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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
A luta continua
O BC não é impotente para
frear a queda do dólar. O que
falta é disposição de enfrentar dogmas e interesses
NA QUINTA-FEIRA passada,
tentei argumentar que o governo e o Banco Central têm
ou podem recuperar os instrumentos para segurar o dólar e estimular
uma certa depreciação do real. Fiquei de completar a explicação hoje
e estou aqui tentando cumprir a
promessa.
A responsabilidade básica é do BC,
pois tudo depende de uma combinação judiciosa da política de juros
com compras de reservas e controles sobre o mercado cambial e os fluxos de capital.
A variável crucial é a taxa de juro.
Os juros ainda são altos demais, apesar da diminuição recente. Eles podem ser reduzidos consideravelmente sem grande risco de inflação.
A economia tem margens expressivas de capacidade ociosa. Além disso, a redução favorece não só a ampliação da demanda mas também
(embora com uma defasagem
maior) a da oferta agregada. Em outras palavras, com a maturação dos
investimentos induzidos por juros
mais brandos, aumenta o potencial
de produção para atender a demanda crescente.
A redução dos juros afetaria o
câmbio por dois canais. Diretamente, porque a queda do diferencial de
juros provocaria, de um lado, a saída
de "hot money", e, de outro, desencorajaria a entrada de capitais voláteis e outras operações financeiras
que estimulam a valorização do real.
Indiretamente, porque a ampliação da demanda interna resultaria
em crescimento da demanda por
importações de bens e serviços. Esse
crescimento das importações seria
bem-vindo, diferentemente daquele
que viesse a ser induzido por uma liberalização comercial unilateral,
que aumentaria o "market share"
dos importados no mercado brasileiro e reduziria o poder de barganha
do país nas negociações comerciais.
É verdade que, no passado recente, os juros brasileiros caíram gradualmente e os juros no resto do
mundo aumentaram um pouco.
Apesar disso, continuou a tendência
à valorização do real. Mas esse estreitamento da diferença de juros foi
neutralizado pelo fortalecimento da
expectativa de apreciação do real,
pela queda do risco-país e pelos privilégios tributários concedidos a investidores estrangeiros em títulos
públicos. Outros fatores, notadamente a persistência de uma economia mundial dinâmica e a continuação do aumento dos preços de commodities exportadas pelo Brasil,
contribuíram também para manter
o real sob pressão altista.
Nessas novas circunstâncias, a taxa de juro continua alta demais. Se o
dólar se deprecia mais em relação ao
real do que em relação à maioria das
outras moedas, isso nada mais é do
que outro sinal de que a política monetária brasileira está excessivamente apertada.
A diminuição dos juros traria inflação? Provavelmente, mas nada de
extraordinário. A ampliação da demanda interna pressionaria os preços livres dos bens e serviços não-comercializáveis internacionalmente. A depreciação do real produziria algum aumento dos preços dos
comercializáveis e dos produtos
monitorados. Na verdade, parte da
queda recente da inflação é artificial,
pois decorre de uma valorização inconveniente da moeda brasileira. A
inflação (hoje em torno de 3%) se
aproximaria do centro da meta
(4,5%) e poderia até ultrapassá-la,
mas dificilmente romperia o teto da
banda inflacionária do regime de
metas (6,5%).
A validade dessas suposições depende, claro, do ritmo de queda dos
juros. Em qualquer hipótese, a redução teria de ser gradual e calibrada,
ainda que certamente mais rápida
do que o ritmo atual do BC.
Se for constatado que, a partir de
certo ponto, a taxa de juro compatível com o controle da inflação não é
capaz de produzir o efeito desejado
em termos de depreciação cambial,
cabe então acionar outros instrumentos.
A compra de reservas é um dos
principais. Com a queda dos juros
domésticos, o custo de carregar reservas diminui, o que permite conciliar as intervenções cambiais e o
ajustamento das contas do governo
e do BC. Outro tipo de instrumento
é a introdução de controles sobre o
mercado de câmbio e os fluxos de
capital. Se bem desenhados, esses
controles podem conter a especulação pró-apreciação do real e desestimular ingressos de capital volátil e
outras manobras financeiras que solapem o objetivo de manter uma taxa de câmbio competitiva.
O BC não é impotente. O que falta
é disposição de enfrentar dogmas e
interesses. Disposição para desatrelar o país das políticas convenientes
ao mercado e a uma minoria privilegiada de investidores brasileiros e
estrangeiros.
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 51, economista e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional:
Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/
Elsevier, 2005).
pnbjr@attglobal.net
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