São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

Os novos bilionários

BORIS TABACOF

A estrutura das empresas e dos negócios no Brasil apresenta sinais significativos de que estamos, cada vez mais, integrados na dinâmica global. É um processo gradual pouco percebido, já que ficamos todos muito ocupados em discutir juros e câmbio e as nossas melhores cabeças da ciência econômica e da administração de empresas não conseguem sair da rotina do sempre mais do mesmo.
A publicação da nova lista da "Forbes" dos bilionários brasileiros é emblemática dos novos tempos. O capitalismo nacional tem se caracterizado pela visão patrimonialista, avaliando o peso e o sucesso dos seus membros pelos ativos tangíveis: fábricas, fazendas, imóveis, bem como valores líquidos.
O rápido crescimento da relação dos bilionários deveu-se a outro parâmetro: o valor de mercado das ações que representam o patrimônio investido nas suas próprias empresas, que suas famílias fundaram, ou de outras adquiridas nos embates que ocorrem nos bancos, bolsas e gabinetes, isto é, longe do chão de fábrica e do barulho das máquinas.
Vale a pena analisar esse movimento de proporções históricas, pois ele pode indicar a integração brasileira na verdadeira globalização, que é a dos fluxos de capital. Trilhões de dólares giram 24 horas por dia, acionados on-line, em busca de oportunidades de investimento. É um risco enorme e uma extraordinária oportunidade, num mundo em que os ativos, produtivos ou não, são avaliados e negociados a cada momento. Tudo isso sem respeitar fronteiras soberanas ou bancos centrais, que tentam correr atrás desse interminável tsunami.
O movimento realizado por empresários brasileiros enormemente bem-sucedidos, já é clássico nos países adiantados. São os chamados IPOs (Initial Public Offering). Um negócio, uma empresa que encontrou o seu filão, estrutura-se, adota boas práticas de governança, torna-se transparente livrando-se dos tradicionais segredos e apresenta-se ao mercado de capitais. Pode começar na Bolsa de Valores brasileira, mas já mira os principais centros internacionais, onde os investidores estão ávidos por novas oportunidades.
Daí em diante, o patrimônio dos empresários, que continuam detendo parcela considerável das ações, passa a ser expresso pelo preço que o mercado dá aos papéis que representam o valor das empresas. As variáveis que o mercado leva em conta são as mais diversas. Além dos dados como produção, produtos, margens de lucro, liquidez e outros, é a expectativa que move a decisão dos investidores. Expectativa de resultados potenciais e, mais do que nunca, da capacidade de inovação e da competência da sua gestão. Competitividade é a pedra de toque.
Esse novo momento da inserção brasileira no fluxo global de capitais pode ser o aguardado momento em que as empresas, novas ou antigas, vão se capitalizar no mercado dos investimentos chamados não-exigíveis, isto é, de recursos que não se originam de dívidas mas de acionistas que apostam nas possibilidades de ganhos, seja na distribuição de lucros ou da valorização das ações. O comportamento das cotações depende da performance anterior da empresa, mas, principalmente, das expectativas. O que faz o preço atual dos papéis é a avaliação do que se pode aguardar como resultados futuros. Num ambiente de acirrada competição, aposta-se no contínuo esforço de inovação, de aperfeiçoamentos tecnológicos de novos produtos, no aumento da produtividade, na conquista de novos mercados, na capacidade de crescimento, seja o chamado crescimento orgânico da própria empresa ou via fusões e aquisições.
Certamente é o aumento do acesso das empresas, inclusive das de menor porte, mas que apresentam bom potencial, ao vasto pool mundial de dinheiro que levará o sistema empresarial brasileiro a depender menos do crédito. Nos diversos países, a captação dos recursos para empresas e consumidores, via crédito, é a menor parte dos vários instrumentos de capitalização.
Chegar à lista de bilionários é bem raro, mas há uma enorme gradação para atingir o sucesso. O fator decisivo é a iniciativa e a vontade de correr riscos do empresário individualmente. Mas, como demonstra a experiência desses vários países que crescem mais do que o Brasil, em grande parte empurrados pelo empreendedorismo, é de que a parte que cabe ao Estado condiciona, em última (e primeira) análise, a dinâmica do desenvolvimento. Políticas de crédito, da taxa de câmbio, da tributação e dos gastos públicos, se outros méritos intrínsecos não existam, devem, pelo menos, assegurar as condições de competição dos negócios nacionais, sinônimo de renda para o povo, empregos e possibilidade de melhorar de vida.
Quanto à distribuição de renda e a justiça social, a forma mais eficaz é a tributação equilibrada e a aplicação dos recursos públicos em projetos de boa qualidade.


Boris Tabacof, 77, diretor do Conselho de Economia da Ciesp, foi presidente do Conselho Superior de Economia da Fiesp/Ciesp e vice-presidente do Conselho de Administração da Cia. Suzano de Papel e Celulose.

Excepcionalmente, hoje, a coluna de Luiz Carlos Mendonça de Barros não é publicada.


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