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LETRA CAPITAL
Livro tenta decifrar interesses do Japão
CELSO PINTO
do Conselho Editorial
Fernando Henrique Cardoso foi
ao Japão. O primeiro-ministro japonês, Ryutaro Hashimoto, veio
ao Brasil. Em junho, o imperador
Akihito e a imperatriz Michiko farão uma visita inédita ao Brasil.
Várias empresas japonesas querem comprar a Vale do Rio Doce.
A Honda e a Toyota têm planos de
investimento. Depois de uma década de indiferença, sucedem-se
missões empresariais japonesas. O
Brasil lançou, com sucesso, bônus
no mercado japonês.
Quem soma os fatos é levado a
imaginar que Brasil e Japão devem
ou podem estar às vésperas de uma
nova onda de aproximação econômica. Como tudo o que se refere ao
Japão, no entanto, a lógica que
move ou pode mover os interesses
japoneses na América Latina é difícil de decifrar.
O livro "Fragmentos sobre as
Relações Nipo-Brasileiras no
Pós-Guerra", do economista Paulo Yokota, que será lançado nesta
semana, é uma tentativa de lançar
alguma luz sobre o assunto. Ex-diretor do Banco Central e ex-presidente do Incra, há três décadas associado ao deputado Delfim Netto, Yokota tem sido um dos pivôs
da relação entre os dois países.
O objetivo do livro é declaradamente modesto: recuperar algo da
história das relações econômicas
na ótica de personagens importantes. Alguns relatos são fortes, como o de Katsunori Yamamoto,
executivo pioneiro na instalação
da Ishibrás-Ishikawajima. Outros
são mais previsíveis, como o do
ex-ministro Shigeaki Ueki.
Kotaro Horisaka, professor da
Universidade de Sophia, em Tóquio, recupera a trajetória de seu
pai, Masataro Horisaka, peça-chave, como adido japonês, na primeira onda de investimentos japoneses no Brasil, iniciada nos anos
50. O Japão tinha perdido a guerra,
estava reconstruindo sua economia, precisava firmar o prestígio
de sua indústria emergente, especialmente de equipamentos, e encontrar abrigo para imigrantes.
O Brasil tinha matéria-prima,
uma tradição de receber imigrantes japoneses desde o início do século e a ambição de construir sua
própria indústria siderúrgica. Alguns empresários japoneses, formados na "Era Meiji" (a "Restauração Meiji", em 1868, abriu o
Japão ao exterior), se envolveram
em vários investimentos no Brasil.
Dois deles foram marcantes: a
construção da Usiminas e da Ishibrás-Ishikawajima. Ambos, por
razões diferentes, fracassaram, do
ponto de vista dos japoneses.
Na Usiminas, os japoneses entraram por meio de uma pequena
"holding" altamente alavancada
em empréstimos, apostando na recuperação dos investimentos pelos dividendos distribuídos pelo
projeto. Os dividendos nunca vieram, a ditadura dos acionistas majoritários existente no Brasil acabou diluindo a participação japonesa e o baque deixou sequelas.
A Ishibrás nasceu no embalo desenvolvimentista do governo JK,
viveu 35 anos de crescimento e o
Brasil chegou a produzir de 7% a
8% da construção naval mundial.
Veio a crise dos 80, sumiram apoio
financeiro e encomendas e a indústria está hoje à beira do colapso. Yamamoto diz que a Coréia,
que manteve o apoio do Estado na
crise, ocupou o espaço brasileiro.
No final dos anos 60 e nos anos
70 houve o grande "boom" do Japão. Era outra geração empresarial
e outra estratégia: foi o momento
das grandes associações com o Estado e a Vale em projetos de peso.
Quando o Estado entrou em crise,
novos problemas surgiram.
Os que apostam numa "terceira
onda" japonesa, agora, imaginam
um processo diferente, com peso
maior das decisões privadas. Como adverte Yokota, contudo, o Japão não decide suas prioridades
pelo sucesso recente de países ou
regiões. O traço cultural da busca
de alianças estratégicas de longo
prazo continua presente e a tarefa
de decifrá-lo continua essencial.
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