São Paulo, sexta-feira, 16 de janeiro de 2004

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ANÁLISE

Crise emergente à vista

DO "FINANCIAL TIMES"

Os investidores estão sempre se deixando atrair pelos títulos de dívida de mercados emergentes, como alcoólatras por um frigobar. Com freqüência, uma moratória ou insolvência causa ressaca que afeta toda a categoria de ativos. Mas os rendimentos são atraentes demais para que os investidores possam ignorá-los por muito tempo.
Cinco anos atrás, depois da moratória da dívida russa, o ágio do índice de títulos de mercados emergentes do JP Morgan com relação aos bônus do Tesouro norte-americano chegava a 16%. Caiu agora a menos de 4%.
Com os juros de curto prazo norte-americanos fixados em 1% e os rendimentos dos bônus do Tesouro dos Estados Unidos registrando seus mais baixos níveis em 25 anos, em 2003, os investidores se viram forçados a redescobrir seu apetite pelo risco.

Nova bolha?
O declínio no ágio pago pelos títulos de mercados emergentes espelha a corrida do ano passado em direção aos papéis corporativos de alto rendimento e ações do setor de tecnologia.
Trata-se de uma nova bolha? Nas duas últimas ocasiões em que os títulos dos países emergentes caíram tanto logo surgiram crises. A baixa de 1993 precedeu a desvalorização do peso mexicano, e a de 1997/98 foi seguida pela crise da dívida asiática e pela moratória russa.
Será que desta vez as coisas serão diferentes?
Certamente houve melhora nas finanças dos mercados emergentes pelo mundo.
De acordo com a corretora Dresdner Kleinwort Wasserstein, o índice ponderado de classificação dos títulos de dívida de países emergentes subiu em um grau desde 1997. Em si, isso justificaria uma melhora de 0,5% nos ágios.
Os mercados de países emergentes tradicionalmente são beneficiados pelo crescimento econômico mundial.
Portanto, as previsões de crescimento para 2004, acentuadamente mais elevadas que as do ano anterior, decerto ajudaram.
A alta nos preços das commodities, que continuam a ser parte importante das exportações de muitas nações emergentes, é parte da mesma tendência.
Mas o problema para os mercados emergentes é nem tanto o que acontece quando muito dinheiro entra -um valor recorde de US$ 87 bilhões em títulos de mercados emergentes foram colocados no mercado em 2002, de acordo com dados da Thomson Financial-, mas sim a situação criada quando o capital deseja partir.

Tempo
No momento, isso não parece ser problema. As taxas de juros dos países desenvolvidos estão baixas e as moedas estão subindo, o que encoraja o crescimento de carteiras de investimento.
No passado, as crises foram precipitadas por uma combinação de taxas de câmbio fixas e alto nível de dívida em moeda estrangeira.
Mas, dessa vez, menos países têm âncoras cambiais explícitas, e alguns têm a maior parte de sua dívida denominada em moeda nacional.
Mesmo assim, alguns sinais preocupantes são claros.
O entusiasmo por papéis dos mercados emergentes é generalizado e inclui até perspectivas dúbias como Colômbia e Venezuela, que passam por situações de instabilidade clara. Isso sugere que o ímpeto, e não o cálculo frio, vem conduzindo os mercados.
Na Ásia, a dívida subiu muito em proporção com o Produto Interno Bruto (PIB), com os governos arcando com o ônus de consertar a crise das empresas no final dos anos 90.
Se o crescimento econômico mundial continuar forte neste ano, e o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) mantiver os juros baixos, provavelmente será possível evitar calamidades em 2004.
Mas a questão, agora, não é se uma nova crise ocorrerá, mas, sim, quando.


Tradução de Paulo Migliacci


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