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OPINIÃO ECONÔMICA
Mais vale um emprego na mão do que dois voando
BENJAMIN STEINBRUCH
No Brasil muito se fala em globalização, abertura econômica e
fim de protecionismos como caminhos exclusivos e obrigatórios
para a volta do desenvolvimento.
Alguma coisa, no entanto, está
errada! Quando se viaja para o
exterior e se está preocupado em
aprender e entender o que está
ocorrendo lá fora, nos países
mais adiantados, não é nada
disso que se vê, não é nada disso
que se escuta, não é nada disso
que se pratica.
Aqui estou na Europa em conversas com empresários, analistas, editores econômicos e só se
fala em subsídios, protecionismo
e fortalecimento dos mercados
internos. Cada país, cada região,
cada segmento, cada cidadão está preocupado com suas atividades, defendendo com valentia
seus interesses. O que está acontecendo, então?
Acho que, no mínimo, estamos
atrasados na visão do mundo
moderno. A grande onda da
"abertura total" já passou. Só
continuam nessa os desinformados, os preguiçosos ou aqueles
que falam uma coisa e praticam
outra. A moda é a defesa dos
mercados internos, o estímulo à
produção local, a manutenção e,
se possível, a criação de novos
empregos. E, logicamente, um
pouquinho de abertura que facilite a conquista de mercados externos, mas não abra as comportas para os que vêm de fora.
Estamos vivendo, aqui na Europa, duas economias: uma real,
que tem vacas, novilhos, tomates, beterrabas, e outra que é
complementar a essa, mas que
só existe no papel. O fenômeno é
o mesmo em Portugal, na Espanha, na França, na Inglaterra,
na Alemanha e em outros países
onde protecionismos e subsídios
agrícolas crescem mais ao norte
do que ao sul do continente. Em
Portugal, por exemplo, o "certificado" da vaca que confere ao
agricultor o direito ao subsídio,
o "registro" do bezerro em até
sete dias (que também confere
subsídio), a autorização para o
cultivo da beterraba e do tomate
(para também conferir subsídio)
são práticas corriqueiras. A
preocupação maior não é com o
aumento da produção, a redução de custos ou os ganhos de
produtividade, e sim com o
equilíbrio do mercado, administrando-se as relações para que
não haja falta nem excessos. O
preço da terra, o dos insumos, o
custo da mão-de-obra são muito
maiores do que os praticados no
Brasil, mas a chance de exportarmos para cá, com base no
nosso esforço de produzir mais,
com qualidade superior e menor
preço não existe! É ilusão. Nós só
vamos exportar para valer para
Portugal e outros países europeus quando houver desajuste
na tal economia de papel. Só para ilustração: em Portugal o preço de uma vaca, na economia de
papel (aquela que tem subsídios), é de R$ 1.800 + R$ 500 de
subsídios por ano. E o preço com
subsídio da desmama do novilho com seis meses, também na
"economia de papel", é de R$
1.000! A busca não é por quantidade, qualidade ou preço. O que
se procura é o equilíbrio da oferta com a demanda sem muita
instabilidade social.
Nós, no Brasil, estamos no jogo
contrário, buscando, mesmo à
custa de desajustes sociais, produzir quantidade para reduzir o
preço, se possível mantendo a
qualidade. Não tiramos partido
da experiência de Portugal, tão
fácil de decifrar. Nem do que
ocorre no resto da Europa. Nem
dos subsídios indiretos e das
barreiras diretas que os Estados
Unidos adotam para defender
seus produtores.
É claro que na área agrícola
essas práticas são as mais gritantes. Mas por outros caminhos
o que se faz é a mesma coisa no
que toca à mineração, à metalurgia, aos plásticos, aos produtos industrializados e semi-industrializados. Ou nas matérias-primas em que os países
mais poderosos conduzem o balé da OMC (Organização Mundial de Comércio), criando punições para os que não baixam a
cabeça para a abertura desordenada. Punições, aliás, que nunca recaem sobre as economias
poderosas, que criam e administram as próprias regras da globalização.
Continuamos aqui deixando
nosso mercado doméstico e os
nossos empregos abandonados,
em segundo plano, em busca de
uma coisa que não vamos encontrar: o mercado livre internacional. Esquecidos de que
mais valem os nossos empregos,
o nosso mercado interno, a nossa produção na mão do que o
mundo voando!
Benjamin Steinbruch, 45, empresário,
graduado em administração de empresas e
marketing financeiro pela Fundação Getúlio Vargas (SP), é presidente dos conselhos
de administração da Companhia Siderúrgica Nacional e da Companhia Vale do Rio
Doce. E-mail: bvictoria@psi.com.br
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