São Paulo, sexta, 15 de janeiro de 1999

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

REFLEXO
O presidente Carlos Menem veio a público garantir que a política de convertibilidade não será tocada
Brasil reacende medo de crise argentina

MAURÍCIO SANTANA DIAS
de Buenos Aires

RICARDO GRINBAUM
da Reportagem Local

A crise econômica no Brasil reacendeu o medo de que a política cambial argentina também possa ruir. Nos últimos dias, o presidente Carlos Menem e as principais autoridades econômicas do país vieram a público garantir que a política de convertibilidade (um peso vale um dólar) não será tocada.
"Não mexeremos no plano de convertibilidade por nada desse mundo", disse à Folha o secretário de Política Macroeconômica do ministério da Economia, Rogelio Frigerio.
Mesmo com todas as garantias oficiais, o mercado financeiro está muito nervoso. O índice Merval, que mede o preço das ações argentinas, despencou ontem 4,37%. Na quarta-feira, a bolsa de valores de Buenos sofreu a maior queda no mundo.
Sob forte pressão dos investidores, os papéis da dívida externa também caíram. Os juros pagos nos títulos externos subiram cerca de 3%.
A crise brasileira está na manchete dos jornais e na preocupação com o que os argentinos chamam de "Brasil-dependência". Cerca de um terço das exportações argentinas são consumidas pelo Brasil.
O temor é que a desvalorização do real torne os produtos brasileiros muito baratos. Em contrapartida, as mercadorias argentinas ficariam muito caras para os consumidores brasileiros.
Se houvesse uma queda muito forte nas exportações argentinas, o governo poderia ser forçado a desamarrar a política cambial, que estabelece por lei a paridade entre o dólar e o peso.
O que mais surpreendeu nos últimos dias os especialistas na economia argentina é que o temor até agora tem se mostrado exagerado.
"A Argentina vai sofrer uma redução no crescimento econômico devido à crise brasileira", diz o ex-secretário de Indústria e Comércio Roberto Lavagna. "Mas é muito pouco provável que haja mudança na convertibilidade."
A economia argentina tem se mostrado mais forte a cada crise internacional que atravessa. Enquanto a maior parte dos países emergentes sofreu fuga de capitais desde a crise da Rússia, em outubro do ano passado, a Argentina teve até um pequeno acréscimo.
Em outubro de 1998, as reservas internacionais estavam em US$ 23 bilhões e hoje estão próximas de US$ 25 bilhões. "Há confiança na manutenção da política econômica", diz o economista Manuel Solanet, do Instituto Fiel.
Para os especialistas, a política cambial argentina pode se manter intacta caso a desvalorização do real não saia do controle. Se o real se desvalorizar até 15% em 1999, como prevê o governo, os argentinos sofreriam diminuição das importações para o Brasil.
"Boa parte da produção, especialmente de trigo e de petróleo, poderia ser desviada para outros mercados", acredita Solanet.
O principal problema que a economia argentina tem sofrido até aqui é no campo financeiro. Com a crise brasileira, houve nova onda de descrédito com os países emergentes, incluindo a Argentina, o que levou ao ataque especulativo contra os títulos da dívida externa.
"Caso persista o clima de instabilidade financeira, as taxas de juros devem se manter altas, o que deve afetar o crescimento da economia em 1999", diz Juan Cabrera, do banco Santander na Argentina.
O crescimento da economia ficaria entre 1,5% e 2,0% no ano, desempenho muito melhor do que a recessão prevista para o Brasil. Isso se a desvalorização do real não fugisse do controle.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.