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GUERRA DE MOEDAS
Patamar atual pode reduzir em um ponto percentual o crescimento europeu em dois anos, diz analista
Dólar barato deve enfraquecer Europa e Japão
ROBERTO DIAS
DE NOVA YORK
A desvalorização do dólar pode
até aliviar um pouco a situação
dos EUA, mas deve provocar estrago significativo no curto prazo
nas duas outras grandes economias do mundo, Europa e Japão.
Oficialmente, o governo americano defende um dólar forte
-ontem foi a vez de o porta-voz
da Casa Branca, Ari Fleischer, repetir isso. Mas a interpretação
corrente no mercado é que o objetivo na verdade é o contrário, conclusão tirada de declaração do secretário do Tesouro, John Snow,
que apontou no domingo os benefícios que uma desvalorização
traria para as exportações.
Com o que está sendo chamado
de "negligência benigna" dos Estados Unidos, o euro já ganhou
cerca de 10% de valor nas últimas
cinco semanas em relação ao dólar, e o iene atingiu ontem seu valor mais alto em dez meses.
"Muita gente esperava que o dólar caísse, mas acho que ninguém
sabia que seria exatamente agora", diz Kathryn Dominguez, da
Universidade de Michigan. "Nos
Estados Unidos isso não tem muito impacto, mas na Europa é diferente", afirma ela, que aponta a
diferença de importância do setor
exportador nos dois lugares.
Segundo números do FMI
(Fundo Monetário Internacional), ele equivale a cerca de 15%
da produção da zona do euro
(29% no caso da Alemanha, a
maior economia da região). Nos
EUA, é quase a metade disso, 8%.
Pelos cálculos de Daniel Gros,
diretor do Center for European
Studies Policy, o retorno do dólar
aos níveis de 1998 e 1999, como
acontece agora, pode reduzir em
um ponto percentual o crescimento europeu em dois anos.
Um ponto percentual, no caso, é
quase tudo o que se espera de
crescimento para a economia européia neste ano: exato 1,1%, segundo a previsão do FMI.
O pior é que o estrago na Europa acontece não apenas por causa
da taxa de câmbio em si, mas também como consequência de oscilações grandes como a atual, que
comprometem o planejamento
das empresas.
"Uma alta variação da relação
dólar/euro está usualmente associada com maior desemprego na
Eurolândia", aponta Gros.
Assim, reclamações já pipocam
pela Europa e vão sendo rebatidas
do outro lado do Atlântico.
No principal diário econômico
europeu, o "Financial Times", o
colunista Martin Wolf escreveu:
"O declínio do dólar é parte de
uma ajuste global desejável. Mas
como a zona do euro já vem crescendo devagar, a pressão adicional vai ser dolorosa. Será particularmente dura na Alemanha".
Enquanto isso, o "Wall Street
Journal", equivalente americano
do "Financial Times", argumentou ontem em editorial: "Nossa
resposta é: relaxe. O euro não é a
causa para o mal da Europa. A valorização do euro pode sugerir
que o Banco Central Europeu está
muito duro, embora entendamos
sua determinação em não permitir um repique da inflação".
O ajuste externo dos Estados
Unidos, da mesma forma que para a Europa, é motivo de preocupação para o Japão -espera-se
que o banco central japonês intervenha para evitar uma valorização ainda maior da moeda, que
derruba suas exportações, piorando ainda mais a situação de
uma economia que deve crescer
só 0,8% neste ano.
O problema é que se espera uma
ação dos Estados Unidos contra
isso, incluindo pressão pessoal de
Snow sobre seu colega japonês,
Masajuro Shiokawa, no encontro
dos ministros do G7 que começa
amanhã na França.
"Uma redução no superávit japonês como resultado de um declínio nas exportações e um aumento das importações desacompanhados de aumento na demanda doméstica colocaria o Japão
ainda mais profundamente em
recessão", escreveu William Cline
em um livro publicado neste ano
pelo Institute of International
Economics.
A queda do dólar, por fim, já é
motivo de reclamações de empresários em dois lugares que, se não
têm o peso econômico de Europa
e Japão, estão muito mais ligados
aos EUA: Canadá e México, seus
parceiros do Nafta.
Mas a choradeira não deve ter
muito efeito. "Esperamos que o
declínio do dólar continue, especialmente em relação ao euro e ao
dólar canadense", diz o banco
Goldman Sachs em relatório de
previsões que divulgou ontem.
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