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Textos têm retórica forte, mas não exibem números
DO ENVIADO ESPECIAL A LONDRES
Os dois textos emitidos ontem pelo G20 contêm retórica
forte mas nenhum número para apoiá-la. Em vez de falar em
duplicação ou triplicação dos
recursos para o FMI (Fundo
Monetário Internacional) financiar países em dificuldades,
diz apenas que serão elevadas
"muito substancialmente" as
verbas à disposição do Fundo.
Em vez de mencionar os 2%
do PIB (Produto Interno Bruto) de cada país que o FMI recomenda como necessário para
estimular a retomada econômica, número mencionado nesta
semana por Timothy Geithner,
secretário norte-americano do
Tesouro, fala apenas em adotar
"qualquer ação que seja necessária até que o crescimento seja
restaurado".
Os principais pontos dos dois
comunicados são:
Retomada do crescimento
Além de mencionar "qualquer ação que seja necessária",
o texto deixa claro que "a prioridade chave é restaurar os empréstimos, enfrentando, onde
necessário, os problemas no
sistema financeiro".
É tal a prioridade que se tornou objeto de um comunicado
à parte, adicional à tradicional
declaração final e até mais extenso do que esta.
Mas este segundo documento tampouco é específico. Fala
no compromisso de "tomar
ações decisivas, onde necessário" e em "usar todos os instrumentos disponíveis para restaurar o pleno funcionamento
dos mercados financeiros, em
particular para sustentar o fluxo de crédito, tanto doméstico
como globalmente".
As ações mencionadas são
também genéricas, parte delas
já adotadas em diversos países,
a saber: "prover suporte de liquidez [ao sistema financeiro],
incluindo garantias governamentais para as obrigações das
instituições financeiras"; "injetar capital nelas; proteger poupanças e depósitos; e fortalecer
os balanços dos bancos, inclusive lidando com os "ativos tóxicos", informa o documento.
O texto descarta pacotes globais nessa área, por mais que
reconheça a "interconexão do
sistema financeiro global". Mas
enfatiza a importância da "cooperação internacional para maximizar a efetividade dessas
medidas e para rejeitar protecionismo financeiro".
Traduzindo: quer-se evitar
que a ajuda a um banco de um
país acabe prejudicando bancos de outros países já que as
grandes instituições competem
todas no mercado global.
O texto fixa como prioridade
absoluta enfrentar a incerteza
sobre o valor do ativos que os
bancos detêm, mas, de novo,
não diz como fazê-lo.
Pacotes fiscais
No capítulo de expansão fiscal (gasto do governo para estimular a economia), o G20 se
compromete a fazer o esforço
necessário, "na escala da necessidade de restaurar o crescimento". Pede ao FMI que avalie o impacto das ações já adotadas e das que são requeridas.
O presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, calculou ontem que todos
os instrumentos já usados para
enfrentar a crise representam
23% do PIB europeu e 29% do
PIB norte-americano, números impressionantes por dois
ângulos: sua dimensão ciclópica e o fato de que, nem assim,
conseguiram controlar a crise.
Juros
O texto compromete os bancos centrais a "manter politicas
expansionistas tanto tempo
quanto for necessário". Ou seja,
os juros baixíssimos vieram para ficar, o que de alguma forma
força o BC brasileiro a continuar reduzindo os juros internos, já que Henrique Meirelles,
presidente do órgão, é um dos
signatários do texto.
Emergentes e pobres
O texto manifesta o compromisso de ajudar as economias
emergentes e em desenvolvimento a lidar com a reversão
no fluxo de capitais.
É uma alusão ao fato de que a
crise provocou a concentração
dos capitais nos países desenvolvidos, sede da maioria das
instituições financeiras e empresas de grande peso, deixando à mingua emergentes, como
os países do Leste europeu, os
pobres países da África e de
parte da Ásia e até o Brasil, embora menos dependente do papel de bancos estrangeiros.
Sistema financeiro
O texto afirma que o G20 está
disposto a assegurar que "todas
as instituições, mercados e instrumentos financeiros sistemicamente importantes" fiquem
sujeitos a um "grau apropriado
de regulação e supervisão". Especifica que os "hedge funds" e
seus gerentes devem ser "registrados e liberar informação
apropriada sobre os ativos de
risco que possuam".
É claramente a adoção da posição europeia, especialmente a
francesa e a alemã, que vinham
insistindo na necessidade de
colocar todo o chamado "sistema bancário nas sombras" sob
as regras que valem para os sistema bancário normal.
Também as agências de rating ficarão sujeitas à uma nova
regulação, assim como os mercados de derivativos e outros
mercados de ativos.
FMI e Banco Mundial
O FMI terá seu sistema de
cotas modificado, "para refletir
plenamente as mudanças na
economia global", ou seja, para
dar mais voz e voto aos países
emergentes.
A meta é concluir a reforma
do Fundo até janeiro de 2011.
Já a do Banco Mundial "deverá
ser completada até a primavera
de 2010".
(CLÓVIS ROSSI)
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