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São Paulo, domingo, 15 de junho de 2003

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SONHO DISTANTE

Aluguéis subiram menos que indicadores, enquanto tarifas públicas, sem concorrência, superaram IGPs

Com renda curta, inquilino negocia reajuste

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Inquilinos e proprietários abandonaram, na prática, a indexação dos aluguéis e passaram a negociar o percentual de reajuste dos contratos. Desde 1998, os aumentos variaram sempre abaixo dos índices de correção -o IGP-M (Índice Geral de Preços - Mercado) ou o IGP-DI (Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna). Já no caso das tarifas públicas, também ajustadas por esses indicadores, os aumentos foram muito maiores.
É o que mostra levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), feito a pedido da Folha. Em 2002, por exemplo, os aluguéis subiram 0,29%, de acordo com o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor -Amplo). As tarifas de energia tiveram uma alta muito maior: 19,88%. No mesmo ano, o IGP-M ficou em 25,31%.
Segundo a gerente do Departamento de Índices de Preços dos IBGE, Eulina Nunes dos Santos, o fato de a renda dos trabalhadores não acompanhar o ritmo do aumento dos aluguéis foi a principal causa para a correção pelos IGPs ter sido deixada de lado.
Outros motivos são, afirma ela, o alto número de imóveis vagos, o que eleva a competição e reduz o preço dos aluguéis, e a preferência do proprietário em receber menos a ficar com o imóvel desocupado.
No caso das tarifas, não há competição, diz Santos, o que permitiu que elas subissem num nível próximo ao dos indexadores.
"A renda não cresceu [até caiu nos últimos dois anos] como o preço dos aluguéis e chegou num nível em que não havia outra solução a não ser negociar", disse.
Segundo o Secovi-SP (sindicato das administradoras de imóveis), na cidade de São Paulo, 90% dos contratos ainda prevêem formalmente a correção pelos IGPs. Existem 650 mil residências locadas na cidade de São Paulo.
O vice-presidente da entidade, Sérgio Lembi, afirma que as negociações são uma prática comum porque "o IGP-M não mostra a realidade do bolso do inquilino". "Negociar caso a caso me parece razoável. Não conheço categoria que tenha recebido reajuste na mesma proporção do IGP-M."
Lembi apresenta, porém, números diferentes dos do IBGE. Diz que contratos foram reajustados em 13% (índice anualizado) na cidade de São Paulo no primeiro trimestre.
Um aluguel que hipoteticamente vencesse em maio e tivesse o IGP-DI como indexador sofreria um reajuste de 30,05%, se o contrato fosse aplicado à risca. Esse percentual é "impraticável", segundo Lembi.
Para o economista Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio e da Fecomercio-RJ, "é fora de propósito" reajustar tanto as tarifas públicas como os contratos de locação pelos IGPs. Isso porque eles não "espelham a renda das famílias".

Início
Em 1999, o descompasso entre os aumentos dos aluguéis e a variação dos IGPs se acentuou, o que fez mais gente abandonar os indexadores. Com a desvalorização do real, os índices -compostos em 60% por preços no atacado, mais sujeitos ao impacto cambial- explodiram.
O IGP-M teve alta de 20,1% naquele ano. Já os aluguéis caíram 2,41%, segundo o IPCA. No mesmo ano, as tarifas de energia dispararam 19,89%, absorvendo quase integralmente a variação do IGP-M.
A gerente do IBGE lembra que nos primeiros anos do real (1994 a 1996) os aluguéis tiveram variações acima do IPCA -de até 94,73% em 1995- porque os contratos estavam defasados. Motivo: a correção era anual ou a cada dois anos, apesar da hiperinflação. Até 1996, os contratos ainda "carregaram" a inflação antiga desse período, o que fez os reajustes dispararem.
Por isso, no acumulado do Plano Real (julho de 1994 a maio de 2003), os aluguéis ainda têm uma alta maior do que o IPCA -393,26%, contra 154,11%. Em igual período, as tarifas de energia subiram 305,27%.
Neste ano, os aluguéis somam alta de 1,59% até maio -menos do que os 6,8% do IPCA e dos 13,87% da energia elétrica.
Para Luiz Roberto Cunha, o fato de os aluguéis "perderem" para o IPCA é "uma das âncoras da estabilidade" nos últimos anos devido ao peso elevado que têm no orçamento das famílias e na composição do IPCA, o índice que baliza as metas oficiais de inflação do governo.

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