo atrevimento, colocou por conta dele no Orçamento de 2008, que enviou ao Congresso, a previsão de R$ 39 bilhões de CPMF. Só que isso já estava errado, já que não poderia prever algo que a Constituição já dizia que não iria existir. Diria que não havia a menor necessidade de criar imposto ou aumentar alíquota de IOF. Não precisaria de R$ 10 bilhões de aumento de impostos. Se o governo já reconhece que pode absorver R$ 30 bilhões, poderia então absorver também R$ 40 bilhões. Já era previsto para 2008 um aumento de arrecadação de R$ 80 bilhões. Com o fim da CPMF, que tirou R$ 40 bilhões de arrecadação, ainda teria R$ 40 bilhões a mais de arrecadação.

FOLHA - O sr. acha que essas medidas e outras que poderão vir podem reduzir o consumo e o crescimento da indústria neste ano?
SKAF
- É um pouco cedo para falar sobre isso. De qualquer forma, é lógico que quando você onera o crédito, você inibe a compra a prazo. Ouvi dizer que as medidas foram tomadas para reduzir o consumo. Não acredito nisso. O objetivo foi arrecadar mais R$ 10 bilhões.

FOLHA - A Fazenda paulista quer mudar o sistema de tributação de alguns setores, como o de bebidas e o de medicamentos, para evitar a sonegação fiscal. O que a indústria paulista acha disso?
SKAF
- Não somos contra a substituição tributária [tributação de ICMS no início da cadeia produtiva], mas existem duas preocupações. A primeira é que o índice de valor agregado tem de ser calibrado. Por exemplo, se um setor tem um valor agregado de X e o Estado considera que é 3X, pode inviabilizar esse setor. A outra preocupação é que, como a mudança de tributação será feita só em São Paulo, se não houver forte fiscalização, as indústrias paulistas podem ter de enfrentar concorrência desleal de indústrias de fora do Estado que não recolheram todo o imposto da cadeia de uma vez. Qual a ferramenta eficiente que o governo vai oferecer para não expor a indústria paulista a uma competição desleal, uma vez que a tributação em São Paulo será diferente da de outros Estados?

FOLHA - As indústrias dos setores [bebidas, medicamentos, perfumaria e higiene pessoal] que terão mudança na tributação em fevereiro já estão preparadas para recolhimento do imposto da cadeia?
SKAF
- Já havia discussão com esses quatro setores há alguns meses. Agora, recomendo que, no caso de outros setores, o governo não deva ter pressa para implantar a nova forma de tributação. Já combinamos com o governo que vamos ter um fórum permanente de discussão na Fiesp sobre isso. O sistema pode ser implantado, mas com prudência e responsabilidade.
Não existe necessidade de ser estabelecido com tanta pressa.

FOLHA - Com o fim da CPMF, o governo adiou planos para a nova política industrial prevista para este ano. O que acha disso?
SKAF
- Ainda bem que foi adiada. Deixa eu explicar. O que quero dizer é que política industrial não deve ser feita a portas fechadas por um governo, deve ser feita com a indústria. E não houve discussão com a indústria para elaborar uma política industrial, que tem de ter o envolvimento das áreas tecnológica e de educação. Você não tem desenvolvimento industrial se não tiver formação profissional. Uma política industrial tem de ser para o país, não para a Fiesp.

FOLHA - Quais são os desafios para o setor industrial neste ano?
SKAF
- O país precisa fazer as reformas estruturais, as reformas tributária e trabalhista, e fazer os investimentos em infra-estrutura fluírem. Olha o grande problema que temos nos aeroportos. O Brasil precisa se modernizar, se desburocratizar. O governo precisa cuidar dos seus gastos, fazer o máximo com o mínimo possível.
Chegamos à conclusão, depois de elaborar várias propostas, que o governo precisa primeiro cortar a receita, que vai obrigar ao corte de gastos. Agora isso tem de ser feito com responsabilidade. Os juros no país também estão entre os mais altos do mundo e podem cair ainda mais. O fim da CPMF já possibilitaria uma redução dos juros para manter a taxa efetiva. Se o governo mantiver a taxa na próxima reunião do Copom, significa que aumentou a taxa.

FOLHA - O sr. tem aspiração política?
SKAF
- O dia em que sair da Fiesp pode ser que eu vá para o meio empresarial, não sei, mas não penso nisso hoje. Agora, o futuro não sabemos, vamos deixar para o destino.


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