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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
O dólar em apuros
O risco maior é que
a depreciação gradual
do dólar se transforme subitamente em colapso
O DÓLAR, antiga potência mundial, é hoje uma moeda frágil,
problemática. Vem apanhando feio nos mercados cambiais,
até de moedas notoriamente subdesenvolvidas, como o nosso real. A
fragilidade do dólar não é recente,
mas foi exacerbada pela crise financeira dos últimos meses.
Na raiz do problema, está a elevada dependência da economia americana em relação a capitais externos.
O déficit em conta corrente dos EUA
alcançou mais de 6% do PIB em
2005 e 2006. Só agora, em 2007, nota-se certa diminuição, atribuída aos
efeitos da depreciação do dólar sobre as exportações e as importações
americanas.
Como observou Alan Greenspan,
ex-presidente do Fed, o risco é que,
em algum momento, os investidores
estrangeiros se recusem a aumentar
a participação de ativos denominados em dólares nos seus portfólios.
Há indicações de que esse momento
talvez esteja se aproximando. Em
agosto, no auge do terremoto financeiro, a saída de capital dos EUA
chegou a US$ 163 bilhões.
A crise financeira recente fragiliza
o dólar por dois motivos, pelo menos. Primeiro porque gera desconfiança quanto à solidez dos mercados e dos bancos dos EUA. Segundo
porque cria a expectativa de que os
juros dos EUA cairão relativamente
aos de outros países, tornando as
aplicações em dólares menos competitivas. Expectativas de juros menores e de depreciação cambial, somadas a dúvidas quanto à confiabilidade das instituições financeiras do
país, formam a receita segura para
desencadear a saída de capitais.
O Fed enfrenta, portanto, dilemas
difíceis. O mais comentado -o "trade-off" entre inflação e crescimento- é apenas um deles. Mais grave
parece ser o dilema entre estabilizar
o sistema financeiro e preservar a
confiança no dólar. Uma diminuição
mais agressiva das taxas de juro favoreceria a estabilização financeira,
mas colocaria em risco o financiamento dos desequilíbrios externos e
o valor externo do dólar.
A preferência do governo americano é pela continuação de uma desvalorização gradual do dólar. Isso
contribui para o ajustamento do balanço de pagamentos e ajuda a diminuir o risco de uma recessão, possibilidade que se tornou muito real
depois do terremoto financeiro.
No entanto, esse processo de ajustamento tem sido assimétrico e instável. A China se recusa a permitir
uma apreciação mais rápida da sua
moeda. O superávit chinês em conta
corrente ainda está aumentando. O
do Japão continua elevado e não dá
mostras de que irá se reduzir significativamente no curto prazo.
Assim, a contrapartida da depreciação do dólar tem recaído sobre o
euro, o dólar canadense e o dólar
australiano, moedas que flutuam de
forma mais ou menos livre. Algumas
moedas subdesenvolvidas, como o
real, também estão contribuindo
com a sua dose de apreciação. O problema é que a apreciação cambial
solapa a competitividade internacional e ameaça o crescimento econômico desses países. Os europeus
já estão bastante preocupados com a
valorização do euro. Não querem
que a sua moeda seja a principal válvula de escape para o dólar.
O risco maior é que a desvalorização gradual do dólar se transforme
subitamente em colapso. Uma queda abrupta do dólar poderia ser provocada por uma perda de confiança
nos ativos em dólares ou provocar,
ela mesma, a perda de confiança na
moeda americana. Acuado pelo medo da recessão e pela gravidade da
crise no sistema financeiro, o Fed dificilmente reagiria a isso com aumentos acentuados dos juros.
O que deteria, então, a queda livre
da moeda americana?
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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