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São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 2003

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COMÉRCIO EXTERIOR

Órgão deve transferir para fevereiro retomada de conversas sobre rodada de liberalização mundial

OMC adia para 2004 negociação de Doha

CLÓVIS ROSSI
DO ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

A OMC (Organização Mundial do Comércio) jogará amanhã para fevereiro a tentativa de reiniciar as negociações da Agenda Doha de Desenvolvimento, a apenas dez meses de vencer o prazo (janeiro de 2005) para encerrar os entendimentos em torno da mais ambiciosa rodada de liberalização comercial já empreendida.
Amanhã é o dia fixado pela malograda Conferência Ministerial de Cancún (em setembro) para juntar os cacos resultantes do fracasso dessa reunião e "pôr a rodada de novo nos trilhos", como diz o tailandês Supachai Panitchpakdi, diretor-geral da OMC.
Mas não será possível, já avisou o embaixador uruguaio Carlos Pérez del Castillo, presidente do Conselho Geral, exatamente o organismo que supervisiona todos os grupos negociadores.
O que será possível é a convocação para fevereiro desses grupos, que hibernaram nos últimos meses, por absoluta impossibilidade de negociar o que quer que fosse, tal o tamanho do impasse. Talvez também seja possível aprovar um programa de trabalho para 2004.
O cronograma na cabeça da cúpula da OMC, conforme a Folha apurou, prevê não apenas o relançamento dos grupos negociadores, mas a adoção, como base das discussões, do "texto Derbez".
É o documento preparado pelo chanceler mexicano, Luis Ernesto Derbez, como esboço de declaração final de Cancún. Não chegou a ser discutido porque a reunião terminou abruptamente.
O texto foi criticado pelo G20, o grupo de países em desenvolvimento liderado por Brasil e Índia, por ser insuficiente em matéria de liberalização agrícola dos ricos.
Mas o G20 apresentou um conjunto de emendas, o que é reconhecimento tácito de que é "ponto de partida" para a negociação, conforme admite Clodoaldo Hugueney, negociador-chefe do Brasil para assuntos da OMC.
Explica-se a aceitação, a contragosto, do "texto Derbez" pelo Brasil. A análise feita por representantes da agricultura, ainda em Cancún, mostrou vantagens, tímidas é verdade, ao Brasil.
Exemplo: o texto propõe reduzir o apoio total aos agricultores por produtos, e não pelo valor agregado. É vantajoso para Brasil e Argentina porque 51% do subsídios europeus estão concentrados em três produtos (carne, açúcar e lácteos), ao passo que 80% dos subsídios dos EUA vão para cinco produtos, entre eles a soja.
Se a redução fosse no agregado, poderia concentrar-se em produtos não interessantes a Brasil e Argentina, o contrário do "Derbez".
Segunda vantagem: o texto veta o mecanismo que o jargão batiza de "escalada tarifária". Significa que a tarifa de importação é baixa para a matéria-prima, mas elevada para produtos processados. É o caso, entre outros, da soja, que entra sem pagar imposto -o óleo de soja paga tarifa média de 9%.
Não são, de todo modo, vantagens suficientes para satisfazer os brasileiros. O chanceler Celso Amorim insiste que o Brasil não pode aceitar concessões mínimas porque "ficaria esperando uma abertura verdadeira do mercado agrícola por mais 20 ou 30 anos".
É alusão ao fato de que o comércio agrícola ficou fora das regras globais até a Rodada Uruguai (1986/94) e, assim mesmo, nela foi incluído sem que cedesse o muro protecionista dos países ricos.
Mas o diretor-geral da OMC diz, com razão, que "todas as partes sabem que terão que ceder em algo", sob pena de manter-se o impasse atual, ruim para todas elas.
Ele saiu satisfeito das reuniões da semana que passou em Brasília, mas fez questão de dizer tanto aos representantes do G20 como a Pascal Lamy, o comissário europeu para o Comércio: "Digam a seu pessoal em Genebra o mesmo que vocês estão dizendo aqui".
Tradução: ele acha que a relativa flexibilidade demonstrada por G20 e União Européia difere da rigidez de posições que ele encontra em Genebra, o QG da OMC.
Se houver de fato essa flexibilidade, pode ser cumprido o prazo de janeiro de 2005 para o fim das negociações? "Certamente a dificuldade ficou maior depois de Cancún", responde Lamy.
"Precisamos de uma moldura negociadora e de prazos, que dão um sentido de urgência", diz Panitchpakdi. Acrescenta: "Mas não posso julgar agora se o cronograma original será cumprido".


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