São Paulo, sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Onde há fumaça há pânico

Novidades da crise nos Estados Unidos tornam ainda mais difícil prever impacto na economia brasileira

HÁ TANTA FUMAÇA no tiroteio do mercado americano que está muito difícil saber quem passou a sangrar, quem está ferido de morte e, ainda mais imprevisível, descobrir quantas balas perdidas chegarão ao Brasil. Apesar do quase pânico desses dias, ainda há alguns sinais contraditórios nas alturas esotéricas das finanças americanas e nos dados da atividade econômica. Mas é verdade que, no lado "real" da economia, a freqüência de notícias ruins começa a superar a de notícias, digamos, neutras.
Analistas americanos observam que é preciso esperar mais um ou dois meses de balanços do varejo, sempre voláteis, antes de cravar que o consumo estagnou. Mas um banco após outro anuncia que aumentou o nível de calote nas suas operações com pessoas físicas. Agora foi a vez de o JP Morgan e o Wells Fargo se juntarem a Citigroup, Bank of America, Wachovia etc.
Um indicador geograficamente restrito, mas tido como bom antecedente da saúde industrial, a pesquisa do Fed da Philadelphia, veio ontem em um nível que historicamente costuma indicar recessão -causou certo pânico, mas também é um número volátil e preliminar. Divulgou-se também que o índice de confiança dos CEOs ("presidentes") das empresas americanas no quatro trimestre de 2007 caiu para o menor nível desde 2000. A maioria dos executivos não prevê melhora do ambiente econômico antes do segundo semestre. Mas o nível de pedidos de seguro-desemprego não veio tão ruim. O mar não está para peixe, mas não se sabe o quão raso está.
No caso das finanças, por exemplo, um dos motivos maiores dos dias de sustos e corridas de agosto a novembro parece perder força. Parte importante do mercado de financiamento de curto prazo para instituições financeiras e empresas vem se recuperando nas últimas quatro semanas. A taxa de juros dos empréstimos entre bancos cai.
Por outro lado, jamais as agências de classificação de risco rebaixaram a nota de tantos títulos financeiros lastreados em outros ativos, como investimentos cuja renda depende de pagamentos de dívidas como a da casa, a do carro, a do cartão de crédito ou o financiamento da faculdade.
O temor mais recente é que se proclame que as empresas seguradoras de crédito (que fazem seguros de títulos de dívida) estão propensas a dar calote ou quebrar (pois também perderam muito com a crise imobiliária). Tais instituições fazem contratos em que, grosso modo, prometem cobrir calotes contra bancos ou empresas e, em troca, recebem um pagamento periódico. Só a queda de confiança em tais "seguradoras" pode travar o crédito.
E uma crise financeira feia assim seria o primeiro passo para a contaminação do Brasil. O segundo passo seria uma queda do comércio mundial que derrubasse o preço de produtos básicos ("commodities"), de grande peso nas exportações brasileiras. Mas aí também o futuro está nublado. Ainda ontem havia análises de monte sobre a tendência altista dos preços de grãos e ferro (mas não para petróleo), por exemplo, e faz pouco se discutia o risco de inflação mundial causada pelos preços de "commodities". Qual a tendência do risco, então? Ainda está tudo muito, muito, confuso.


vinit@uol.com.br

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