São Paulo, segunda, 17 de agosto de 1998

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GLOBALIZAÇÃO
Em resposta ao desemprego, prolifera no país o número de fábricas administradas por funcionários
Crise leva indústrias a virar cooperativas

FÁTIMA FERNANDES
da Reportagem Local

Vítimas da globalização, indústrias dos mais diversos setores estão se transformando em cooperativas de produção e organizando no país uma da forma de trabalho experimentada nos países da Europa a partir do século passado.
Como resposta à crise enfrentada pelas empresas e ao desemprego, prolifera no Brasil o número de fábricas geridas por funcionários. Os setores calçadista e têxtil deram início ao processo em 92.
Agora já existem cooperativas de produção nos ramos moveleiro, metalúrgico, extração mineral, máquinas, transporte, plástico, químico, vidro, agroindústria etc.
A Anteag (Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Autogestão e Participação Acionária) surgiu há quatro anos para organizar e orientar essas cooperativas e associações.
Hoje são 41 sócias espalhadas pelo país, com aproximadamente 10 mil empregados. O faturamento previsto para 98 é de cerca de R$ 215 milhões. A venda tem crescido cerca de 5% a 10% ao ano.
"Nós surgimos com a crise. Recebo pelo menos um telefonema por dia de patrão ou empregado querendo transformar a fábrica em cooperativa ou associação", diz Aparecido Benedito de Faria, diretor técnico da Anteag.
Na cooperativa, o trabalhador possui cotas e tem retirada mensal de acordo com a função. Na associação, ele tem carteira assinada e está sob às normas da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
A expansão das cooperativas de produção surpreendeu, diz Faria, a ponto de a Anteag estar encabeçando um movimento para ter uma legislação específica para as empresas de autogestão.
A Anteag está tentando agendar encontro com o presidente Fernando Henrique Cardoso para apresentar proposta de tratamento diferenciado para as cooperativas e as associações de produção. Nos Estados Unidos, conta, as leis que protegem esse modelo de produção datam de 74. "Nós defendemos a cooperativa autogestionária. Mas ainda há restrições de trabalhadores que querem carteira assinada por causa da legislação."
Segundo ele, há casos de empresas em que a produtividade por trabalhador e o salário subiram 30% depois da transformação da fábrica em cooperativa.
Um exemplo é a Coopertex (Cooperativa Autogestionária Industrial de Trabalhadores Têxteis), localizada em São Paulo.
A Coopertex é a antiga Indústria Têxtil Delta, fabricante de fitas elásticas para confecções e calçados. O antigo proprietário da Delta, Daniel Adler, doou a fábrica, os equipamentos e as dívidas tributárias, de R$ 2 milhões, para os funcionários. "Ele não fez um mau negócio e nós estamos indo bem", diz Geraldo José Perutti, presidente da Coopertex, que trabalhou 14 anos na Delta e está há dois anos na Coopertex.
Segundo ele, o salário dos trabalhadores aumentou até 30% e a cooperativa conseguiu melhorar a qualidade e a produtividade da fábrica, que faz cerca de 3 milhões de metros lineares de fitas por mês (R$ 400 mil).
A Delta, conta Perutti, não investia em modernização há seis anos e desde que se transformou em cooperativa já recebeu quatro máquinas novas. As encomendas estão no mínimo se mantendo. O lucro líquido sobre o faturamento varia entre 10% e 15%.
A Coopertex dispõe de um conselho de administração e de um conselho fiscal (que audita as contas da empresa). Tem 84 cooperados. "Esse é um modelo de produção que só tende a crescer, pois é uma forma de manter emprego e renda", diz Perutti. Segundo ele, após as eleições deve diminuir o ritmo de operação das fábricas, o que pode resultar no surgimento de mais cooperativas de produção.



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