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OPINIÃO ECONÔMICA
Entre o sonho e a realidade
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Gostaria de dividir com
meu leitor algumas reflexões que fiz a partir de uma longa conversa com um jovem economista de um dos grandes bancos brasileiros. Penso ser relevante reportar essa conversa, pois ela
permite entender um dos grandes
perigos que o Brasil corre nos
dias de hoje: o comando da política econômica nas mãos de uma
corrente de pensamento que tem
uma leitura errada dos desafios
que temos de enfrentar para chegar ao eldorado do crescimento
econômico.
Ao longo de minha vida profissional, no setor privado e no governo, convivi com várias gerações de economistas bem formados e na faixa dos 35 anos, como
o meu interlocutor de agora. O
padrão de comportamento desse
grupo de profissionais apresenta
uma intrigante semelhança ao
longo do tempo: o uso intenso de
modelos matemáticos para
acompanhar nossa economia. O
jornalista Luís Nassif tem uma
expressão deliciosa para caracterizar esses economistas: cabeça
de planilha!
Para eles, a economia de um
país pode ser reduzida a um complexo modelo matemático, construído a partir de variáveis econômicas quantitativas observadas ao longo dos anos passados.
As técnicas para a construção
desses modelos têm evoluído de
forma impressionante nos últimos anos, ampliando a qualidade das estimativas dessas relações matemáticas entre passado e
futuro.
Mas nem mesmo os modelos
mais sofisticados conseguem reproduzir a dinâmica de uma economia que funciona à base de
ações humanas e que depende de
construções institucionais e políticas, que mudam de sociedade
para sociedade. No caso brasileiro, essa armadilha é ainda
maior, em razão das alterações
ocorridas nos últimos anos. Neste
início de século, evoluímos para
uma economia aberta, mas ainda submetida a regras herdadas
do modelo anterior, fechado e estatista.
Outra característica marcante
da realidade brasileira de hoje é o
desafio representado por uma dívida pública interna de proporções gigantescas quando comparada com os recursos financeiros
que existem no país. A absorção
pelo governo da poupança interna é desproporcionalmente elevada, e os prazos dos títulos colocados ao público, perigosamente
curtos.
Como fruto desse aleijão financeiro, temos uma taxa de juros
elevada demais para permitir o
funcionamento normal do circuito de crédito ao setor privado.
Outra limitação, que deriva dessa situação particular, é a necessidade de superávits fiscais, antes
do pagamento dos juros da dívida pública, de grande dimensão.
Isso é condição necessária para
que a solvência do governo evite
crises de confiança desestabilizadoras.
Com isso, cria-se um processo
perverso de concentração de renda e de diminuição continuada
da capacidade de consumo da sociedade. Além disso, a carga fiscal de equilíbrio é elevada demais para permitir o funcionamento eficiente da economia. Os
recursos canalizados para pagar
o serviço da dívida reduzem a capacidade de consumo de dezenas
de milhões de brasileiros e acabam nos bolsos de um número
muito pequeno de pessoas e empresas. Como os gastos de consumo representam mais de dois terços de nosso PIB, não fica difícil
entender o crescimento econômico medíocre dos últimos dez
anos.
Essa característica da economia brasileira não está incorporada nos modelos que servem de
orientação para os economistas
da escola de meu jovem interlocutor. Para eles, o equilíbrio macroeconômico, que temos hoje,
deve levar o país a uma situação
de crescimento acelerado a partir
de 2009/2010. Por isso essa contradição entre seu otimismo contagiante e o pessimismo da sociedade que vive no mundo real.
Não percebe o nosso jovem entusiasta, com a política econômica atual, que essa mesma promessa de progresso, sempre alguns anos à frente, vem sendo feita desde 1996. Os modelos de então não previram a crise de energia elétrica, por falta de investimento público no setor, nem as
crises financeiras de 1997 e 1998, e
sua quimera desenvolvimentista
não ocorreu. Da mesma forma
como seu modelo atual não prevê
as limitações que a falta de investimento em nossa infra-estrutura
econômica, inclusive o mesmo setor elétrico, terá sobre o crescimento de nossas exportações em
futuro próximo. Não estão também em seu modelo as dificuldades que vamos enfrentar em razão das turbulências no mundo
financeiro.
Por isso, segundo eles, a necessidade de sempre continuar tentando, pois um dia chegaremos
ao tão esperado crescimento econômico sustentado. Falta combinar com o povo...
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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