São Paulo, quarta-feira, 17 de março de 2010 |
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VINICIUS TORRES FREIRE Lula e a rapinagem do petróleo
PESSOAS DO governo ligam para dizer que "o presidente está empenhado em resolver a crise" dos royalties do petróleo. Quando gente do governo liga para falar voluntariamente sobre algum assunto, é que o caldo engrossou. Dizem que Lula entrou na conversa para derrubar a mudança que deputados aprovaram na distribuição de parte do dinheiro do petróleo. O governo quer barrar a discussão sobre royalties que não os do pré-sal. Lula quer assoprar as mordidas entre Estados, evitar mordidas no seu bolso e aplacar conflitos entre aliados na campanha de 2010. A novela vai durar, pois a oposição no Senado também pretende mudar o texto da Câmara, rediscutindo inclusive o modelo de concessão. Do que se trata? A Câmara aprovou na semana passada um projeto de lei que manda redistribuir igualmente entre Estados a receita de uma taxa cobrada sobre o petróleo produzido, os tais royalties. Em tese, os royalties são uma espécie de prêmio e de reparação pagos à região onde petróleo ou outros recursos naturais não renováveis são produzidos. Os Estados prejudicados são Rio de Janeiro e Espírito Santo. No futuro, com o petróleo do pré-sal, São Paulo receberia menos do que o previsto pelas leis atuais de distribuição de royalties. Uma emenda senatorial ao texto da Câmara sugere que a União cubra o rombo imposto ao Rio e ao Espírito Santo. O Rio está em pé de guerra. O governador Sérgio Cabral (PMDB e amigão de Lula) convocou manifestação popular contra a perda de receita do petróleo. Em tese, o pagamento de royalties faz sentido, e os fluminenses têm alguma razão. Há de fato danos ambientais devidos à exploração do petróleo. Mais: o negócio do petróleo acaba por exigir que o governo da região produtora invista mais em infraestrutura. As cidades inflam, é preciso mais estradas, escolas, hospitais etc. A receita do petróleo um dia acaba, os problemas ficam. De resto, o Rio não pode cobrar ICMS sobre o petróleo, como seria coerente (tal imposto em geral é cobrado no Estado produtor, de origem). Outros Estados já mordem, pois, fatia do dinheiro petrolífero. Enfim, há um problema bem prático: tirar R$ 4 bilhões ou R$ 5 bilhões de receita do Rio vai causar um problema fiscal e administrativo sério. Mas, como esperado, ninguém calcula ou fiscaliza a demanda extra de infraestrutura e assemelhados devidos ao impacto do petróleo -os royalties podem ser excessivos. Segundo problema: o petróleo é da União. Terceiro: a receita dos royalties também cabe a municípios que mal sabem o que fazer do dinheiro extra. Quarto: a discussão toda é despropositada. Trata-se, primeiro, da divisão do butim antes de pensar em prioridades de despesa (ou poupança). É melhor picotar o dinheiro entre Estados e municípios ou colocá-lo num fundo comum, que discuta o que fazer do grosso da receita extraordinária do petróleo? Picotado pelo país, o dinheiro pode acabar nos escaninhos da inépcia, em projetos paroquiais ou em ladroagem. Num fundo comum, o emprego dos recursos fica mais visível. Tal sugestão é, óbvio, de um ingenuidade tola. Estados, seus senadores e deputados, farão o possível para tirar sua casquinha do ouro negro.
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