São Paulo, quinta-feira, 16 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

Hélio Costa e a TV digital

Pelos prazos de desincompatibilização para as próximas eleições, provavelmente o ministro das Comunicações, Hélio Costa, não participará da decisão final sobre o padrão da TV digital brasileira. Não será ruim para o país.
Em sua recente participação no "Observatório da Imprensa" -programa de televisão transmitido pela Rede Educativa-, ele dividiu em dois os grupos de discussão: os que têm visão técnica e isenta, e querem o melhor para o Brasil (ele), e os críticos, que servem aos interesses das empresas de telefonia fixa. É uma simplificação que não cola.
Primeiro, vamos demarcar posições:
1) O ministro defende o interesse dos radiodifusores. É direito dele, mas não venha com a história de que sua motivação é técnica e isenta;
2) Embora insista em dizer que "para o governo brasileiro" o padrão japonês é o melhor, o ministro definitivamente não fala pelo governo brasileiro. No seu nível têm os ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e o da Ciência e Tecnologia e, acima deles, a Casa Civil;
3) Quando sustenta que o sistema japonês é o melhor "hoje", e diz que o americano atenderá às especificações exigidas em julho, está admitindo cinco meses de diferença no estágio tecnológico entre ambos. Esse prazo é suficiente para jogar para segundo plano critérios de política industrial, tecnológica, potencial exportador, modelo de negócio?;
4) O ministro não tem a menor idéia do que serão os modelos futuros de negócio dos diversos setores envolvidos no tema: radiodifusores, telefonia fixa, celular e produtores independentes. Virá uma nova lei em breve, unificando a Lei Geral de Telecomunicações e a Lei de Radiodifusão, definindo as regras para a convergência digital e o ministro patrocina um padrão sem levar em conta o que será esse futuro.
Posto isso, vamos às bandeiras legítimas que, representando os radiodifusores, o ministro defende. Primeiro, a proibição de que as empresas de telefonia sejam produtoras de conteúdo. A nova legislação tem que delimitar claramente o papel do operador de rede (o que distribui conteúdo), o produtor de conteúdo e o distribuidor (o que junta produtores em torno de um modelo de vendas único). E tem que preservar a produção de conteúdo em mãos nacionais. Em qualquer outro ramo de atividade, quem domina a transmissão não pode deter o monopólio dos serviços. Segundo, as TVs abertas têm o direito de vender sua imagem pelos celulares sem passar pelo crivo das operadoras.
O ministro tem razão quando fala na desproporção de força entre as empresas de telefonia (grandes multinacionais) e as emissoras brasileiras (de capital nacional, com faturamento sensivelmente inferior). Mas não aborda, em nenhum momento, a concentração de poder na área, nem anunciou medida alguma para impedir movimentos de associação que podem levar à monopolização do setor.
Um modelo civilizado de regulação tem que delimitar claramente a atividade de cada agente, impedir a concentração de poder, defender as emissoras nacionais contra as teles multinacionais, mas defender o produtor nacional contra o poder de oligopólio do atual modelo de radiodifusão.


Email: Luisnassif@uol.com.br

Texto Anterior: Emergentes: África do Sul pode ter crescido 6%
Próximo Texto: Juros: Dívida atrelada à Selic cai, mas total é de quase R$ 1 tri
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.