São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2000

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FRACASSO
BC tentou mudar regra do leilão; Ultra admite ajuda do governo; lance de empresa argentina era carta de agradecimento
Como a Copene encalhou na madrugada

DAVID FRIEDLANDER
DA REPORTAGEM LOCAL

Paulo Cunha sabia que estava sozinho na disputa da Copene. Quis então pagar menos quando podia pagar mais: perdeu o jogo para ninguém. As regras do leilão eram ruins, tanto que os vendedores, o Banco Central e outras empresas, tentaram mudá-las no meio do jogo, que começou quase na meia-noite de quinta-feira passada e terminou em fracasso, cerca de uma hora e meia depois.
Uma tirada cômica coroou o malogro: os argentinos da Pérez Companc ficaram na disputa até o fim apenas para apresentar um envelope que deveria levar uma proposta de compra, mas em vez disso continha uma carta de agradecimento e despedida.
No lado sério da disputa, BNDES e Petrobras apoiavam o Ultra, de Cunha, que agradeceu a ajuda ao presidente da República. O BC queria apenas vender a Copene pelo maior preço. O leilão acabou por estragar o plano do governo de reestruturar a petroquímica no país e criar um grupo nacional forte no setor. O negócio fica para 2001, mas não se sabe se e como a Copene será vendida.
Cunha tinha dinheiro suficiente para comprar a Copene, a maior empresa petroquímica do país, e sobraria troco. A carta-fiança que apresentou para participar do leilão, cacifada pelos bancos Itaú e Unibanco, cobria com folga o preço mínimo de US$ 1,05 bilhão.
O Ultra ofereceu US$ 822 milhões. Irritou os vendedores, que esperavam uma oferta maior, e ficou irritado com eles, porque achou que quiseram esfolá-lo.
A Pérez Companc, por sua vez, apenas agradeceu a oportunidade de participar do leilão e explicava que preferia não fazer nenhuma proposta desta vez. Mais: pedia para ser avisada caso a operação não desse certo e, no futuro, aparecesse uma nova oportunidade para comprar a Copene.
Os norte-americanos da Dow Química e os gaúchos da Copesul, que haviam se habilitado para o pregão, também desistiram de participar, mas avisaram com antecedência que estavam fora.

Pergunte ao procurador
Pelo ritual do leilão, os candidatos à compra da Copene passaram o dia isolados num prédio da zona sul de São Paulo, enquanto os vendedores ficaram num outro edifício a quilômetros de distância. A única proposta, do grupo Ultra, atravessou o rio Pinheiros (que corta o sul e o oeste da cidade) pela Intranet (rede interna) da consultoria Arthur Andersen, dona dos dois prédios.
Dos vendedores, apenas o grupo Suzano ficou satisfeito com a oferta de Paulo Cunha. Os grupos Odebrecht e Mariani, e o Banco Central (administrador da massa falida do banco Econômico) trancaram-se por mais de uma hora numa sala para avaliar o lance.
Recusaram a oferta por considerar que o grupo Ultra se aproveitava do fato de ter ficado sozinho na disputa e regateava o preço. Além disso, nem sabiam se era possível rediscutir o valor do lance, pois o edital de venda ditava que o interessado só poderia fazer uma segunda oferta caso a primeira fosse apenas 3% menor que o preço mínimo. O lance do Ultra foi cerca de 20% menor.
Como sabiam, por meio da carta-fiança, que Paulo Cunha tinha mais bala na agulha, os executivos de um dos vendedores insistiram na idéia da renegociação.
Os executivos do BC tentaram encontrar o procurador da instituição a fim de saber se era possível contornar o edital. Não acharam o procurador. Por e-mail, recusaram a proposta do Ultra e informaram a empresa de que não haveria segunda chance. Mas o Ultra não queria outra chance, segundo o relato de quem acompanhou o leilão do começo ao fim.
Nesta semana, os vendedores discutem o futuro da venda da Copene: se reavaliam as regras do leilão que eles próprios bolaram.
Isso pode significar uma guinada radical no jogo da petroquímica. A Odebrecht, que só colocou à venda seu lote de Copene porque foi forçada pelo governo, pode mudar de lado. O grupo divide com a Ipiranga o controle da Copesul, uma prima-irmã da Copene. A Copesul se candidatou à compra da Copene e só desistiu por decisão da Ipiranga.
No momento, a Odebrecht tenta comprar a participação da sócia para mandar sozinha na Copesul. Se isso ocorrer, a empresa entra na parada pela Copene.


Colaborou Guilherme Barros


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