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Novo pacote de Cavallo tenta reativar economia
DE BUENOS AIRES
Na noite de sexta-feira, Domingo Cavallo lançou a segunda perna do seu plano de emergência
para a economia argentina: na
prática, desvalorizou o peso a fim
de dar algum alento aos deprimidos produtores argentinos. Antes,
evitara o iminente calote ao refinanciar a dívida do governo, no
começo do mês. São os últimos
cartuchos que o superministro da
Economia dispara para evitar o
calote, a fuga de investidores ou
mesmo da tão temida desvalorização do peso.
A economia argentina é, na prática, dolarizada desde 1991. O governo, por exemplo, só pode gastar aumentar seu gasto em mais
um peso se o país conseguir trazer
ou atrair um dólar adicional para
sua economia. Um dólar vale um
peso e os pesos são lastreados em
dólares.
A Argentina precisa, pois, de
dólares para pagar suas dívidas
interna e externa. Não os consegue devido à baixa competitividade de seus produtos no mercado
internacional, cujos preços estão
atrelados ao dólar. Pior, engessados a um dólar que não estava tão
havia cinco anos (em relação a
outras moedas fortes), o que torna ainda menos atrativos os produtos argentinos.
A Argentina não atrai dólares
(ou paga caro para fazê-lo), de
resto, porque o mercado exige um
ajuste fiscal (equilíbrio das despesas públicas) crível, ajuste fiscal
dificultado pela recessão de três
anos (sem crescimento, a arrecadação do governo também não
cresce). Mas a Argentina não cresce porque as tentativas de ajuste
fiscal pioram a recessão, e a economia não cresce porque parque
produtivo não é competitivo.
Trata-se de um círculo vicioso
infernal que se tornou ainda mais
crítico em 1999, quando o Brasil,
um dos grandes parceiros comerciais argentinos, desvalorizou o
real. A Argentina perdeu seu
grande cliente -pois os produtos
argentinos ficaram caros no Brasil. A crise ficou mais aguda e, para evitar o calote e/ou a fuga de investidores, os argentinos foram
ao FMI. Por meio de uma acordo
do fundo, obtiveram um pacote
de ajuda financeira de US$ 39,7
bilhões, a chamada "blindagem
financeira". Sem apresentar bons
resultados fiscais nem sinais de
crescimento, a turbulência argentina voltou em fevereiro.
Cavallo assumiu em março a
economia e ganhou superpoderes
do Congresso. Empurrou para
frente o pagamento de dívidas
que não honraria. Mas os juros
que vai pagar são mais altos. Se o
mercado não acreditar que a economia argentina vai dar sinais de
vida em breve, a crise volta a ferver.
O refinanciamento reduziu as
necessidades financeiras no curto
prazo, mas provocou uma concentração de vencimentos de cerca de US$ 16,5 bilhões em 2008.
Um dos novos papéis oferecidos pelo governo para trocar pelos títulos antigos, chamado Global 2008, concentra agora US$
11,5 bilhões da dívida argentina,
ou quase 9% do total.
O novo Global 2008 virou a referência para a situação da dívida
argentina, desbancando o antigo
título FRB, que concentrava pouco menos de US$ 5 bilhões, com
vencimento em 2005.
A movimentação da cotação
dos novos Global 2008 será um
dos termômetros da saúde financeira da Argentina a partir de agora. "No final das contas, todos os
títulos acabam seguindo a movimentação do título de referência",
disse à Folha o economista Leonardo Chialva, da consultoria
Delphos Investment.
Os novos títulos oferecidos na
megatroca somente serão emitidos na terça-feira, mas já vêm
sendo negociados no chamado
"grey market" (transações antecipadas, com concretização no dia
da emissão) desde seu lançamento, há duas semanas.
Na última sexta-feira, o Global
2008 estava cotado a US$ 81,85,
com uma valorização de 4,5% em
relação ao seu valor de lançamento, de US$ 78,32. Segundo o economista Gonzalo Rodríguez, do
banco Scotiabank Quilmes, a volatilidade do Global 2008 deve ser
menor que a do FRB. "As variações não devem ser tão intensas
como antes", disse.
A variação do Global 2008 deve
impactar também nas cotações
dos títulos da dívida dos demais
países emergentes. Isso porque,
com a nova configuração da dívida argentina, ela representa cerca
de um quarto do índice de risco-país (sobretaxas pagas por empréstimos em relação ao que pagam os EUA) dos países emergentes, calculado pelo banco J.P.Morgan -a dívida brasileira representa outro quarto.
Apesar de o Global 2008 ter sofrido, após uma semana de alta
intensa, quatro dias de queda na
semana passada, os analistas consultados pela Folha descartam
uma corrida para a venda desses
títulos a partir da próxima semana. "A queda foi resultado das
movimentações normais do mercado e da realização de lucros
após uma semana de alta. O mercado não tem dúvidas de tanto
longo prazo, ninguém vai vender
por antecipação", afirmou Javier
Finkeman, economista-chefe do
banco HSBC.
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