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OPINIÃO ECONÔMICA
O Banco Central e a CPI
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Anteontem, o presidente da
República declarou: "Não se pode jogar pedras ou condenar o
Banco Central (BC), pois a instituição precisa ser preservada.
Não pode ser vítima de rumores
ou boatos. Isso desmoraliza a
própria moeda".
Ao mesmo tempo, o governo se
movimenta para domesticar a
CPI instalada ontem no Senado,
com o intuito de impedir que as
suas investigações prejudiquem
a credibilidade do sistema financeiro dentro e fora do país.
No entanto o que realmente
prejudica a imagem e a credibilidade do BC e do sistema financeiro brasileiro como um todo é
a falta de transparência, de regras adequadas e de prestação
de contas. É a relutância, tantas
vezes demonstrada, em apurar
as denúncias que vieram a público nos anos recentes e em explicar de forma detalhada e convincente as intervenções que o
BC realizou no âmbito do Proer
e por outros meios.
Se a CPI servir para uma discussão e apuração fundamentadas desses problemas, identificando eventuais responsabilidades, estará contribuindo para
o fortalecimento do BC e do resto do sistema financeiro.
Os graves problemas recentes
apenas confirmaram o que se
sabia há muito tempo: as relações entre o BC e os bancos precisam ser submetidas a uma investigação cuidadosa, para proteger o interesse público de abusos e da tendência arraigada à
socialização de prejuízos. Ficou
patente, também, que faltam
transparência e mecanismos de
prestação de contas nas relações
das instituições financeiras com
os seus clientes e investidores,
muitos dos quais foram pesadamente prejudicados pela crise
cambial iniciada em janeiro.
Note-se que o episódio Marka
é apenas parte, e parte relativamente pequena, da transferência de perdas para o setor público. Já se delineia uma certa tendência, conveniente para o governo e alguns interesses, de
concentrar as atenções dos
meios de comunicação no caso
desse pequeno banco, que não
existe mais, e na possível responsabilidade de um ex-presidente do BC.
Mas não se pode perder de vista que a origem imediata dos
problemas que estarão sob exame da CPI foi a insistência do
BC em defender, com apostas
pesadíssimas, uma taxa de câmbio sobrevalorizada e um regime cambial inviável. O que acabou acontecendo, outra vez, foi
uma tremenda socialização de
prejuízos, processo que ainda está por merecer uma explicação
mais completa.
Nos meses anteriores à crise de
janeiro, ocorreu crescimento da
dívida externa bruta do setor
público, da dívida pública interna indexada ao dólar e dos compromissos do governo no mercado futuro de câmbio, além de
acentuada queda das reservas
internacionais. Quando veio a
explosão do câmbio, a dívida
efetiva do governo em moeda estrangeira já havia aumentado
muito.
O outro lado dessa moeda foram os lucros extraordinários,
no início do ano, de bancos privados que detinham títulos federais indexados ao dólar e posições compradas no mercado
futuro de câmbio. A julgar pelas
informações disponíveis, as
poucas instituições financeiras
que tinham posições vendidas
de câmbio futuro foram socorridas a preços camaradas pelo
BC...
Dados divulgados anteontem
pelo BC confirmaram que, em
janeiro e fevereiro, a dívida líquida do setor público como um
todo cresceu de forma espetacular, passando de R$ 389 bilhões
para R$ 501 bilhões. Como proporção do PIB, a dívida pública
líquida saltou de 42,6% para
51,9%. Um gigantesco "desajuste fiscal"!
É claro que, com a valorização
do real, desde março, grande
parte desse aumento será invertido. Mas a CPI terá obrigatoriamente de investigar a maneira pela qual o BC e os bancos se
conduziram durante a crise
cambial.
Uma das funções fundamentais de qualquer BC é atuar como emprestador de última instância para o sistema financeiro. Em geral, o BC exerce, também, funções relacionadas à supervisão e à regulamentação
dos bancos e outros intermediários financeiros. Para poder desempenhar essas atribuições de
forma adequada e merecer a
confiança da sociedade, o BC do
Brasil não pode continuar funcionando da forma como tem
funcionado.
O BC deve operar, sempre que
possível, de forma transparente
e de acordo com regras claras.
Deve sempre prestar contas de
sua atuação e apurar, sem tergiversações, as denúncias que chegam ao seu conhecimento.
Essa é a única maneira de conquistar e preservar o respeito e o
apoio da opinião pública, elementos indispensáveis para o
bom funcionamento de qualquer banco central.
Paulo Nogueira Batista Jr., 44, economista e
professor da Fundação Getúlio Vargas-SP, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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