São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2000

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PETROQUÍMICA
Empresário conta que agradeceu a FHC ajuda do BNDES e Petrobras
Governo apoiava Ultra no leilão, conta Paulo Cunha

Paulo Giandalia - 15.set.99/Folha Imagem
Paulo Cunha, presidente do Ultra, que tentou comprar a Copene


GUILHERME BARROS
EDITOR DO PAINEL S/A

O empresário Paulo Cunha, 60, do grupo Ultra, tem muitas dúvidas sobre o futuro da venda da Copene, se é que ela vai ser vendida. Diz que desde sempre houve um só interessado na empresa: o grupo Ultra.
O empresário confirma a ajuda de estatais ao Ultra, e que agradeceu ao presidente Fernando Henrique Cardoso pelo apoio. Na opinião de Cunha, os demais grupos que demonstraram interesse no leilão, Dow Química e Pérez Companc, o fizeram apenas sob pressão dos vendedores.
Afirma que o nacionalismo não é uma onda, e sim uma necessidade para o Brasil conseguir reduzir seu déficit nas contas externas. A seguir, trechos da entrevista:

Folha - O que houve?
Paulo Cunha -
O leilão teve um vencedor.

Folha - Quem?
Cunha -
Quem queria comprar, mais uma vez, éramos nós. Mudou-se o mundo, rodaram-se todos os continentes e, no final, apareceu um único interessado: o grupo Ultra. Os grupos privados queriam vender, menos aquele representado pelo BC (banco Econômico -sob intervenção federal-, de Ângelo Calmon de Sá). O BC tem obrigação de vender os ativos do Econômico. Aliás, tem a obrigação desde 95, quando foi decretada a liquidação do banco, e até agora não vendeu.

Folha - O Banco Central não tem interesse em vender a Copene?
Cunha -
Não estou dizendo isso. Estou dizendo que o BC até agora não vendeu, e que os procedimentos indicam que, a seguir essa trajetória, não vai vender.

Folha - Seria um sintoma da divisão do governo?
Cunha -
Não vejo divisão nenhuma do governo. O governo tem interesse em quebrar esse impasse em que se meteu a petroquímica no Brasil e tem dado demonstrações evidentes disso.

Folha - A equipe econômica também?
Cunha -
Não tem nada a ver com equipe econômica. O problema não é o Banco Central e nem a equipe econômica. O que estou falando é da intervenção no banco Econômico.

Folha - O Econômico, então, não quer vender a Copene?
Cunha -
Não falo sobre isso.

Folha - Como foi o leilão?
Cunha -
Seguiu-se aquele ritual esdrúxulo. Foi feita uma proposta mais ou menos à meia-noite. Se esperou para ver se o outro concorrente, a Pérez Companc, iria fazer uma proposta mais alta. Depois, nos foi comunicado que nossa proposta tinha sido levada para ser analisada pelos devedores. Nós aguardamos e nos informaram que a nossa proposta estava abaixo do preço vinculante e, portanto, não tinha sido aceita. Nossa proposta foi agressiva, meticulosamente calculada por nós e nossos "advisers". Nossa proposta foi de US$ 822 milhões. A média das avaliações ficava entre US$ 600 milhões e US$ 700 milhões. Ganhei, mas não levei.

Folha - Por que a Dow desistiu?
Cunha -
Nunca houve interesse da Dow. Seu interesse era só o polietileno. Ela chegou a propor à Petrobras ficar com o polietileno, e a Petrobras cuidaria da central. A Petrobras negou.

Folha - E a Pérez Companc?
Cunha -
Nunca existiu interesse da Pérez Companc.

Folha - Como o senhor conseguiu o apoio da Petrobras?
Cunha -
Não chegamos a fazer nenhum acordo. Tanto eu como o Henri Philippe Reichstul (presidente da Petrobras) decidimos deixar para depois do leilão qual a melhor estratégia a seguir.

Folha - Seria uma sociedade?
Cunha -
Não definimos o modelo. A Petrobras já tem 15% da Copene e fornece 4,5 milhões de toneladas de nafta, o que corresponde a US$ 4,2 bilhões por ano. Há uma negociação entre a Petrobras e o setor em torno do preço da nafta. Participei de algumas dessas reuniões. De qualquer forma, uma definição sobre o modelo de associação com a Petrobras só depois do leilão. Não havia nada predefinido.

Folha - E do BNDES?
Cunha -
Minha conversa com o BNDES é antiga. Começou com o Luiz Carlos Mendonça de Barros, depois continuou com o Pio Borges, Andrea Calabi e, agora, com o Francisco Gros. Na época do Mendonça de Barros, tinha feito uma proposta para a Copene com o objetivo de reestruturar o setor petroquímico. O Ultra é um grupo que nunca atrasou uma prestação. Sempre pagou seus empréstimos em dia no BNDES. Portanto, não há nenhum impedimento para a gente recorrer ao BNDES. Ao mesmo tempo, o governo tem interesse na reestruturação do setor petroquímico. Trata-se de um setor que precisa crescer, um setor que parou no tempo. Em 1994, o setor tinha déficit na balança comercial de US$ 1 bilhão. Este ano, o déficit será de quase US$ 7 bilhões. A petroquímica está trancada por conta de todas essas indefinições.

Folha - A conversa do senhor com o presidente Fernando Henrique Cardoso, há duas semanas, ajudou a conseguir esse apoio do governo?
Cunha -
Fui ao presidente apenas agradecer esse apoio.

Folha - O senhor esteve com o ministro da Fazenda, Pedro Malan?
Cunha -
Nunca.

Folha - E com Armínio Fraga, presidente do Banco Central?
Cunha -
Estive algumas vezes com ele. Me lembro que, há um ano, falei para ele que só havia um interessado em comprar a Copene: o Ultra.

Folha - Mas ele nunca foi um defensor da tese nacionalista...
Cunha -
Não existe essa coisa de nacionalismo.Você acha que as declarações públicas do governo a favor do nacionalismo levaram a Dow a não participar do leilão? A Dow já estava decidida a não participar. Houve uma mudança de administração da Dow aqui no Brasil e o interventor do Econômico pediu à Dow que estudasse a Copene para entrar no leilão. Quando eles foram a Midland (EUA), onde fica a sede da Dow, a matriz recusou. A Dow só se interessava pelo polietileno. Não houve interferência política.

Folha - Por que, então, essa onda nacionalista?
Cunha -
O nacionalismo existe por conta dos déficits do Brasil nas balanças de pagamentos e comercial. O país precisa receber, por ano, US$ 50 bilhões para cobrir seu déficit na balança de pagamentos. Desse total, US$ 20 bilhões são renovação de créditos e US$ 30 bilhões, investimentos. O problema é que esses investimentos terão que ser enviados de volta, sob a forma de dividendos. Pelo menos 10% desses US$ 30 bilhões precisam ser remetidos por ano sob a forma de dividendos. O Brasil precisa reduzir o déficit.

Folha - Qual a solução?
Cunha -
Só tem uma: exportar. O Brasil sofreu uma desnacionalização excessiva nos últimos anos. Nenhum país foi tão desnacionalizado em tão pouco tempo. O país precisa conseguir convencer as multinacionais a produzirem para o mercado externo e não para o interno.

Folha - O senhor vai tentar comprar a Copene de novo?
Cunha -
Não sei se vão vender.

CONTATOS

"Minha conversa com o BNDES é antiga"

"De qualquer forma, uma definição sobre o modelo de associação com a Petrobras, só depois do leilão"

"Fui ao presidente apenas agradecer esse apoio"
PAULO CUNHA
presidente do grupo Ultra



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