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COMÉRCIO EXTERNO
Países ricos colocam grupo na defensiva
G20 se consolida, mas é cobrado a apresentar proposta sobre tarifa
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
O G20, o grupo de países em desenvolvimento que luta para derrubar o protecionismo agrícola
do mundo rico, sofreu uma barragem de críticas e pressões ao ser
criado, em agosto do ano passado, mas sobreviveu, consolidou-se e tornou-se até membro do que
a mídia especializada está chamando de FIP (sigla em inglês para Cinco Parceiros Importantes).
Os FIPs seriam Brasil e Índia,
criadores do G20, Estados Unidos, União Européia e Austrália.
Mas pertencer ao clube tem seu
preço: o G20 foi colocado na defensiva por EUA e UE, que cobram do grupo a apresentação de
sua própria proposta para derrubar as tarifas de importação, na
medida em que rejeita a oferta defendida pelos ricos.
Essa cobrança acabou sendo a
tônica da reunião miniministerial
de ontem em Paris, entre 28 dos
148 países-membros da OMC
(Organização Mundial do Comércio), na enésima tentativa de
ressuscitar a Rodada Doha, lançada em 2001 na capital do Qatar.
O chanceler brasileiro Celso
Amorim de certa forma até festeja
a cobrança, ao dizer que "houve
um esforço para desmontar o
grupo e para desacreditar suas
propostas". "Hoje, há um reconhecimento universal de que o
G20 é indispensável para que a rodada seja concluída."
De fato, o reconhecimento agora é feito até por Franz Fischler, o
comissário (uma espécie de ministro) europeu para Agricultura,
que, quando o G20 nasceu e fez
suas propostas, fulminou-as dizendo que o grupo estava "pedindo o céu". Provocado pela Folha,
Fischler disse ontem que o G20
desceu das alturas: "Estamos vivendo na mesma atmosfera. O
G20 é muito importante, e sua atitude é muito mais construtiva".
Robert Zoellick, responsável pelo comércio exterior dos EUA,
que atacou o G20 em artigo para o
jornal britânico "Financial Times", não repete agora as críticas,
mas mantém a cobrança: "Gostaria de acreditar que meus artigos
os encorajaram a desempenhar
um papel construtivo. Agora, precisam dar um passo que é crucial
para a negociação: mudar o foco
dos subsídios à exportação e ao
apoio interno para ver o que, juntos, podemos fazer em matéria de
acesso a mercado".
A frase de Zoellick acaba sendo
também uma definição do estágio
da negociação na área agrícola,
que é a chave da Rodada Doha:
mais ou menos desenhada a moldura (apenas a moldura, não o
quadro final) em matéria de subsídios internos e à exportação, o
nó a desfazer é a questão de acesso
a mercado, o jargão comercial para designar redução das tarifas de
importação (ver quadro).
O G20 rejeita a proposta de redução apoiada pelos países ricos
porque, como diz Amorim, "trata-se de uma licença para não fazer nada". Mas não apresentou
até agora sua própria fórmula.
"Vamos trabalhar duro nos
próximos 10 ou 15 dias para formular uma proposta capaz de não
apenas atender nossos interesses
mas também de cobrir as brechas
entre os diferentes parceiros",
promete o chanceler brasileiro.
"Espero ansiosamente as idéias
deles", responde Zoellick, com
uma pitada de ironia.
Janela e inverno
A referência aos próximos 10 ou
15 dias se deve ao fato de que, no
dia 2, reúne-se outra vez, em Genebra, o Comitê de Negociações
Agrícolas, a arena em que se deve
dissolver o nó na área. Se até lá
não houver uma proposta capaz
de agradar a todas as partes, fecha-se o que os negociadores vêm
chamando de "uma janela de
oportunidade".
Diz, por exemplo, o diretor-geral da OMC, Supachai Panitchpakdi: "Se negligenciarmos na alimentação do atual impulso político, corremos o risco muito real de
perder não apenas este ano mas
possivelmente boa parte do próximo anos também".
Reforça Pascal Lamy, comissário europeu para Comércio: "A janela de oportunidade se fechará
logo, para dar lugar a um tipo de
inverno na OMC".
O tempo ontem em Paris, porém, era bastante primaveril, a
ponto de injetar algum otimismo
no chanceler brasileiro, levando-o
a dizer: "Minha experiência em
negociações comerciais me transformou em um desses animais capazes de sentir quando um terremoto está vindo. Desta vez, é um
terremoto positivo, devido a movimentos de todos os grandes
parceiros".
Na mesma linha, Lamy disse
que "negociações comerciais são
como vulcões e suas três fases:
dormir, soltar fumaça e ter uma
erupção. O vulcão OMC está fumegando outra vez".
Menos inclinado a metáforas e
mais prático, Zoellick acha que
avançar na Rodada Doha representa "uma oportunidade estratégica, porque permitirá aprofundar a expansão econômica".
O que acontece se o vulcão parar de soltar fumaça ou o terremoto não for positivo? "Seria difícil fazer a Rodada avançar de novo por um bom tempo", responde
Panitchpakdi.
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