São Paulo, quarta, 16 de setembro de 1998

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Unctad propõe moratória temporária

CHICO SANTOS
da Sucursal do Rio

O relatório sobre comércio e desenvolvimento de 1998 da Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento), órgão da ONU, propõe a moratória temporária como saída para os países em desenvolvimento cujas moedas estejam sob ataque especulativo.
Durante a apresentação do documento, no Rio, o economista norte-americano Jan Kregel, da Universidade de Bolonha (Itália) e consultor da Unctad, disse que o Brasil acabará tendo que recorrer à moratória ou à desvalorização do câmbio para enfrentar os ataques. Para ele, o Brasil não é diferente da Ásia em termos de risco.
O documento da Unctad propõe um novo modelo de desenvolvimento econômico internacional, com mecanismos de controle dos capitais de curto prazo.
Kregel disse que "é previsível uma nova rodada de regulação dos fluxos financeiros internacionais". Diante da gravidade da crise, ele propõe uma conferência internacional para reorganizar a economia mundial, semelhante à de Breton Woods (EUA) depois da 2ª Guerra Mundial.
Kregel considera que os modelos de desenvolvimento com base na atração de capitais externos, via juros elevados, para dar sustentação à moeda do país (âncora cambial) carregam o germe da própria destruição, na forma de deterioração das contas externas e do déficit interno do governo.
A Unctad, com sede em Genebra (Suíça), tem como secretário-geral o brasileiro Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda.
Mesmo com propostas contrárias à linha que vem sendo posta em prática pelo Brasil, o relatório foi divulgado na sede do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), um dos principais órgãos econômicos do governo brasileiro.
Segundo o documento da Unctad, a possibilidade do uso da moratória por países sob ataque especulativo seria uma correspondente no campo financeiro às normas da OMC (Organização Mundial do Comércio) que permitem o uso de salvaguardas na área comercial.
A Unctad diz que o uso da moratória está respaldado no artigo 8º do documento de constituição do Fundo Monetário Internacional.
Também o artigo 6º é citado como um instrumento que respaldaria o controle dos fluxos de capitais internacionais. A moratória pode ser unilateral, como a russa, e seguida da rápida renegociação dos débitos.

Recessão mundial
O órgão da ONU considera que o mundo está à beira de uma recessão de grandes proporções.
Somente com a crise asiática o documento calcula que as perdas acumularam em um ano US$ 260 bilhões, quase um terço do PIB brasileiro e cerca de 1% da produção mundial.
Para a Unctad, a crise é sistêmica e se desdobra desde a crise financeira da América Latina do final dos anos 70, passando pela crise da Bolsa de Nova York de 1987, pela crise das moedas européias de 1992 e pela crise mexicana de 1994.
Na raiz do problema estão os fluxos de capitais de curto prazo, que geram sobrevalorização da moeda do país e de bens como imóveis e ações.
Além disso, como esses fluxos são intermediados por instituições financeiras domésticas, quando os ataques às moedas ocorrem, eles acabam gerando também crises nos sistemas financeiros.



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