São Paulo, sexta-feira, 17 de maio de 2002

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PROTECIONISMO

"O problema da Alca não é o Brasil, são os Estados Unidos"

FHC ataca unilateralismo dos EUA

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

O presidente Fernando Henrique Cardoso antecipou ontem que voltará a criticar hoje o unilateralismo dos EUA, no discurso que fará na plenária da reunião de cúpula entre a União Européia e a América Latina/Caribe.
"O unilateralismo não se compagina com a idéia de livre comércio", disse FHC, aludindo às medidas protecionistas adotadas pelo governo norte-americano nos últimos meses.
A mais recente -e mais dura-crítica feita pelo presidente brasileiro aos Estados Unidos foi em Paris, em outubro passado, em discurso na Assembléia Nacional francesa. FHC chegou a comparar o unilateralismo dos EUA ao terrorismo, o que provocou irritação até hoje não dissipada no governo George Walker Bush.
"A barbárie não é somente a covardia do terrorismo mas também a intolerância ou a imposição de políticas unilaterais em escala planetária", disse FHC em Paris em outubro passado.
"De lá para cá, só piorou", diz FHC. Pelo menos em matéria de protecionismo, de fato os Estados Unidos vêm adotando uma decisão após a outra em contradição com a retórica pró-livre comércio.
O presidente brasileiro comentou ontem, em especial, a mais recente delas, o fato de o Senado ter rejeitado emenda ao mecanismo batizado de TPA (Autoridade para Promoção Comercial) que impediria que o Congresso aprove apenas o que for bom para os Estados Unidos em acordos comerciais negociados pelo Executivo.
FHC disse que ainda precisa ler em detalhes a decisão do Senado, mas já atacou: "Parece que o Congresso diminuiu ainda mais a amplitude que o presidente conta para fazer um acordo. Se for assim, quase seria melhor ir direto ao Congresso. Se o presidente tem menos poderes ou poucos poderes, fica mais difícil".
Por isso mesmo, o presidente brasileiro insiste na sua tese de que "o problema da Alca não é o Brasil, são os Estados Unidos". É uma alusão à Área de Livre Comércio das Américas, a ser formada pelos 34 países americanos, excluída apenas Cuba, uma iniciativa originalmente do governo dos EUA, na gestão Clinton. O governo norte-americano sempre criticou veladamente o Brasil por, supostamente, criar dificuldades para avançar nas negociações.
FHC acha que "uma negociação com fortes dificuldades por parte dos Estados Unidos pode ficar mais atrasada".
Ele aproveitou para estimular os europeus, que também negociam uma área de livre comércio com países americanos, no caso os quatro do Mercosul.
"A Europa poderia tirar vantagem (das dificuldades dos EUA) e fazer um acordo. A Europa também tem interesses políticos e estratégicos em uma maior abertura", disse. Lembrou inclusive que os europeus estão agora, "pela primeira vez", sentindo também o protecionismo americano, "no aço, por exemplo". Na verdade, não é a primeira vez, já que Europa e EUA colidem frequentemente em matérias comerciais.
O discurso de FHC hoje não visará exclusivamente o unilateralismo dos EUA, mas o protecionismo em geral, em especial o que a UE adota na área agrícola.
"Nossa prioridade é dizer que, se se quer realmente relações comerciais, é sem protecionismo, é baixando progressivamente as barreiras, é criando condições efetivas para o livre comércio".
Diz o presidente que o Brasil "quer e está preparado para a competição, mas não podemos fazer aqui e não fazer ali".
Mais por dever de ofício do que por convicção, FHC diz que há, na União Européia, uma "disposição favorável" para avançar um pouco no rumo do livre comércio. Mas o realismo obrigou-o a reconhecer que, "nos últimos anos, houve um retrocesso em matéria de comércio mais aberto".
De novo por dever de ofício, foi otimista a respeito do Mercosul, a ponto de dizer que, "a médio prazo", o bloco poderia chegar até a ter uma moeda comum. Mas admitiu: "Leva tempo. A Europa levou 50 anos para chegar ao ponto em que está. Vamos devagar com o andor".



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