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São Paulo, sábado, 15 de março de 2003

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LUÍS NASSIF

Saneamento sem solução

Continua confusa essa história do saneamento no Brasil. No governo Fernando Henrique Cardoso, houve um apagão irresponsável, em parte por conta de indefinição de titularidade de concessão (se de Estados e municípios) -emperrada no Congresso-, em parte por falta de financiamento às estaduais em atividade.
Houve longa discussão, chegando-se a algumas conclusões relevantes sobre a titularidade -respeitando o conceito de região metropolitana e de bacia hidrográfica- e aceitando-se que, dado o volume de investimento necessário para cobrir o país, o melhor modelo teria que combinar capital público e privado.
O governo Lula pode ter no saneamento um de seus grandes diferenciais, pois aí o governo FHC fracassou rotundamente -assim como no setor elétrico. Mas não se sabe bem qual a proposta. Atribuiu-se a responsabilidade pelo tema ao Ministério das Cidades, dirigido pelo ex-governador gaúcho Olívio Dutra. No governo do Estado, Olívio levantou a curiosa tese de que, sendo a água uma dádiva dos céus, não poderia ser explorada comercialmente. Em um Estado quebrado, um dos três que descumpriram a Lei de Responsabilidade Fiscal, Olívio tratou de levantar empréstimos no Bird apenas para não recorrer a investimentos privados na área. Agora, sai por aí a declarar que as concessões devem ser municipais, reabrindo um tema que estava quase resolvido.
No governo FHC, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) utilizou um modelo desastrado de privatização do setor, ao induzir à privatização onerosa das estaduais de saneamento, por meio do adiantamento dos recursos aos governadores. Estados quebrados receberam o dinheiro, continuaram quebrados, o dinheiro acabou e as tarifas foram aumentadas para que as concessionárias recuperassem o que foi pago pela concessão. Só no final do governo FHC se avançou no conceito de que os critérios para a licitação de concessões deveriam ser a universalização dos serviços e a menor tarifa.
Da longa discussão sobre o "apagão do saneamento", em 2001 e 2002, julgava-se que alguns princípios estivessem consolidados. O primeiro era a questão da titularidade, respeitando-se os conceitos de região metropolitana e de bacia hidrográfica.
O segundo, o da natureza do capital. Nem o setor privado nem o público, sozinhos, poderiam dar conta do desafio da universalização do saneamento. A solução passava por abrir o mercado aos dois modelos, mas exigindo-se das empresas índices de desempenho, e, das estatais estaduais, modelos de gestão adequados.
Tendo um contrato claro de concessão e boa gestão, é possível ir atrás de recursos, por meio de operações montadas em cima de recebíveis. Mas há que ter o modelo. E quem definirá o modelo? Um ministro que é contra o investimento privado, recorrendo ao direito divino e sabendo que Deus dispõe a água, mas não as tubulações?
Enquanto o governo se perde nessas indefinições, alguns exemplos bem-sucedidos de privatização de companhias municipais estão indo para o ralo por falta de segurança jurídica.

E-mail - LNassif@uol.com.br


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