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São Paulo, domingo, 17 de agosto de 2003

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FISCO

Após denúncia de enriquecimento ilícito contra fiscal ligado a secretário, cúpula do órgão decide ter mais controle sobre inquéritos

Receita centraliza investigações internas

LEONARDO SOUZA
SANDRA MANFRINI

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Após as denúncias de suposto enriquecimento ilícito contra dois de seus auditores fiscais, a cúpula da Receita resolveu ter maior controle sobre as ações de sua área de Inteligência, ao centralizar no gabinete do secretário Jorge Rachid decisões sobre investigações conduzidas pelo órgão. A medida foi recebida pelo grupo que se opõe a Rachid como uma tentativa de controlar essas operações.
A Receita tenta desvincular a nova linha imposta à divisão de Inteligência de inquérito interno que envolve os dois auditores, um deles ligado a Rachid. Diz que a mudança visa dar mais racionalidade ao trabalho e evitar perseguições internas, motivadas por questões políticas ou pessoais.
O grupo político adversário de Rachid diz o contrário. O objetivo seria podar a autonomia da Inteligência. Um dos efeitos já teria sido observado: a investigação dos dois auditores fiscais caminha a passos mais lentos do que seria desejado pela Corregedoria, responsável pelo inquérito. Rachid evita polêmica e se recusa a comentar o caso, ao se justificar com a preservação do sigilo fiscal.
Em março, a Corregedoria da Receita iniciou investigações sobre o patrimônio dos fiscais Sandro Martins e Paulo Baltazar. A pedido da Corregedoria, o Serviço de Inteligência da Receita entrou no caso. Identificou um imóvel em Paris e contas bancárias no Crédit Lyonnais em nome de Martins. Os fiscais negaram as acusações.
Quando o caso veio a público, em junho, Martins estava lotado no gabinete de Rachid -hoje, encontra-se na Coordenação Geral de Política Tributária. Já o então chefe da Inteligência -responsável pelas investigações no exterior-, Deomar de Moraes, foi exonerado por Rachid.
A exoneração de Moraes causou surpresa. Três semanas antes, ao informar a Rachid que iria se aposentar, o secretário pediu a Moraes que permanecesse no cargo. Foi atendido na época.
A troca no comando do Serviço de Inteligência coincidiu com o momento em que Moraes estava prestes a obter das autoridades francesas os extratos bancários de Martins. As novas orientações dadas à Inteligência podem atrasar a investigação. Até meados da semana passada, a Receita ainda não havia pedido oficialmente as informações à Justiça francesa.
O grupo ligado a Moraes avalia que sua exoneração ocorreu para abafar o caso dos auditores. Já a cúpula da Receita diz que a Inteligência extrapolava suas funções ao apurar denúncias contra Martins e Baltazar, motivada por interesse pessoal, para atingir Rachid.
Quando Moraes deixou a Receita, em 25 de junho, o segundo homem na hierarquia da Inteligência, Jorge Luiz Caetano, assumiu seu lugar. Em 7 de julho, Caetano reuniu-se com o braço direito de Rachid, o secretário-adjunto Leonardo Couto. No dia seguinte, Caetano enviou um e-mail para 30 auditores ligados à Inteligência, na qual resumiu o encontro.
No e-mail, o substituto de Moraes disse que o secretário-adjunto informara que "toda e qualquer" demanda feita pela Corregedoria à Inteligência deveria ser "rechaçada". Orientação estranha, já que cabe à Inteligência dar sequência a pedidos de investigação feitos pela Corregedoria.
Caetano disse ainda que o auxiliar de Rachid falara da necessidade de "um filtro" na avaliação das denúncias que chegam à Receita, "a fim de evitar a multiplicidade de esforços". Ou seja, a Corregedoria e a Inteligência não poderiam realizar investigações paralelas sobre um mesmo caso.
Segundo a mensagem, "demandas externas" feitas à Inteligência teriam de passar antes pelo gabinete de Rachid. Mencionam-se pedidos do Ministério Público e do Judiciário. Mas pedidos do tipo costumam ser levados ao gabinete do secretário da Receita.
Procurado pela Folha e informado de que a reportagem tinha cópia do e-mail, Caetano voltou atrás no que afirmara na mensagem. Disse que interpretara erroneamente o que havia sido discutido com Couto e que, no dia seguinte, enviou novo e-mail para os auditores. Teria se desculpado e repassado novas orientações. Caetano, no entanto, não permitiu que a reportagem visse a segunda correspondência eletrônica, alegando que o documento contém informações sigilosas.
Três semanas após ter distribuído o e-mail sobre a reunião, Caetano saiu da chefia da Inteligência e voltou para seu antigo posto.


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