|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
Viva a Argentina!
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
O título é uma provocação,
apresso-me a explicar (hoje
em dia, é preciso explicar tudo!).
Bem sei que a Argentina ainda
desperta antipatias no Brasil. São
muitos os que tentam explorar essa antipatia para propósitos escusos (um dia alguém terá de escrever todo um tratado, de proporções enciclopédicas, sobre as atividades da quinta-coluna neste
país).
A Argentina é extraordinariamente importante para o Brasil.
Trata-se do nosso segundo maior
parceiro comercial, que responde
atualmente por 8% das exportações e 9% das importações brasileiras. Fala-se em "falência", "fracasso" e "esgotamento" do Mercosul. Há muito barulho contra
as restrições impostas em 2004 pelo governo argentino às exportações de certos produtos brasileiros. Quem lê as manchetes de alguns órgãos de imprensa pode ser
levado a pensar que o bloco sul-americano está na UTI. Pouco se
comenta que o comércio intra-Mercosul tem mostrado muito dinamismo no passado recente.
Entre janeiro e novembro de
2004, em comparação a igual período de 2003, as exportações do
Brasil para os demais países do
Mercosul aumentaram 60%,
quase o dobro da taxa de crescimento das exportações totais do
Brasil. Nenhum dos outros blocos
econômicos ou regiões do mundo
registrou expansão comparável
na importação de produtos brasileiros nesse período. Para a Argentina, o crescimento chega a
65%. Em 2003, as vendas brasileiras para a Argentina já haviam
aumentado 95%.
Pergunto: não é impressionante
o contraste entre esses dados e o
noticiário recente? Não estamos
reclamando de barriga cheia? O
vigor das nossas exportações reflete a rapidez da recuperação da
economia argentina, que saiu de
uma crise profunda em 2001 e
2002 para alcançar taxas de crescimento de 9% em 2003 e de cerca
de 7% em 2004, bem superiores às
brasileiras.
Portanto as discordâncias comerciais entre o Brasil e a Argentina poderiam ser tratadas com
um pouco mais de objetividade
pela imprensa brasileira. Um
crescimento do comércio tão rápido em tão pouco tempo provoca
fatalmente tensões e disputas.
Vamos ser justos: os argumentos argentinos têm sua razão de
ser. Nenhum país que se preza
permite que setores importantes
da sua economia sejam abalados
por uma expansão desmedida
das importações. Um processo de
integração econômica precisa levar em conta as assimetrias e desigualdades estruturais entre os
países participantes. Aliás, esse é
exatamente o argumento que o
Brasil usa nas negociações comerciais com os países desenvolvidos.
A Argentina tem sido uma aliada nessas negociações -outra razão para preservar boas relações
com ela. Precisamos continuar
trabalhando em sintonia com os
argentinos na OMC, nos entendimentos com a União Européia e,
sobretudo, na Alca. Todas essas
negociações, que são altamente
problemáticas, serão retomadas
em 2005.
"Ojo!", como dizem os argentinos. São muitos -e muito influentes- os que não se conformam com o fato de a aliança Argentina-Brasil ter contribuído em
2003 e em 2004 para travar os
acordos comerciais com os EUA e
a União Européia. Os numerosos
críticos tupiniquins da Argentina
e do Mercosul, vários deles instalados dentro do governo brasileiro, não vão descansar. Os ruidosos "patriotas" que pedem endurecimento com o governo Kirchner têm freqüentemente uma
agenda oculta.
Essa agenda tem quatro letras:
Alca.
Paulo Nogueira Batista Jr., 49, economista e professor da FGV-Eaesp, escreve
às quintas-feiras nesta coluna. É autor
do livro "A Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Emprego: Criação de vagas cresce pelo 11º mês Índice
|