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OPINIÃO ECONÔMICA
Por que a pressão contra o IGP?
ANTONIO CARLOS PÔRTO GONÇALVES
O igp , Índice Geral de Preços
da Fundação Getúlio Vargas, tem sido alvo de muitas críticas. Muitos o têm acusado de ser
um índice antigo e desatualizado,
não refletindo, assim, a real inflação da economia. Além disso, dizem que, por sua composição, estaria superestimando a variação
dos preços. O que se pretende
aqui é desmistificar algumas lendas criadas em torno do IGP e
avaliar a sua real utilidade.
O IGP não é um índice que capta meramente o movimento dos
preços ao consumidor ou dos por
atacado. Como o próprio nome
diz, é um índice geral, criado para
funcionar como um deflator
mensal do nível de preços praticados na economia como um todo.
Dessa forma, o índice leva em
conta tanto os preços praticados
no atacado quanto os praticados
no varejo, além dos custos da
construção civil. É importante
ressaltar que, diferentemente do
que alguns apontam, quando são
considerados simultaneamente
os preços por atacado e ao consumidor, não há dupla contagem,
pois as ponderações utilizadas são
baseadas em valor adicionado,
como é feito no cálculo do deflator do Produto Interno Bruto.
Por sua composição, o IGP não
reflete os custos diretamente ligados à operação de um setor específico da economia -e é aqui que
reside grande parte das críticas dirigidas ao índice. Se o IGP não é
um índice setorial, como pode,
então, ser usado como indexador
de contratos de empresas de telefonia, eletricidade ou qualquer
outro serviço público?
Primeiramente, é preciso lembrar que as empresas não têm
apenas custos operacionais. Elas
têm também significativos custos
financeiros, que muitas vezes flutuam na mesma direção da taxa
de câmbio. E o IGP, como todos
sabem e alguns criticam, é composto 60% pelo IPA (Índice de
Preços por Atacado), o qual, por
sua vez, é influenciado pela taxa
de câmbio.
Nesse sentido, o IGP é inegavelmente um índice apropriado para
corrigir os custos de qualquer empresa que tenha dívida ou capital
externo. E empresas com esse
perfil de endividamento não são
raras. Ao contrário, têm importante participação no produto total da economia, até porque o governo incentiva a captação de recursos no exterior. Isso sem falar
nos inúmeros insumos utilizados
na produção de qualquer empresa, seja ela pertencente ao setor industrial, de comércio, de serviços
ou agropecuário, cujos preços são
cotados pelo dólar.
Vale lembrar que os preços por
atacado não são instantaneamente contaminados pelo câmbio, o
que ocorre, em média, em cerca
de dois meses. Da mesma forma,
os preços ao consumidor não são
imediatamente afetados pelos do
atacado, pois ocorre uma espécie
de bolha ou represamento de preços, caso a demanda na economia
esteja fraca. Mas cedo ou tarde,
em menor ou em maior grau, a
bolha acaba estourando, afetando
os preços ao consumidor.
Assim, no longo prazo observa-se que as variações do IGP e do
IPC são bastante semelhantes. A
diferença entre as taxas de variação do IGP-DI e do IPC-RJ, desde
1944 até hoje, foi, em média, de
0,014 ponto percentual. Enfatizando: a taxa de variação do IPC
foi, em média, 0,014 ponto percentual superior à do IGP!
Outra crítica bastante comum
ao IGP é que ele estaria caduco,
por sua "idade". No entanto,
quem assim pensa ignora que há
uma grande diferença entre ser
antigo e ser ultrapassado. De fato,
o IGP é um índice antigo -aliás,
um dos mais antigos do país. É
calculado mensalmente e ininterruptamente desde 1944 -o que, a
meu ver, só lhe confere qualidades. Além disso, sua composição é
revista constantemente. Ou seja,
trata-se de uma série de índice de
preços consistente, confiável e
atualizada, feita mês a mês há
quase 60 anos. E essa, sozinha, já
seria uma excelente razão para
dar continuidade a informações
econômicas tão valiosas.
A confiabilidade do IGP não se
restringe apenas à sua composição e tradição. A idoneidade do
índice já foi mais que comprovada em outras ocasiões em que o
IGP também foi atacado. E, sem
querer tirar o mérito dos outros
índices de preços brasileiros, aos
olhos dos investidores um indicador calculado por uma instituição
privada transmite mais imparcialidade.
É preciso sempre analisar com
muito cuidado as críticas dirigidas ao IGP e o momento em que
são feitas. Os contratos jurídicos
que envolvem a correção de algum valor monetário prevêem
que, no caso de extinção do índice
indexador, ele será automaticamente substituído por outro. E,
por ser um índice que tende a
atingir taxas mais altas quando há
desvalorização cambial, não são
poucas as pressões para a sua extinção nesses momentos. As campanhas "anti-IGP" chegam a apelar até para aspectos sociais, como
se a extinção do índice fosse também eliminar a pobreza ou as desigualdades do país.
Obviamente, o fato de o IGP ser
um índice com as já mencionadas
qualidades de tradição, consistência e confiabilidade não o isenta
de sofrer revisões técnicas constantes, tornando-o sempre o mais
apropriado possível. À medida
que alguns mercados ganham e
outros perdem importância, determinados itens devem passar a
fazer e outros a deixar de fazer
parte do índice. Em alguns casos,
pode ser necessário fazer uma nova ponderação dos itens que o
compõem. Esse é um trabalho
contínuo e, ao final do primeiro
semestre deste ano, estará concluída mais uma revisão de todo o
processo metodológico de cálculo
do IGP, de maneira a aperfeiçoá-lo ainda mais.
Enfim, se o IGP fosse arbitrariamente alterado ou extinto, o país
estaria perdendo, pois isso seria o
mesmo que rasgar contratos, o
que acarretaria grave queda no nível de confiança e de investimentos na economia, com implicações negativas para o nosso desenvolvimento econômico e social. E a Fundação Getúlio Vargas,
cuja missão é estimular o desenvolvimento nacional, sabe muito
bem de suas responsabilidades.
Antonio Carlos Pôrto Gonçalves, 56,
doutor em economia pela Universidade
de Chicago (EUA), é diretor do Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
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