São Paulo, sábado, 15 de março de 1997.

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ARTIGO
Consumo e meio ambiente

FABIO FELDMANN e
MARCELO GOMES SODRÉ
Nesta semana, dois grandes temas estão presentes nos debates públicos: a proteção do meio ambiente e a defesa dos consumidores.
Estamos em plena Rio+5, reunião mundial de avaliação da implantação da chamada Agenda 21; hoje, estamos comemorando o Dia Mundial dos Consumidores, sendo que acabamos de comemorar os seis anos de existência do Código de Defesa do Consumidor. Existe algo em comum nessas datas todas?
A Agenda 21, em seu capítulo 4, "mudando padrões de consumo", já apontava uma resposta: "... causas da deterioração ininterrupta do meio ambiente mundial são os padrões insustentáveis de consumo de produção, especialmente nos países industrializados".
Nossa sociedade de consumo esquece que na produção de bens de consumo se extrai matéria-prima não renovável, os processos produtivos são poluidores e o descarte final dos produtos só faz aumentar a quantidade de lixo.
Estudos recentes demonstram que, até o ano 2050, a população do planeta duplicará e, se nada for feito, a produção mundial de lixo quintuplicará.
A própria Agenda 21 estabeleceu que "no acompanhamento da implementação (...) deve ser atribuída alta prioridade ao exame do papel e do impacto dos padrões insustentáveis de produção e consumo, bem como de suas relações com o desenvolvimento sustentável".
Pensando em problemas como esse é que a Consumers International, ONG mundial que congrega entidades de defesa dos consumidores de mais de 80 países, escolheu como tema para reflexão neste Dia Internacional dos Consumidores o "consumo sustentável".
Nos termos do definido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, "consumo sustentável significa o fornecimento de serviços e produtos que atendam às necessidades básicas, proporcionando uma melhor qualidade de vida enquanto minimizam o uso dos recursos naturais e materiais tóxicos, como também a produção de resíduos e a emissão de poluentes no ciclo de vida do serviço ou do produto, tendo em vista não colocar em risco as necessidades das gerações futuras." Como ainda estamos longe de viver essa definição na prática...
Vivemos numa sociedade em que convivem a miséria e a oferta diária dos mais variados produtos e serviços, como se fossem acessíveis a todos. O problema é que o padrão de consumo vendido é impossível de ser vivido pela população como um todo.
Segundo estudos da Consumers International, divulgados na revista do Idec, "se os países em desenvolvimento crescerem no mesmo ritmo dos desenvolvidos, as reservas de cobre conhecidas hoje dariam para apenas 9,6 anos, as de chumbo, para 3,4 anos, e seriam destruídos 16 milhões de hectares de terra por ano". Os números são assustadores.
A questão é: o que fazer? São dois os campos de batalha: uma melhor distribuição da renda mundial e uma enorme necessidade de educação dos consumidores para um não-consumismo e para a valorização de ações como a minimização de recursos, a reciclagem de produtos, uma melhor racionalização do uso da água e das diversas formas de energia, um incentivo aos chamados produtos verdes.
A Secretaria do Meio Ambiente tem buscado fazer a sua parte. Criou, há dois anos, o Programa Consumidor-Meio Ambiente, que tem tentado de todas as formas incluir o tema do consumo sustentável nas agendas das entidades ambientalistas e de consumidores, bem como nas políticas públicas e empresariais.
Recente decisão incluindo o tema no Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade demonstra que o trabalho começa a gerar frutos.
O governo de São Paulo deu um primeiro grande sinalizador dessas mudanças: decreto inovador assinado nesta semana pelo governador Mário Covas proíbe a compra, pelos órgãos públicos, de qualquer produtos que use o chamado CFC, substância que destrói a camada de ozônio.
Existe ainda pouco a comemorar e muito a fazer. No entanto, saber que em todo o mundo se discute hoje o tema do consumo sustentável já é um início encorajador.


Fabio Feldmann, 41, é secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.
Marcelo Gomes Sodré, 38, é procurador do Estado, professor de direito da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo e coordenador do Programa Consumidor-Meio Ambiente.

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