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São Paulo, quinta-feira, 15 de maio de 2003

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GUERRA DE MOEDAS

Patamar atual pode reduzir em um ponto percentual o crescimento europeu em dois anos, diz analista

Dólar barato deve enfraquecer Europa e Japão

ROBERTO DIAS
DE NOVA YORK

A desvalorização do dólar pode até aliviar um pouco a situação dos EUA, mas deve provocar estrago significativo no curto prazo nas duas outras grandes economias do mundo, Europa e Japão.
Oficialmente, o governo americano defende um dólar forte -ontem foi a vez de o porta-voz da Casa Branca, Ari Fleischer, repetir isso. Mas a interpretação corrente no mercado é que o objetivo na verdade é o contrário, conclusão tirada de declaração do secretário do Tesouro, John Snow, que apontou no domingo os benefícios que uma desvalorização traria para as exportações.
Com o que está sendo chamado de "negligência benigna" dos Estados Unidos, o euro já ganhou cerca de 10% de valor nas últimas cinco semanas em relação ao dólar, e o iene atingiu ontem seu valor mais alto em dez meses.
"Muita gente esperava que o dólar caísse, mas acho que ninguém sabia que seria exatamente agora", diz Kathryn Dominguez, da Universidade de Michigan. "Nos Estados Unidos isso não tem muito impacto, mas na Europa é diferente", afirma ela, que aponta a diferença de importância do setor exportador nos dois lugares.
Segundo números do FMI (Fundo Monetário Internacional), ele equivale a cerca de 15% da produção da zona do euro (29% no caso da Alemanha, a maior economia da região). Nos EUA, é quase a metade disso, 8%.
Pelos cálculos de Daniel Gros, diretor do Center for European Studies Policy, o retorno do dólar aos níveis de 1998 e 1999, como acontece agora, pode reduzir em um ponto percentual o crescimento europeu em dois anos.
Um ponto percentual, no caso, é quase tudo o que se espera de crescimento para a economia européia neste ano: exato 1,1%, segundo a previsão do FMI.
O pior é que o estrago na Europa acontece não apenas por causa da taxa de câmbio em si, mas também como consequência de oscilações grandes como a atual, que comprometem o planejamento das empresas.
"Uma alta variação da relação dólar/euro está usualmente associada com maior desemprego na Eurolândia", aponta Gros.
Assim, reclamações já pipocam pela Europa e vão sendo rebatidas do outro lado do Atlântico.
No principal diário econômico europeu, o "Financial Times", o colunista Martin Wolf escreveu: "O declínio do dólar é parte de uma ajuste global desejável. Mas como a zona do euro já vem crescendo devagar, a pressão adicional vai ser dolorosa. Será particularmente dura na Alemanha".
Enquanto isso, o "Wall Street Journal", equivalente americano do "Financial Times", argumentou ontem em editorial: "Nossa resposta é: relaxe. O euro não é a causa para o mal da Europa. A valorização do euro pode sugerir que o Banco Central Europeu está muito duro, embora entendamos sua determinação em não permitir um repique da inflação".
O ajuste externo dos Estados Unidos, da mesma forma que para a Europa, é motivo de preocupação para o Japão -espera-se que o banco central japonês intervenha para evitar uma valorização ainda maior da moeda, que derruba suas exportações, piorando ainda mais a situação de uma economia que deve crescer só 0,8% neste ano.
O problema é que se espera uma ação dos Estados Unidos contra isso, incluindo pressão pessoal de Snow sobre seu colega japonês, Masajuro Shiokawa, no encontro dos ministros do G7 que começa amanhã na França.
"Uma redução no superávit japonês como resultado de um declínio nas exportações e um aumento das importações desacompanhados de aumento na demanda doméstica colocaria o Japão ainda mais profundamente em recessão", escreveu William Cline em um livro publicado neste ano pelo Institute of International Economics.
A queda do dólar, por fim, já é motivo de reclamações de empresários em dois lugares que, se não têm o peso econômico de Europa e Japão, estão muito mais ligados aos EUA: Canadá e México, seus parceiros do Nafta.
Mas a choradeira não deve ter muito efeito. "Esperamos que o declínio do dólar continue, especialmente em relação ao euro e ao dólar canadense", diz o banco Goldman Sachs em relatório de previsões que divulgou ontem.


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