São Paulo, terça-feira, 15 de agosto de 2000


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OPINIÃO ECONÔMICA
Experiência valiosa

BENJAMIN STEINBRUCH

Terminou sob palmas a operação de venda pulverizada de ações da Petrobras no Brasil e no exterior. É pena que o sucesso da operação tenha sido maior lá fora do que aqui. Ao todo, 310 mil trabalhadores compraram ações, num total de R$ 1,6 bilhão, por meio de fundos de investimentos, utilizando recursos do Fundo de Garantia. No exterior, cerca de 13 mil investidores aplicaram US$ 2,6 bilhões para adquirir participação acionária na grande empresa estatal de petróleo brasileira.
Apesar do sucesso da operação, ficou claro que milhares de trabalhadores brasileiros perderam a oportunidade de entrar no mercado de ações. Deixaram de fazer um grande negócio. Comprar ações de companhias de petróleo é um bom negócio em qualquer parte do mundo, principalmente no Brasil, onde a Petrobras opera o monopólio oficial. Ninguém duvida de que, com ações da Petrobras, os trabalhadores teriam no futuro muito mais recursos para um eventual período de desemprego ou para a época da aposentadoria do que terão com o dinheiro aplicado no Fundo de Garantia.
O Fundo de Garantia é uma aplicação de renda fixa, com juros baixíssimos, de 3% ao ano. A Petrobras, por sua vez, a despeito de todos os problemas advindos da administração estatal, é uma empresa ativa, com boas possibilidades de lucros e de valorização no mercado de ações. É mais do que razoável supor que, a longo prazo, ter ações da Petrobras é muito mais interessante do que ter uma posição no FGTS.
Ora, se todos acreditam nisso, por que então não se fez uma campanha ampla para incentivar os trabalhadores a trocar o Fundo por ações da Petrobras? Parece que faltou coragem. Essa campanha embutia um risco: o de que os papéis da Petrobras venham a apresentar eventual desvalorização a curto ou a médio prazos. Nesse caso, o governo poderia ser acusado de ter induzido os trabalhadores à perda de parte de seu patrimônio, que antes estava seguramente guardado no FGTS.
Concordo com o argumento. Seria irresponsável deixar de alertar os aplicadores para o risco que correm ao utilizar os recursos do FGTS para a compra de ações. Mesmo mal remunerado na Caixa Econômica Federal, o Fundo de Garantia representa uma poupança segura para a aposentadoria ou para eventuais fases de desemprego. Mas também acho que a campanha publicitária que informou os interessados não precisaria ser tão tímida. Era essencial alertar para o risco de perda de patrimônio, tanto quanto seria aconselhável lembrar, na publicidade oficial, que a possibilidade de ganho a longo prazo é muito maior do que o risco de perda.
A experiência do que ocorreu na privatização da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) é reveladora para demonstrar que o investimento em ações só tem sentido se pensado a longo prazo. Muitos trabalhadores da CSN compraram cotas de um fundo constituído pelos empregados da empresa e só poderiam vendê-las depois de dez anos. Ao longo do tempo, porém, muitos decidiram transformar suas cotas em dinheiro vivo antes do prazo de dez anos. Isso criou um mercado paralelo, no qual as cotas são vendidas com enorme deságio. Ao vender suas ações nesse mercado paralelo, os trabalhadores estão dilapidando uma enorme parcela de seu capital, em benefício de intermediários.
No caso da Petrobras, esse risco do mercado paralelo praticamente não existe, porque os recursos são bloqueados. Quem quiser vender as ações da Petrobras só poderá fazê-lo depois de um ano e, assim mesmo, o dinheiro terá de retornar ao FGTS, onde permanece bloqueado.
A operação Petrobras mostrou que venda pulverizada é um caminho válido para privatizar estatais. Talvez não seja nem mesmo o mais eficiente. Na Inglaterra, ações de estatais privatizadas adquiridas dessa forma foram recompradas por poucos grupos em poucos meses. Apesar disso, o processo representou um importante incentivo à ampliação do mercado de capitais. Antes do início das privatizações havia 5 milhões de acionistas na Inglaterra. Dez anos depois, esse número havia aumentado para 20 milhões.
A idéia de repetir a experiência na venda de parte do capital pertencente ao Tesouro em Furnas e na Vale do Rio Doce, portanto, precisa ser levada adiante.
No início dos anos 70, o desastre das Bolsas brasileiras provocou prejuízos generalizados a pequenos acionistas que acabavam de descobrir o mercado acionário. Escaldados, eles nunca mais voltaram ao mercado. Quem sabe não será essa uma oportunidade para devolver a milhares de investidores o gosto pelo investimento de risco? Haverá então mais capital disponível para investimento produtivo, mais capitalistas, mais produção, mais lucros e, sobretudo, mais empregos.


Benjamin Steinbruch, 47, empresário, é presidente dos conselhos de administração da Valepar e da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br


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