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PAULO RABELLO DE CASTRO
Estacas e estacamento (Piripaque 2)
Gerenciar obras de vulto é aventura fantástica, mas não resolve o enigma do
estancamento nacional
COMO SÃO sempre longos os
vôos de deslocamento para
promover e fiscalizar as muitas estacas do PAC, recomendaria ao
presidente Lula levar o texto "Simplificando o Brasil" como leitura de
bordo. O pequeno livro, recém-publicado sob os auspícios da Fecomercio SP, que pretende logo encaminhá-lo ao nosso presidente, contém a narrativa dos melhores momentos de extensa pesquisa sobre
nossas principais mazelas econômicas e como tentar se livrar delas. Por
isso é uma receita segura para crescer com sustentabilidade.
Os profissionais encarregados das
várias fases da pesquisa estão entre
os mais destacados do país, nomes
do quilate de Maria Helena Zockun,
Helio Zylberstajn, Juarez Rizzieri e
Simão Silber, do time de grandes
professores da Fipe-SP, e outros, como Fabio Silveira, da RC Consultores, e Carlos Thadeu de Freitas Gomes, do Ibmec e do CNC.
O "Simplificando o Brasil" é um
recado de alerta para os incautos do
neodesenvolvimentismo "made in
Brasília". É preciso ter muito cuidado com a conclusão, curta e torta, de
que a retomada do crescimento depende só de o setor público apertar o
botão e soltar a manivela dos investimentos públicos. Evidentemente
investimentos liderados pelo Estado em certos setores-chave, como
treinamento, pesquisa, saúde e desburocratização geral, ajudariam demais. Esses são, contudo, os que o
governo menos fez. Ai estão os números catastróficos da "educação"
para comprová-lo.
Segue na cabeça da inteligência
nacional a falsa noção de que o crescimento minguou porque o impulso
do gasto público passava a ser menor do que antes. Mas como? A
questão é inversa. Não tem tido e
não terá êxito a aplicação do remédio sugerido pelo economista inglês
J. M. Keynes para a situação vivida
pelas economias industriais na
Grande Depressão: fazer déficit público maior, liberar recursos do Estado para obras, resgatando o setor
privado do buraco da deflação de
preços. A cartilha keynesiana é inaplicável como remédio ao "rentismo
estatogênico", tão bem descrito outro dia (10/02) pelos professores da
USP Leda Paulani e Rodrigo Teixeira nesta coluna da Folha.
A insistência em crer que o Brasil
precisa de um "plano de obras" é
fruto da inocência mal informada.
Óbvio que o país carece de muitas
obras. Mas a articulação entre os
setores público e privado é essencial. Como bem demonstrado na
pesquisa publicada no "Simplificando" (pág. 113), os investimentos
do setor privado seriam de 10% a
20% mais elevados se houvesse
mudança de expectativas entre os
empresários, grandes e pequenos,
de que as principais fontes de vazamento do gasto público seriam
consertadas com rapidez: Previdência, encargos da enorme dívida
pública, fundos sociais, desperdícios correntes.
Tudo isso é acompanhado pelos
agudos sensores dos que tomam
decisões na economia, seja grande
empresário ou dona-de-casa e, como a pesquisa revela, tem efeito de
neutralizar os esforços do governo
em tentar convencer a sociedade
de ter encontrado a fórmula do
equilíbrio fiscal ao gastar mais e
comprometer ainda mais a carga
tributária da sociedade no futuro.
Há quem duvide da sensibilidade
das pessoas diante das questões
econômicas. Então impõe-se aos
céticos um exercício fácil: qual tem
sido o efeito do extraordinário
crescimento mundial dos últimos
nove anos sobre a economia do
Brasil? Onde foi parar tanta demanda externa puxando a produção nacional para a frente? Os péssimos números do crescimento
brasileiro indicam que o Estado
cresceu, em gastos, o dobro da velocidade do abúlico setor privado.
Por quê? Óbvio que não foi falta de
estímulo externo a origem da desanimação nacional. Pelo contrário:
o próprio Estado, que tem ocupado
(embora mal) todo o espaço do
crescimento, previne qualquer
reação do setor inibido ao praticar
a política de juros que conhecemos
bem, cuja transmissão ao câmbio é
imediata, deprimindo a rentabilidade da produção doméstica, enquanto mantém, com os depósitos
compulsórios bancários mais altos
do mundo, uma pena de morte ao
crédito produtivo.
Gerenciar obras de vulto é aventura fantástica, um "barato" que dá
uma mídia excelente, mas não resolve o enigma do estancamento
nacional, essa forma rara de esclerose precoce da sociedade brasileira pós-inflacionária.
PAULO RABELLO DE CASTRO, 58, doutor em economia
pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do
Instituto Atlântico e chairman da SR Rating, classificadora
de riscos. Preside também a RC Consultores, consultoria
econômica, e o Conselho de Planejamento Estratégico da
Fecomercio SP. Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias,
nesta coluna.
rabellodecastro@uol.com.br
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