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São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 2003

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COMÉRCIO

Alair Martins, maior atacadista da AL, diz que para vender mais é necessário elevar poder aquisitivo da população

Só crédito não resolve, diz rei do atacado

Valter de Paula/Folha Imagem
O empresário Alair Martins, que tem 200 mil clientes, no depósito de seu grupo, em Uberlândia


ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Nem Pão de Açúcar, nem Carrefour. É o grupo Martins a maior empresa de atacado e distribuição da América Latina, que negocia mercadorias com a indústria e ajuda a determinar os preços em grande parte das redes de pequeno porte no país.
As grandes cadeias até ampliaram a atuação e impõem políticas de preço, mas é o grupo Martins que, sem estardalhaço, manda em boa parte do mercado.
Atuando como intermediário, a empresa compra do fabricante e revende itens de higiene e limpeza e alimentos para uma entre quatro lojas pequenas (mercearias e supermercados) no país. São 123 mil toneladas de mercadorias, 200 mil clientes -os atacadistas no país atendem 800 mil- e 1.500 caminhões de entrega (a Casas Bahia tem mil), que percorrem, por ano, 125 milhões de quilômetros, ou 17 mil vezes o percurso do Oiapoque ao Chuí.
No comando está Alair Martins, 69, o dono do grupo, que registra faturamento de R$ 2 bilhões anuais, lucra R$ 28 milhões e mantém um banco próprio, com ativos de R$ 500 milhões e 10 mil clientes. Nesta semana, a companhia completa 50 anos.
"Nunca tive um prejuízo", diz Martins, em entrevista à Folha. O empresário mineiro segue uma rotina: trabalha 12 horas por dia -nos anos 50 e 60 a carga horária média era 16 horas-, acorda sempre por volta das 6h, faz aulas de musculação e esteira.
"Olha, poderia viver de juros do meu banco, sem reclamar. Mas não estou pensando nisso. Quero ganhar vendendo mesmo, mas isso só vai acontecer com aumento no poder aquisitivo. Crédito ajuda, mas não resolve", afirma.
 

Folha - O grupo Martins cresceu de forma acelerada em 2003 e a empresa é um parâmetro de vendas para o comércio. Isso quer dizer que o ano foi bom?
Alair Martins -
Atendemos todos os municípios brasileiros. Chegamos a todas as cidades e crescemos 22% em 2003, sem contar a inflação. A expansão real foi menor, mas ainda crescemos mais que a média do setor atacadista, que chegou a 3%, 4% no ano. Quer dizer que está tudo bem? Não. O ano foi um dos mais difíceis que o país enfrentou recentemente, com renda minguada e o país querendo crescer com crédito. Sinceramente, acho difícil saber exatamente quando a situação vai melhorar.

Folha - Mas há uma expectativa de elevação na renda em 2004.
Alair Martins -
Isso pode acontecer, mas muito do que falam é puro "chutômetro". Falam em números, previsões. O que sei é que o poder aquisitivo da população despencou. Não adianta nada o consumidor ter o desejo de consumir e, com base nisso, acreditar que ele vai comprar só porque tem crédito na praça. Sem renda não tem jeito, e não vamos nos empolgar porque não vai ser fácil. Não quero dizer que não gosto do governo, porque gosto. Mostrou pulso firme em várias situações, mas a situação não vai melhorar do dia para a noite.

Folha - Como está a negociação de preços com a indústria para 2004. Há uma expectativa de reajustes caso a demanda volte a crescer no próximo ano?
Martins -
As conversas caminham bem, não se fala em aumento que extrapole o aceitável. A indústria tem medo de reajuste, porque não quer quebrar a cara de novo e ter de recuar mais tarde. Tivemos uma onda de aumentos que não se sustenta. Quem sobe muito corre risco de perder mercado, e a indústria aprendeu isso na pele. Se adotar a tática errada, sabe que o consumidor vai pensar: "Não tente isso, porque vamos correr para outras marcas".

Folha - Por que vocês acreditam que vão crescer em 2004, se a própria empresa espera um ano difícil para o mercado?
Martins -
O que eu digo é que vai haver expansão do atacado, mas não do varejo, no próximo ano. Isso porque os supermercados de vizinhança, atendidos pelos atacadistas, ganharam espaço. Enquanto o atacado cresce, o desempenho dos hipermercados mostra queda nas vendas.

Folha - O senhor começou a trabalhar aos 19 anos e mantém a mesma rotina diária. O senhor não pensa em se afastar do negócio?
Martins -
Trabalhei muito, amo o que faço. Comecei com uma loja pequena em Uberlândia (MG), de 110 metros quadrados, com dinheiro emprestado do meu pai. Trabalhava das 6h30 às 22h. Tenho um banco e poderia viver de juros, mas não quero. Não quero ser banqueiro. Quero é dinheiro mais barato para o consumo e vou continuar nesse negócio, porque é a minha vida.


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