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Governo inventa o "caixa dois" do superávit primário
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O modelo brasileiro de fundo
soberano equivalerá a uma espécie de caixa dois do superávit
primário -os recursos serão
obtidos da forma idêntica, com
os mesmos efeitos sobre a dívida pública e a atividade econômica, mas não serão contabilizados como tal.
Como o superávit primário, o
dinheiro virá de uma parcela da
arrecadação tributária que não
será destinada a gastos com
pessoal, obras, custeio administrativo e programas sociais.
Como o superávit, a criação do
fundo vai significar abatimento
da dívida pública. E, como o superávit, o fundo vai tirar fôlego
do consumo, do investimento
e, assim, da inflação no país.
"Não entra no cálculo do superávit, mas todo mundo sabe
que é algo que não será gasto",
foi como o ministro Guido
Mantega tentou explicar a inovação nacional.
Em outros tempos, como no
primeiro ano do governo Lula,
um aperto fiscal adicional merecia um anúncio de impacto,
para impressionar os mercados
e restaurar a confiança dos investidores. Agora, vem embalado em discurso desenvolvimentista, para não parecer ameaça ao PAC (Programa de
Aceleração do Crescimento) e
outros projetos.
Pelas explicações de Mantega, os dólares para o fundo soberano serão comprados de
duas formas: na primeira, idêntica à do Banco Central na aquisição das reservas cambiais, a
operação é financiada pela venda de títulos federais.
Nesse caso, a operação, de
imediato, é neutra para as contas públicas: aumenta-se a dívida interna e reduz-se, no mesmo volume, a externa -afinal,
os dólares obtidos são descontados na contabilidade dos
compromissos em moeda estrangeira. Com o tempo, porém, a estratégia dá prejuízo
fiscal, porque os juros da dívida
interna são muito mais altos
que o rendimento dos dólares
aplicados no exterior.
Como é cara e já é feita pelo
BC, essa modalidade deverá ter
peso minoritário no fundo soberano, indicou Mantega.
A novidade é a compra de dólares com recursos do Orçamento, ou seja, da arrecadação
de impostos e contribuições sociais. Com esse formato, a operação, embora contabilizada
como despesa primária, é vantajosa aos resultados do Tesouro: o dinheiro se transformará
em patrimônio da União -seja
como dólares ou como ações ou
títulos de outros países- e reduzirá a dívida pública.
E o problema passa a ser político: a compra de dólares disputará verbas com programas sociais, demandas salariais do
funcionalismo, obras em infra-estrutura, escolas e hospitais.
Um fundo de US$ 10 bilhões,
por exemplo, teria impacto irrisório no dólar -é menos de 5%
do total das reservas. Mas o
efeito orçamentário seria devastador -é basicamente tudo
o que o PAC tem para gastar no
ano. Não é por acaso que Mantega preferiu não se comprometer com valores ontem.
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