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LUÍS NASSIF
Quem não gosta de Serra
A campanha contra o presidenciável José Serra já extrapolou o mero processo rotativo de "abate o candidato" que
tem caracterizado a cobertura
jornalística.
As acusações contra sua honra
não pegam, apesar de um ou
outro episódio polêmico. Há
pessoas que ambicionam a riqueza, outras que ambicionam
o poder. O sonho de Serra sempre foi a Presidência. E os cuidados que tomou ao longo de toda
a sua vida política passaram
não apenas em se preparar tecnicamente para o cargo como
fugir de tudo o que pudesse significar "rolo".
Além disso, há unanimidade
sobre sua competência como
presidenciável. Há muitos anos
Serra tornou-se o brasileiro
mais preparado para tratar dos
problemas nacionais em toda a
sua extensão. Sua vida pública
sempre se caracterizou pela formação de equipes competentes e
por se dedicar a temas institucionais complexos e fundamentais, como a questão tributária e
fiscal, o desenvolvimento, a saúde. Politicamente, sempre manteve a coerência.
No entanto tem a óbvia capacidade de aglutinar setores dos
mais variados contra a sua candidatura. Tanta resistência não
se cria gratuitamente.
Há dois problemas fundamentais na formação de Serra,
nenhum ligado às suas qualidades públicas, mas que são empecilhos ao bom exercício do poder: é intransigente na defesa de
seus princípios e não perdoa
uma crítica contra ele.
A intransigência é moeda com
duas faces. A face virtuosa é o
fato de não fazer concessões políticas que atropelem suas convicções técnicas. Esse lado de
Serra lhe trouxe respeito dos formadores de opinião e a inimizade mortal de todos os coronéis
políticos remanescentes do PFL,
embora, num pragmatismo duvidoso, tenha se aliado a Jader
Barbalho para derrotar ACM. O
foco central da resistência dos
coronéis não é o mero desejo de
vingança, embora gostassem de
comer o fígado de Serra, mas o
sentimento de que, com ele, não
haveria as concessões do governo FHC.
Um segundo foco de resistência vem dos beneficiários da
atual política econômica, mas
que, em todo caso, o aceitariam
como mal menor. Como escreveu recentemente Delfim Netto
em sua coluna no jornal "Valor", de todos os candidatos Serra é o que tem mais condições de
corrigir os erros do atual modelo
econômico. O que esses setores
temem nos demais candidatos
não é o radicalismo, mas a dificuldade em lidar com a economia sem desarrumar o país.
Mas há a outra face da intransigência. Serra considera que o
fato de ter competência técnica
e as melhores idéias é suficiente
para legitimar sua ação. Política é mais do que isso: é a capacidade de tratar com todos os setores, de compreender os limites
que a política impõe, de fazer
concessões, mesmo sem exagerar como FHC.
Além disso, há um traço de
comportamento de Serra responsável pela criação de uma
legião de inimigos na mídia. É o
fato de encarar cada crítica como uma guerra, demonstrando
suscetibilidade extremada. Fala
mal do jornalista que o criticou,
assim como do adversário político e do companheiro de partido. Frequentemente atropela o
jornalista e vai se queixar diretamente à chefia. Suas guerras
sempre se deram no campo verbal, mas como se comportaria
Serra se revestido da caneta da
Presidência? E está no cerne de
toda imprensa livre, daqui ou
dos EUA, a resistência a toda
forma de poder imperial. É a
maior virtude da mídia.
É esse o pano de fundo de todo
esse tiroteio contra Serra. Como
esse tipo de percepção sobre Serra não ficaria muito claro para
o leitor, e poderia ser interpretado como guerra de poderes, fica
mais fácil atacar o candidato de
outras maneiras.
De qualquer forma, é o ponto
central que precisará ser removido, não apenas para viabilizar
a candidatura Serra, como o
exercício da Presidência, em caso de vitória. Serra terá que
comprovar enfaticamente seu
compromisso em aprender a arte da negociação, da mesma
maneira como aprendeu os demais temas nos quais se tornou
especialista.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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