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COMENTÁRIO
Falta flexibilidade à política monetária
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um terço da inflação brasileira está longe do alcance
das elevações de juros decididas
pelo Banco Central. O Copom pode elevar a Selic a 40% -ontem a
taxa básica foi elevada para
18,75%- e ainda assim os preços
administrados, ou reajustados
por contratos, subirão aproximadamente 7%.
Não há martelada de juros que
faça caírem os preços que, por
contrato, são reajustados de acordo com a inflação passada. No
ano passado, quando a inflação
medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) foi de
7,6%, esses preços subiram nada
menos do que 10,2%, enquanto os
preços livres subiram 6,5%.
A política monetária só consegue atuar sobre os preços livres,
que sobem ou descem dependendo das condições de custo e do
aquecimento da economia.
Quanto maior o crescimento,
maior a procura por bens e, por
conta disso, maior a pressão por
aumentos nos preços.
A procura por serviços indexados por contrato não tem nenhum efeito sobre os seus preços.
A tarifa de energia elétrica é a
mesma, não importa se a economia cresce ou está em recessão.
Uma vez por ano ela será reajustada e, ainda que haja uma crise geral, os preços vão subir.
Como os juros contêm os preços? Indiretamente, por meio dos
efeitos da política monetária no
nível de atividade da economia.
Os juros sobem, os financiamentos e créditos aos produtores e
consumidores vão ficando mais
caros, os empresários pensam
duas vezes em investir e os consumidores acabam contraindo os
gastos. De forma geral, a economia passa a crescer mais devagar.
Cedo ou tarde os empresários
ajustarão os preços de seus produtos e serviços às novas condições de procura, agora mais fraca,
e a inflação baixa ou se estabiliza.
Qual o problema com os preços
indexados? O governo brasileiro
definiu como meta de inflação a
taxa cheia, ou seja, o BC deve garantir que o IPCA fique em 5,1%,
independentemente dos preços
administrados. Como eles vão subir 7%, não importa o que aconteça com a taxa de crescimento da
economia, resta ao BC martelar os
demais preços, reduzindo ainda
mais a atividade econômica.
Na prática, os preços livres têm
que cair ou subir bem menos para
compensar o peso dos reajustes
de tarifas e outros preços indexados à inflação passada. Um erro?
Se for, não é do BC, do qual espera-se apenas que cumpra uma
meta preestabelecida. Vários analistas chamaram a atenção para o
problema. Há soluções, como,
por exemplo, adotar núcleos de
inflação, excluindo os preços administrados. O governo não mostrou-se disposto a discuti-los.
Neste ano, a equipe do BC mostra-se inflexível em cumprir o
centro de uma meta que já foi
ajustada para 5,1%. Beira a uma
decisão cabalística, já que, do
ponto de vista da estabilidade
monetária, faria pouca diferença
fechar este ano com inflação de
5,5% ou 4,5%. Afinal, 2004 foi um
ano difícil desse ponto de vista
-basta lembrar dos choques de
preços de petróleo e do salto do
câmbio, que começou o ano em
R$ 2,85 e, em junho, já estava em
R$ 3,13. Baixar a taxa de inflação
de 7,6% (resultado fechado de
2004) para algo em torno de 5,5%
neste ano não faria ninguém argumentar que o Brasil abandonou a estabilidade.
Não são poucos os analistas e
empresários que apontam falta de
flexibilidade do BC. Olhar com
mais cuidado para os preços administrados fosse talvez um primeiro passo para tornar a política
monetária mais adequada à realidade brasileira.
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